{"id":5810,"date":"2011-11-16T16:26:15","date_gmt":"2011-11-16T16:26:15","guid":{"rendered":"https:\/\/baixacultura.org\/?p=5810"},"modified":"2011-11-16T16:26:15","modified_gmt":"2011-11-16T16:26:15","slug":"insensato-um-zine-dissertacao","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/baixacultura.org\/2011\/11\/16\/insensato-um-zine-dissertacao\/","title":{"rendered":"Insensato, um zine-disserta\u00e7\u00e3o"},"content":{"rendered":"

\"\"<\/a>
\nLembro do Jamer Mello (
@badalhoca<\/a>) desde os saudosos tempos de Santa Maria, quando ele era um dos poucos interlocutores locais que, provavelmente, conheceria (bem) todas as bandas e artistas do rock indie 80’s e 90’s que tu lembraria de citar, tipos nomes semi-desconhecidos como Spiritualized<\/a>.\u00a0Fora isso, Jamer\u00a0agitava a cidade com seus zines nos raros espa\u00e7os underground da cidade – em especial, lembro do Badalhoca #1<\/a>, uma grat\u00edssima surpresa acessada primeiramente em algum por\u00e3o local, provavelmente do DCE (quem \u00e9 ou esteve por Santa Maria sabe da inigual\u00e1vel contribui\u00e7\u00e3o que a boate literalmente underground\u00a0<\/em>do DCE da UFSM teve para a produ\u00e7\u00e3o\u00a0cultural santa-mariense ).<\/p>\n

Passou-se alguns anos, e o que era um prazer (fazer zine) passou a ser tamb\u00e9m trabalho: Jamer hoje d\u00e1 palestras e oficinas sobre fanzine e mant\u00e9m o melhor blog sobre o assunto no pa\u00eds, o Zinesc\u00f3pio<\/a>, que disponibiliza digitalmente zines de sua imensa cole\u00e7\u00e3o pessoal (e de outros que queiram contribuir <\/a>pro blog), al\u00e9m de not\u00edcias relacionados ao tema. Desde que surgiu, em janeiro de 2011, o Zinesc\u00f3pio tem se tornado refer\u00eancia obrigat\u00f3ria pra quem curte ou estuda os zines; chamou aten\u00e7\u00e3o de uma por\u00e7\u00e3o de blogs e sites legais<\/a>\u00a0e foi destaque de uma mat\u00e9ria de\u00a0capa do Segundo Caderno de O Globo<\/a>. E, dizem as m\u00e1s l\u00ednguas, prepara reformas para 2012.<\/p>\n

Mais al\u00e9m de ter virado trabalho, o zine tamb\u00e9m motivou uma pesquisa acad\u00eamica de Jamer. Mr. Badalhoca, que se formou em qu\u00edmica na UFSM, pesquisou no Mestrado em Educa\u00e7\u00e3o da UFRGS m\u00e9todos cient\u00edficos para uso nas Ci\u00eancias Humanas, investiga\u00e7\u00e3o que o fez mexer no vespeiro das divis\u00f5es entre arte e ci\u00eancia. Mas o trabalho seria mais uma (boa) disserta\u00e7\u00e3o sobre o tema se n\u00e3o fosse a ousada abordagem de Jamer, que resolveu usar o cut-up de Burroughs (que fizemos uma homenagem recentemente<\/a>, motivados pela leitura do trabalho) e a est\u00e9tica dos fanzines como afirma\u00e7\u00e3o dos conceitos de Gilles Deleuze de pot\u00eancias do falso e do simulacro.<\/p>\n

\"\"<\/a><\/p>\n

Para a pesquisa, Jamer usou e abusou de refer\u00eancias do cinema – em espcial \u00a0Orson Welles<\/a> (em F For Fake<\/a>, belo filme que um dia ganhar\u00e1 um coment\u00e1rio a parte aqui no Baixa), Rog\u00e9rio Sganzerla e Jean-Luc Godard – porque a montagem cinematogr\u00e1fica, assim como o Cut-Up, “podem operar como mecanismo articulador fundamental que justap\u00f5e imagens e textos para priorizar os efeitos de choque visual, de fragmenta\u00e7\u00e3o, de imagens sujas e borradas que s\u00e3o comuns aos fanzines e a uma certa produ\u00e7\u00e3o cinematogr\u00e1fica<\/em>“, como ele escreve no resumo do trabalho.<\/p>\n

A ousadia n\u00e3o foi s\u00f3 no tema e na abordagem do estudo, mas tamb\u00e9m (e principalmente) na execu\u00e7\u00e3o da pesquisa. Jamer literalmente produziu uma disserta\u00e7\u00e3o cut-up: n\u00e3o h\u00e1 apenas textos, par\u00e1grafos justificados e em espa\u00e7amento 1,5, mas colagens, trechos de cita\u00e7\u00e3o escritas a m\u00e3o ou datilografados, fotos, colagens fotos-textos, tal qual um zine. Fazer isso diante de uma estrutura r\u00edgida como a Academia j\u00e1 \u00e9, por si s\u00f3, digno de nota. E se casa com um conte\u00fado interessante ent\u00e3o, \u00e9 digno de… publica\u00e7\u00e3o na Biblioteca do Baixa!\"\"<\/a><\/p>\n

Brincadeiras a parte, aqui abaixo est\u00e1 o texto de apresenta\u00e7\u00e3o que Jamer escreveu sobre a sua disserta\u00e7\u00e3o – de nome “Insensato: um experimento em arte, ci\u00eancia e educa\u00e7\u00e3o<\/strong>“, que voc\u00ea pode\u00a0baix\u00e1-la<\/a>\u00a0na \u00edntegra.<\/p>\n

[Leonardo.Foletto]<\/em><\/p>\n

<\/pre>\n
\n

Insensato surgiu de uma pequena necessidade. De problematizar a ci\u00eancia, o fazer cient\u00edfico, e mais especificamente uma problematiza\u00e7\u00e3o entre a arte e a ci\u00eancia.
\n<\/strong>Mas apenas surgiu dessa necessidade.
\n<\/strong>Teve in\u00edcio como texto dissertativo, como ensaio filos\u00f3fico, com um tom ir\u00f4nico acerca da pesquisa cient\u00edfica, e logo deixou de ser necess\u00e1rio.
\n<\/strong>Se esvaiu, se decomp\u00f4s, e se tornou uma necessidade outra.
\n<\/strong>Uma demanda. E uma demanda do corpo, que exige cria\u00e7\u00e3o, processo.
\n<\/strong>Uma carga de mem\u00f3ria.
\n<\/strong>Outro processo. De produ\u00e7\u00e3o, de escrita, de montagem, de colagem, de plasticidade. Um processo fragmentado, fr\u00e1gil, inconsistente e inconstante, resultando num texto visual, e um tanto indeterminado, pensado tamb\u00e9m como um espa\u00e7o, como uma incurs\u00e3o.
\n<\/strong>Um campo de for\u00e7as.
\n<\/strong>Um espa\u00e7o de situa\u00e7\u00f5es em constante mudan\u00e7a. Situa\u00e7\u00f5es \u00f3ticas e imprecisas. A constru\u00e7\u00e3o de um estado que vem a ser um envio, e tamb\u00e9m um deslize.
\n<\/strong>O suporte \u00e9 vol\u00e1til. O suporte \u00e9 ef\u00eamero.
\n<\/strong>Na esteira de Didi-Huberman, um espa\u00e7o onde ver \u00e9 perder-se, e onde o objeto da perda \u00e9 um lugar inquietante. Lugar onde o que vemos aponta tanto para o prazer quanto para a estranheza. Inquietante estranheza.
\n<\/strong>A concep\u00e7\u00e3o deste trabalho n\u00e3o se trata de cr\u00edtica, ou inconformidade \u00e0 raz\u00e3o, \u00e0 ci\u00eancia ou \u00e0 verdade, mas de uma mudan\u00e7a de sentido. Uma for\u00e7a latente de tens\u00e3o ou de posi\u00e7\u00e3o. N\u00e3o uma possibilidade, mas um feixe de possibilidades.
\n<\/strong>Matar ou correr. Produzir ou se proteger.
\n<\/strong>Um tra\u00e7o, um risco.
\n<\/strong>Um desequil\u00edbrio que se legitima na cria\u00e7\u00e3o de um poss\u00edvel e de um n\u00e3o-poss\u00edvel. Nuances do ser e do n\u00e3o-ser, desmoronamento do percebido e do n\u00e3o-percebido.
\n<\/strong>Intempestivo e contingente.
\n<\/strong>Fr\u00edvolo e vol\u00favel.
\n<\/strong>Superf\u00edcie, desvio e desarticula\u00e7\u00e3o.
\n<\/strong>Envoltura, pele, fronteira: uma interioridade que transborda em contato com o exterior.
\n<\/strong>Um desajuste.
\n<\/strong>Uma disjun\u00e7\u00e3o.
\n<\/strong>O terror da inconsist\u00eancia.
\n<\/strong>Trata-se de contentamento. Ou n\u00e3o-contentamento.
\n<\/strong>N\u00e3o se contentar com a disposi\u00e7\u00e3o de um \u00fanico olhar.
\n<\/strong>Eu \u00e9 um outro. Outro olhar. Outros olhares.
\n<\/strong>E claro, enfrentar o risco de me perder de vista, \u00e0 deriva.
\n<\/strong>A obra de outro em mim. A minha obra em outro.
\n<\/strong>Cut-up, pot\u00eancias do falso.
\n<\/strong>Sem ju\u00edzo.
\n<\/strong>Sem raz\u00e3o.
\n<\/strong>Sem medida.
\n<\/strong>Insensato.<\/strong><\/p>\n<\/blockquote>\n

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