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Cópia & Desvio – parte I

 

A proliferação mundial dos sistemas de inteligências artificiais generativas quebrou um paradigma ao tornar a cópia ainda mais base para a criação. Tudo que está na internet e foi raspado – sem consentimento, aliás – por estes sistemas está sendo a base para a criação de inúmeras coisas, de cards de redes sociais a ilustrações de livros, passando por e-mails, artigos, filmes, textos e músicas. Se já no início do século XX a reprodução técnica, especialmente na fotografia e no cinema, tornava a cópia e o “original” não facilmente distinguíveis, o que dirá a partir de 2023, quando as IAs ampliam a reprodução digital e, cada vez mais, a separam de sua materialidade original, que passa a se transformar em mero dado, padrões de números a alimentarem grandes bancos onde não existe mais singularidade, apenas cópia.

Diante disso, qual é o papel da cópia na era da IA Generativa? O projeto Cópia & Desvio é uma série de conferências experimentais/performances sobre o direito para copiar e reutilizar o conhecimento humano. Organizado em atos, o objetivo é apresentar uma narrativa crítica sobre a cópia e sua relação com a política e a sociedade ao longo do tempo.

A primeira parte se chama “A cópia na era de sua proliferação técnica” e ocorreu ao vivo em 24 de outubro, às 19h (UTC-3). Nela, Rafael Bresciani e Leonardo Foletto remixaram artefatos sonoros e visuais em live-coding (no sistema Hydra, com a interface do Flok) para compor a narração da conferência, centrada nesta primeira parte nas práticas e reflexões de cópia no início do século XX. Teve participação nas vozes (e textos) de Walter Benjamin, Marcel Duchamp, Conde de Lautréamont e Tommaso Marinetti. Na música, Neu!, Talking Heads e Kaisoku Tokyo. Nas imagens, Pablo Picasso, Okumura Masanobu, Kunisada, J Borges, Louis Daguerre, Hugo Ball, Kurt Schwitters, Man Ray, Niepce, Abraham Salm, Marinetti, entre outros. As vozes de Duchamp, Benjamin e Lautréamont foram criadas a partir do treinamento do sistema de IA Generativa chamado Eleven Labs

O vídeo é parte de uma investigação que estamos fazendo desde 2023 sobre o papel da cópia ao longo dos últimos séculos na história da arte, o que passa pela questão histórica do desvio. Como se sabe, a arte é marcada pelo plágio, o roubo, o desvio, a cópia e apropriação. A segunda parte irá centrar na sgunda metade do século XX, período essencial da proliferação técnica das cópias a partir dos gravadores, samplers, fitas, fotocopiadoras, televisão, vídeos, computadores.

Assista abaixo. Após, um trecho do texto falado por Benjamin no vídeo:

 

“Tanto a poesia sonora, as colagens e o cinema são artes que foram potencializadas nessa primeira metade do século XX com a expansão da reprodução técnica. Os aparatos técnicos são protagonistas tanto como método de produção (caso das collages) quanto de gravação e apresentação ao público (poesia sonora e o cinema).

Eu não vou explicar hoje o que é Inteligência Artificial Generativa pois, como falei para vocês, ainda não sei bem. Intuo que elas ampliam a reprodução digital e, cada vez mais, a separam de sua materialidade original, que passa a se transformar em mero dado, padrões de números a alimentarem grandes bancos onde não existe mais singularidade.

Eu intuo também que as tecnologias digitais de reprodução tornam mais difícil a negação e a escolha. É como um loop da desintegração: o meio é abstraído na hiperconexão do e e e e e e e e e e e e e e, com menos possibilidade de ou ou ou ou. Às máquinas de reprodução técnica digital não é facultado a possibilidade de fim, mas sim a reprodução contínua e infinita de presente. Tudo passa a ser conectado ao propósito da reprodução contínua de cópias. Nada mais é criado, tudo passa a ser apenas repetição sem diferença. Todas as obras já existentes remixam as anteriores: tudo é cópia.” 

Walter Benjamin (Benja), remixado no vídeo

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