{"id":6845,"date":"2012-08-16T15:11:15","date_gmt":"2012-08-16T15:11:15","guid":{"rendered":"https:\/\/baixacultura.org\/?p=6845"},"modified":"2012-08-16T15:11:15","modified_gmt":"2012-08-16T15:11:15","slug":"um-guia-para-usuarios-do-detournement-2","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/baixacultura.org\/2012\/08\/16\/um-guia-para-usuarios-do-detournement-2\/","title":{"rendered":"Um guia para usu\u00e1rios do d\u00e9tournement (2)"},"content":{"rendered":"
Publicamos aqui a segunda (e \u00faltima) parte do \u201cguia\u201d, de Guy Debord e Gil J. Wolman<\/a>.<\/p>\n O texto, escrito em 1956 e publicado pela 1\u00ba vez numa revista surrealista belga chamada\u00a0Les L\u00e8vres Nues<\/em>\u00a0#8, faz uma interessante\u00a0\u00a0incurs\u00e3o te\u00f3rico-pr\u00e1tica-ir\u00f4nica sobre “desvios” de obras j\u00e1 existentes para a produ\u00e7\u00e3o de novas, as vezes de sentido oposto a original. \u00c9, como se v\u00ea, uma certa pr\u00e9-hist\u00f3ria de pr\u00e1ticas hoje popularizadas atrav\u00e9s do remix, remistura, remezcla, mashup, machinima, etc.<\/p>\n Nesta segunda parte, Debord e Wolman tratam de exemplos do d\u00e9tournament, mais ou menos moderados, mais ou menos efetivos. Falam da pr\u00e1tica na literatura, mais efetiva no processo da escrita do que no resultado final (“N\u00e3o h\u00e1 muito futuro no deturnamento de romances inteiros, mas durante a fase transitiva poderia haver um certo n\u00famero de empreendimentos deste tipo<\/em>.”)<\/p>\n Metagrafia de Isidore Isou, “sem t\u00edtulo”, de 1964.<\/p><\/div>\n Na poesia, citam a metagrafia – uma t\u00e9cnica de colagem gr\u00e1fica inventada pelo romeno\u00a0Isidore Isou<\/a>\u00a0e adotada pelo movimento do\u00a0letrismo<\/a>, que inspirou os situacionistas – como uma pr\u00e1tica adequada a aplica\u00e7\u00e3o do d\u00e9tournament. E tratam o cinema como a \u00e1rea onde o deturnamento pode atingir sua maior efetividade e beleza, j\u00e1 que “os poderes do filme s\u00e3o t\u00e3o extensos, e a aus\u00eancia de coordena\u00e7\u00e3o desses poderes \u00e9 t\u00e3o evidente, que virtualmente qualquer filme que esteja acima da miser\u00e1vel mediocridade prov\u00ea tema para infinitas pol\u00eamicas entre\u00a0espectadores ou cr\u00edticos profissionais<\/em>“.<\/p>\n A tradu\u00e7\u00e3o para o portugu\u00eas desse texto foi realizada por Railton Sousa Guedes, do Arquivo Situacionista Brasileiro\/Projeto Periferia (e revisada por n\u00f3s, que tamb\u00e9m colocamos alguns links).pescada do e-book. A tradu\u00e7\u00e3o \u00e9 a partir do\u00a0texto em ingl\u00eas de Ken Knabb<\/a>, que, por sua vez, traduziu do\u00a0franc\u00eas original<\/a>.\u00a0Ela (a tradu\u00e7\u00e3o para o portugu\u00eas) foi publicada originalmente no e-book Recombina\u00e7\u00e3o, do Rizoma (dispon\u00edvel pra download na nossa biblioteca<\/a>).<\/p>\n Guy Debord e Gil J. Wolman<\/em><\/p>\n Agora pode-se formular v\u00e1rias leis no uso do deturnamento.<\/p>\n O mais distante elemento deturnado \u00e9 aquele que contribui mais nitidamente \u00e0 impress\u00e3o global, e n\u00e3o os elementos que diretamente determinam a natureza desta impress\u00e3o. Por exemplo, em uma metagrafia [poema-colagem*<\/strong>] relativa \u00e0 Guerra Civil Espanhola, a frase que mais destaca o sentido revolucion\u00e1rio \u00e9 o fragmento de um an\u00fancio de batom: \u201cBelos l\u00e1bios s\u00e3o vermelhos\u201d. Em outra metagrafia (\u201cA Morte de J.H.\u201d) 125 an\u00fancios classificados expressam um suic\u00eddio mais not\u00e1vel que os artigos do jornal que o narram.<\/p>\n As distor\u00e7\u00f5es introduzidas nos elementos deturnados devem ser t\u00e3o simples quanto poss\u00edvel, pois o impacto principal de um deturnamento tem rela\u00e7\u00e3o direta com a lembran\u00e7a consciente ou semiconsciente dos contextos originais dos elementos. Isto \u00e9 bem conhecido. Basta simplesmente notar que se esta depend\u00eancia da mem\u00f3ria insinua a necessidade de determinar o p\u00fablico alvo antes de inventar um deturnamento, este \u00e9 apenas um caso particular de uma lei geral que governa n\u00e3o apenas o deturnamento mas tamb\u00e9m qualquer outra forma de a\u00e7\u00e3o no mundo.<\/p>\n A id\u00e9ia da express\u00e3o pura, absoluta, est\u00e1 morta; sobrevive apenas temporariamente na forma par\u00f3dica na medida em que nossos outros inimigos sobrevivem. Quanto mais pr\u00f3ximo de uma resposta racional menos efetivo \u00e9 o deturnamento. Este \u00e9 o caso de um n\u00famero bem grande de m\u00e1ximas alteradas por Lautr\u00e9amont. Quanto mais aparente for o car\u00e1ter racional da resposta, mais indisting\u00fc\u00edvel se torna do esp\u00edrito ordin\u00e1rio da r\u00e9plica, que semelhantemente usa as palavras opostas contra ele. Isto naturalmente n\u00e3o se limita \u00e0 linguagem falada. Foi nesse sentido que contestamos o projeto de alguns de nossos camaradas que propuseram deturnar um cartaz anti-sovi\u00e9tico da organiza\u00e7\u00e3o fascista \u201cPaz e Liberdade\u201d \u2014 que proclamava, em meio a imagens de bandeiras sobrepostas dos poderes Ocidentais, \u201ca uni\u00e3o faz for\u00e7a\u201d \u2014 acrescentando por cima em uma folha menor a frase \u201ce coaliz\u00f5es fazem a guerra\u201d.<\/p>\n O deturnamento atrav\u00e9s da simples revers\u00e3o \u00e9 sempre o mais direto e o menos efetivo. Assim, a Missa Negra reage contra a constru\u00e7\u00e3o de um ambiente baseado em determinada metaf\u00edsica construindo outro ambiente na mesma base, que apenas inverte \u2014 mas ao mesmo tempo conserva \u2014 os valores de tal metaf\u00edsica. N\u00e3o obstante, tais revers\u00f5es podem ter um certo aspecto progressivo. Por exemplo, Clemenceau chamado \u201co Tigre\u201d+ poderia ser chamado \u201co Tigre chamado Clemenceau\u201d.<\/p>\n Das quatro leis fixadas, a primeira \u00e9 essencial e se aplica universalmente. As outras tr\u00eas, na pr\u00e1tica, aplicam-se apenas a elementos deturnados enganosos. As primeiras conseq\u00fc\u00eancias vis\u00edveis da difus\u00e3o do uso do deturnamento, fora seu intr\u00ednseco poder de propaganda, foram a revivifica\u00e7\u00e3o de uma multid\u00e3o de livros ruins, e a extensa (n\u00e3o intencional) participa\u00e7\u00e3o de seus desconhecidos autores; uma transforma\u00e7\u00e3o cada vez maior de frases ou obras pl\u00e1sticas produzidas para estar na moda; e acima de tudo uma\u00a0facilidade de produ\u00e7\u00e3o que supera em muito, em quantidade, variedade e qualidade, a escrita autom\u00e1tica que tanto nos chateia.<\/p>\n O deturnamento n\u00e3o conduz apenas \u00e0 descoberta de novos aspectos do talento; tamb\u00e9m colide frontalmente com todas as conven\u00e7\u00f5es sociais e legais, e pode ser uma arma cultural poderosa a servi\u00e7o de uma verdadeira luta de classes. A barateza de seus produtos \u00e9 a artilharia pesada que derruba todas as muralhas da China do entendimento*<\/strong>. \u00c9 um verdadeiro meio de educa\u00e7\u00e3o art\u00edstica prolet\u00e1ria, o primeiro passo para um comunismo liter\u00e1rio. No reino do deturnamento se pode multiplicar id\u00e9ias e cria\u00e7\u00f5es \u00e0 vontade. No momento nos limitaremos a mostrar algumas possibilidades concretas em v\u00e1rios setores atuais da comunica\u00e7\u00e3o \u2014 estes setores separados s\u00e3o significantes apenas em rela\u00e7\u00e3o \u00e0s tecnologias atuais, com tudo tendendo a fundir-se em s\u00ednteses superiores com o avan\u00e7o destas tecnologias.<\/p>\n Consuelo, de George Sand, poderia ser relan\u00e7ada no mercado liter\u00e1rio disfar\u00e7ada sob algum t\u00edtulo in\u00f3cuo como \u201cVida nos Sub\u00farbios\u201d<\/p><\/div>\n Aparte dos v\u00e1rios usos diretos de frases deturnadas em cartazes, registros e radiodifus\u00e3o, as duas aplica\u00e7\u00f5es principais de prosa deturnada est\u00e3o em escritos metagr\u00e1ficos e, em menor grau, na h\u00e1bil pervers\u00e3o da moderna forma cl\u00e1ssica.<\/p>\n N\u00e3o h\u00e1 muito futuro no deturnamento de romances inteiros, mas durante a fase transitiva poderia haver um certo n\u00famero de empreendimentos deste tipo. Se um deturnamento fica mais rico quando associado a imagens, tais rela\u00e7\u00f5es para com textos n\u00e3o s\u00e3o imediatamente \u00f3bvias. Apesar das ineg\u00e1veis dificuldades, acreditamos que seria poss\u00edvel produzir um instrutivo deturnamento psicogeogr\u00e1fico da Consuelo de George Sand<\/a>, que poderia ser relan\u00e7ada no mercado liter\u00e1rio disfar\u00e7ada sob algum t\u00edtulo in\u00f3cuo como \u201cVida nos Sub\u00farbios<\/em>\u201d, ou at\u00e9 mesmo sob um t\u00edtulo deturnado, como \u201cA Patrulha Perdida<\/em>\u201d. (seria uma boa id\u00e9ia reutilizar deste modo muitos t\u00edtulos de velhos filmes deteriorados dos quais nada mais permanece, ou de filmes que continuam enfraquecendo as mentes dos jovens nos clubes de cinema).<\/p>\n A escrita metagr\u00e1fica, n\u00e3o importa qu\u00e3o antiquada possa ser sua base pl\u00e1stica, apresenta oportunidades bem mais ricas para a prosa deturnada, como outros objetos apropriados ou imagens. Pode-se obter uma id\u00e9ia do significado disso pelo projeto, concebido em 1951 mas eventualmente abandonado por falta de meios financeiros suficientes, que pretendeu fabricar uma m\u00e1quina de fliperama arranjada de tal forma que o jogo de luzes e trajet\u00f3rias mais previs\u00edveis das bolas formaria uma composi\u00e7\u00e3o metagr\u00e1fica-espacial intitulada Sensa\u00e7\u00f5es T\u00e9rmicas e Desejos de Pessoas que Passam pelos Port\u00f5es do Museu do Cluny Cerca de uma Hora depois do Poente em Novembro<\/em>. Percebemos desde ent\u00e3o que um empreendimento situacionista-anal\u00edtico n\u00e3o pode avan\u00e7ar cientificamente por meio de tais obras.\u00a0N\u00e3o obstante, os meios permanecem satisfat\u00f3rios para metas menos ambiciosas.<\/p>\n Seria melhor deturnar “O Nascimento de uma Na\u00e7\u00e3o” em sua totalidade, adicionando uma trilha sonora que fa\u00e7a uma poderosa den\u00fancia dos horrores da guerra imperialista e das atividades da Ku Klux Klan<\/p><\/div>\n \u00c9 obviamente no reino do cinema que o deturnamento pode atingir sua maior efetividade e, para os que se interessam por este aspecto, sua maior beleza. Os poderes do filme s\u00e3o t\u00e3o extensos, e a aus\u00eancia de coordena\u00e7\u00e3o desses poderes \u00e9 t\u00e3o evidente, que virtualmente qualquer filme que esteja acima da miser\u00e1vel mediocridade prov\u00ea tema para infinitas pol\u00eamicas entre\u00a0espectadores ou cr\u00edticos profissionais. Apenas o conformismo dessas pessoas lhes impede descobrir tanto a atra\u00e7\u00e3o apelativa como as falhas berrantes dos piores filmes.<\/p>\n Para ilustrar esta absurda confus\u00e3o de valores, podemos observar que “O Nascimento de uma Na\u00e7\u00e3o<\/em><\/a>” de Griffith \u00e9 um dos filmes mais importantes na hist\u00f3ria do cinema por causa de sua riqueza de inova\u00e7\u00f5es. Por outro lado, \u00e9 um filme racista e portanto n\u00e3o merece absolutamente ser mostrado em sua presente forma. Mas sua proibi\u00e7\u00e3o total poderia ser vista como lament\u00e1vel do ponto de vista do secund\u00e1rio, mas potencialmente merit\u00f3rio, dom\u00ednio do cinema. Seria melhor deturn\u00e1-lo em sua totalidade, sem a necessidade de sequer alterar a montagem, adicionando uma trilha sonora que fa\u00e7a uma poderosa den\u00fancia dos horrores da guerra imperialista e das atividades da Ku Klux Klan que at\u00e9 hoje continua atuando nos Estados Unidos.<\/p>\n Tal deturnamento \u2014 um tanto moderado \u2014 \u00e9 em \u00faltima an\u00e1lise nada mais que um equivalente moral da restaura\u00e7\u00e3o de velhas pinturas em museus. Mas a maioria dos filmes merece apenas serem cortados para compor outras obras. Esta reconvers\u00e3o de seq\u00fc\u00eancias preexistentes ser\u00e3o obviamente acompanhadas de outros elementos, musicais ou pict\u00f3ricos como tamb\u00e9m hist\u00f3ricos. Enquanto a reprodu\u00e7\u00e3o cinematogr\u00e1fica da hist\u00f3ria permanecer em grande parte semelhante \u00e0 reprodu\u00e7\u00e3o burlesca de Sacha Guitry, algu\u00e9m poder\u00e1 ouvir Robespierre dizer, antes de sua execu\u00e7\u00e3o: \u201cApesar de tantos julgamentos, a minha experi\u00eancia e a grandeza de minha tarefa me convence que tudo est\u00e1 bem\u201d. Se neste caso uma apropriada reutiliza\u00e7\u00e3o de uma trag\u00e9dia grega nos permite exaltar Robespierre, podemos imaginar uma sequ\u00eancia tipo-neorealista, no balc\u00e3o de um bar de beira de estrada para caminhoneiros, por exemplo, com um\u00a0motorista de caminh\u00e3o dizendo seriamente para outro: \u201cAntigamente a \u00e9tica se restringia formalmente aos livros dos fil\u00f3sofos; n\u00f3s a introduzimos no governo das na\u00e7\u00f5es\u201d. Percebe-se que esta justaposi\u00e7\u00e3o elucida a id\u00e9ia de Maximilien, a id\u00e9ia de uma ditadura do proletariado*<\/strong>.<\/p>\n A luz do deturnamento propaga-se em linha reta. \u00c0 medida que a nova arquitetura parece ter come\u00e7ado com uma fase barroca experimental, o complexo arquitet\u00f4nico \u2014 que concebemos como a constru\u00e7\u00e3o de um ambiente din\u00e2mico relacionado a estilos de comportamento \u2014 provavelmente deturnar\u00e1 as formas arquitet\u00f4nicas existentes, e em todo caso far\u00e1 um uso pl\u00e1stico e emocional de todos os tipos de objetos deturnados: arranjos cuidadosos de coisas como guindastes ou andaimes de metal substituir\u00e3o uma tradi\u00e7\u00e3o escultural defunta. Isto choca apenas os mais fan\u00e1ticos admiradores dos jardins estilo-franc\u00eas.<\/p>\n Comenta-se que em sua velhice D’Annunzio<\/a>, aquele su\u00edno pr\u00f3-fascista, mantinha a proa de um barco torpedeiro em seu parque. Sem considerar seus motivos patri\u00f3ticos, a id\u00e9ia de tal monumento n\u00e3o est\u00e1 isenta de um certo charme. Se o deturnamento fosse estendido a realiza\u00e7\u00f5es urban\u00edsticas, n\u00e3o seriam poucas as pessoas que seriam afetadas pela exata reconstru\u00e7\u00e3o em uma cidade de um bairro inteiro em outro. A vida nunca pode estar demasiado desorientada: o deturnamento neste n\u00edvel realmente a faria bela. Os pr\u00f3prios t\u00edtulos, como vimos anteriormente, s\u00e3o um elemento b\u00e1sico no deturnamento. Isto resulta de duas observa\u00e7\u00f5es gerais: que todos os t\u00edtulos s\u00e3o intercambi\u00e1veis e que eles t\u00eam uma import\u00e2ncia decisiva em v\u00e1rios g\u00eaneros.<\/p>\n Todas as hist\u00f3rias de detetive \u201cS\u00e9rie Noir\u201d s\u00e3o extremamente\u00a0semelhantes, contudo basta simplesmente mudar continuamente os t\u00edtulos para garantir uma consider\u00e1vel audi\u00eancia. Na m\u00fasica um t\u00edtulo sempre exerce uma grande influ\u00eancia, contudo a escolha \u00e9 bem arbitr\u00e1ria. Assim n\u00e3o seria uma m\u00e1 id\u00e9ia fazer uma corre\u00e7\u00e3o final ao nome \u201cSinfonia Her\u00f3ica\u201d mudando-a, por exemplo, para \u201cSinfonia L\u00eanin\u201d*<\/strong>.<\/p>\n O t\u00edtulo contribui fortemente no deturnamento de uma obra, mas h\u00e1 uma inevit\u00e1vel a\u00e7\u00e3o contr\u00e1ria \u00e0 obra no t\u00edtulo. Assim pode-se fazer extenso uso de t\u00edtulos espec\u00edficos retirados de publica\u00e7\u00f5es cient\u00edficas (\u201cBiologia Litoral dos Mares Temperados<\/em>\u201d) ou militares (\u201cCombate Noturno de Pequenas Unidades de Infantaria<\/em>\u201d), ou at\u00e9 mesmo de muitas frases encontradas nos livros ilustrados infantis (\u201cPaisagens Maravilhosas Cumprimentam os Passageiros<\/em>\u201d).<\/p>\n Para encerrar, mencionaremos rapidamente alguns aspectos do que chamamos de ultradeturnamento, quer dizer, as tend\u00eancias para um deturnamento que atue na vida social cotidiana. Pode-se dar outros significados a gestos e palavras, e isto tem sido feito ao longo da hist\u00f3ria por v\u00e1rias raz\u00f5es pr\u00e1ticas. As sociedades secretas de China antiga fizeram uso de t\u00e9cnicas bem sutis de sinaliza\u00e7\u00e3o que abrangiam a maior parte do comportamento social (a maneira de organizar x\u00edcaras; de beber; de declamar poemas interrompendo-os em determinados pontos). A necessidade de um idioma secreto, de contra-senhas, \u00e9 insepar\u00e1vel de qualquer tend\u00eancia em jogo. No final das contas, qualquer sinaliza\u00e7\u00e3o ou palavra \u00e9 suscet\u00edvel de ser convertida em qualquer outra coisa, at\u00e9 mesmo em seu contr\u00e1rio.<\/p>\n Os insurgentes monarquistas do Vend\u00e9e, por conduzirem a asquerosa imagem do Sagrado Cora\u00e7\u00e3o de Jesus, foram chamados de Ex\u00e9rcito Vermelho. No dom\u00ednio limitado do vocabul\u00e1rio pol\u00edtico de guerra esta express\u00e3o foi completamente deturnada durante um s\u00e9culo. Fora da linguagem, \u00e9 poss\u00edvel usar os mesmos m\u00e9todos para deturnar roupas, com todas suas fortes conota\u00e7\u00f5es emocionais. Aqui novamente encontramos a no\u00e7\u00e3o de disfarce que \u00e9 inerente ao jogo.<\/p>\n Finalmente, quando alcan\u00e7amos \u00e0 fase de construir situa\u00e7\u00f5es \u2014 a meta \u00faltima de toda nossa atividade \u2014 todo mundo ser\u00e1 livre para deturnar situa\u00e7\u00f5es inteiras mudando deliberadamente esta ou aquela condi\u00e7\u00e3o que as determina.<\/p>\n N\u00e3o apresentamos estes m\u00e9todos brevemente expostos aqui como algo inventado por n\u00f3s, mas como uma pr\u00e1tica geralmente difundida a qual nos propomos sistematizar.<\/p>\n Em si mesma, a teoria do deturnamento bem pouco nos interessa. Contudo achamos que ela est\u00e1 ligada \u00e0 quase todos os aspectos construtivos do per\u00edodo pr\u00e9-situacionista da transi\u00e7\u00e3o. Assim seu enriquecimento, pela pr\u00e1tica, parece necess\u00e1rio.<\/p>\n Futuramente prosseguiremos no desenvolvimento dessas teses.<\/p>\n GUY DEBORD E GIL WOLMAN, 1956<\/p>\n *1. A metagrafia foi uma t\u00e9cnica de colagem gr\u00e1fica inventada pelo romeno Isidore Isou<\/a> e adotada pelo movimento do letrismo<\/a>, por ele liderado. Mais sobre os letristas nessa entrevista de Orson Welles com Isou<\/a>.(Nota do Rizoma)<\/em><\/p>\n *2. Os autores est\u00e3o deturnando uma senten\u00e7a do Manifesto Comunista: \u201cO baixo pre\u00e7o das mercadorias da burguesia foi a artilharia pesada que derrubou todas as muralhas da China, que for\u00e7ou a capitula\u00e7\u00e3o do intenso, obstinado e b\u00e1rbaro \u00f3dio aos estrangeiros\u201d. (N. do Tradutor) Publicamos aqui a segunda (e \u00faltima) parte do \u201cguia\u201d, de Guy Debord e Gil J. Wolman. O texto, escrito em 1956 e publicado pela 1\u00ba vez numa revista surrealista belga chamada\u00a0Les L\u00e8vres Nues\u00a0#8, faz uma interessante\u00a0\u00a0incurs\u00e3o te\u00f3rico-pr\u00e1tica-ir\u00f4nica sobre “desvios” de obras j\u00e1 existentes para a produ\u00e7\u00e3o de novas, as vezes de sentido oposto a original. 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Um guia para usu\u00e1rios do detournament (parte 2)<\/strong><\/h2>\n
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\n<\/em>*3. Na primeira cena imagina-se uma frase de uma trag\u00e9dia grega (Oedipus em Colonus de S\u00f3focles) sendo colocada na boca de Maximilien Robespierre, l\u00edder da Revolu\u00e7\u00e3o francesa. Na segunda, uma frase de Robespierre sendo colocada na boca de um motorista de caminh\u00e3o.
\n<\/em>*4. Beethoven originalmente nomeou sua terceira sinfonia em homenagem a Napole\u00e3o (tido como defensor da Revolu\u00e7\u00e3o Francesa), mas quando Napole\u00e3o coroou a si mesmo como imperador o compositor rasgou furiosamente tal dedicat\u00f3ria renomeando-a como \u201cHer\u00f3ica\u201d. A alus\u00e3o a Lenin nesta passagem (como eventualmente \u00e9 mencionado em \u201cestados oper\u00e1rios\u201d no \u201cRelat\u00f3rio na Constru\u00e7\u00e3o de Situa\u00e7\u00f5es\u201d de Debord) \u00e9 um vest\u00edgio de um vago anarco-trotskyismo nos primitivos letristas, em um per\u00edodo politicamente menos sofisticado.
\n<\/em><\/p>\n<\/blockquote>\nImagens: 1, 3, 4\u00a0daqui<\/a>; metagrafia (daqui<\/a>) e O Nascimento (daqui<\/a>).<\/address>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"