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Notas sobre copyright e copyleft (III)

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A última parte do texto do coletivo Wu Ming que começamos a publicar alguns dias atrás retoma uma polêmica do início da década, envolvendo editoras que combatiam serviços de digitalização de livros como o Google Print [leia este texto para mais informações]. Comparando a questão às suas análogas, o grupo de escritores nos lembra das produtoras de cinema que condenaram o VHS, e da eterna lenga-lenga da indústria fonográfica, primeiro contra o K7, depois contra as gravadoras de CD, e finalmente contra o download.

Hoje, várias livrarias virtuais já aderiram à disponibilização de trechos digitalizados como ferramenta de auxílio nas vendas, o que torna a última parte do texto um tanto obsoleta. Mas ainda útil: afinal de contas, nós todos estávamos lá quando a idéia ainda soava absurda para o mercado, e certamente estaremos lá quando a próxima inovação assim soar.

[Reuben da Cunha Rocha.]

Notas inéditas sobre copyright e copyleft

Wu Ming

Tradução: Reuben da Cunha Rocha

3. Google Print e similares: a web, o gratuito e o ato de reconstruir

Numa biblioteca você tem acesso gratuito a um livro e numa livraria você o compra, mas não há conflito entre as duas opções: os países onde se vendem mais livros são também aqueles com mais pessoas nas bibliotecas. É natural: quanto mais um livro circula, mais ele é lido, maior seu impacto na literatura.

A palavra-chave é ‘biblioteca’. Ela representa uma longa história de liberdade de acesso, posta em questão apenas muito recentemente (uma batalha ainda em curso). Tanto faz falar em bibliotecas feitas de tijolos ou bits, são igualmente bibliotecas. Se, ao contrário, o download for pago, estamos falando de livrarias, simples assim. Dito isto: Seth Godin, um dos maiores pensadores do mercado, diz que se x pessoas compram um e-book, o mesmo livro disponível gratuitamente será baixado por quarenta vezes x pessoas. Inverter a equação pode ser muito útil: a cada quarenta pessoas que baixam um livro de graça há uma que o irá comprar. A soma destes ‘um a cada quarenta’ leitores é garantida. São eles que compram o livro primeiro, e que primeiro falam dele. Eles são as conexões, os ‘evangelistas’, as ‘matracas’. Cada passo deve ser dado com estas pessoas em mente. Esta é a tática de Godin: novas obras (eletrônicas ou de papel) são postas à venda. Mas antes de divulgar o release de uma nova obra, ele disponibiliza a obra anterior para download. É uma estratégia de lançamento formidável.

O download gratuito de um texto e sua visibilidade nas ferramentas de busca têm um fim comum, e confluem para o mesmo objetivo: restituir o acesso on-line de produtos culturais ao público, o que pode encorajar a venda de livros.

Editoras que se opõe ao Google Print são como aqueles estúdios de cinema que, vinte anos atrás, denunciaram os fabricantes de videocassetes e fitas K7 alegando que a cópia doméstica violava o copyright. O famoso caso “Universal x Betamax”. A Universal acabou perdendo na Suprema Corte norte-americana…para sorte dela. Nos anos seguintes, a indústria cinematográfica creditou seu lucro não às salas de cinema, mas ao home video. Sobreviveu a crises graças ao VHS primeiro, e depois ao DVD. A Universal teria fechado caso houvesse ganho aquele processo. Ela perdeu, e terminou salva.

Poderíamos mencionar também a batalha absurda das gravadoras contra a introdução das fitas K7 nos anos 70, um prelúdio da guerra contra o download, travada apesar do fato de que (como mostra o iTunes) a verdadeira questão é oferecer ao público um modo legal de acesso à fonte.

A presente batalha custeada pelas editoras é ela também uma missão suicida contra inovações potencialmente vantajosas. Para o seu próprio bem, elas devem perder. Caso ganhem, as editoras terão encontrado um péssimo jeito de entrar para a história.

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