{"id":4927,"date":"2011-06-07T18:18:29","date_gmt":"2011-06-07T18:18:29","guid":{"rendered":"https:\/\/baixacultura.org\/?p=4927"},"modified":"2011-06-07T18:18:29","modified_gmt":"2011-06-07T18:18:29","slug":"grandes-experimentais-da-cultura-digital-livre-1-rubens-velloso","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/baixacultura.org\/2011\/06\/07\/grandes-experimentais-da-cultura-digital-livre-1-rubens-velloso\/","title":{"rendered":"Grandes Experimentais da Cultura Digital & Livre (1): Rubens Velloso"},"content":{"rendered":"

Damos in\u00edcio hoje a mais uma nova se\u00e7\u00e3o especial (que n\u00e3o sabemos onde vai dar) por aqui: chama-se conforme o t\u00edtulo do post acima e tem como resumo “Entrevistas remixadas com experimentais (pouco) compreendidos da cultura digital & livre<\/em>“. A primeira \u00e9 com Rubens Velloso<\/a>, diretor da companhia Phila 7<\/a> – talvez o principal grupo brasileiro que\u00a0 trabalha na pesquisa de novas linguagens c\u00eanicas que levam em conta a quest\u00e3o digital, telepresen\u00e7a, corpos biomec\u00e2nicos, conceitos relativos de espa\u00e7o, tempo e narrativa, dentre outras quest\u00f5es correlatas.<\/p>\n

Foi por acaso que tivemos a ideia dessa nova se\u00e7\u00e3o do Baixa. Eu (Leonardo, que a partir de agora, nesse post, deixa o plural de lado para assumir a 1\u00ba pessoa) estava fazendo uma entrevista para a pesquisa sobre teatralidade digital que tem me ocupado nestes at\u00e9 agora 6 meses de 2011 e pensei: mas por que n\u00e3o usar esse conte\u00fado tamb\u00e9m no Baixa?
\n[A pesquisa \u00e9 oriunda de uma bolsa da Funarte, Reflex\u00e3o Cr\u00edtica em M\u00eddias Digitais 2010, e vai resultar num livro reportagem tendo por foco o grupo
Teatro para Algu\u00e9m<\/a>; tenho mantido este blog aqui<\/a> como uma esp\u00e9cie de making off de tudo isso.]<\/p>\n

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Fotos de Play On Earth, montagem do Phila 7 de 2006<\/p><\/div>\n

Rubens me recebeu em sua casa, na Lapa, zona oeste de S\u00e3o Paulo, numa noite de segunda-feira. \u00c9 um \u00f3timo papo; daquelas raras pessoas que tu pode perceber que est\u00e1 pensando muitas coisas a frente de n\u00f3s (eu, tu e a gigantesca maioria dos habitantes dessa Terra).\u00a0Em 2006, com seu segundo espet\u00e1culo, \u201cPlay on Earth<\/a>\u201d, o Phila 7 – a companhia na qual \u00e9 diretor – tornou-se pioneira no uso da internet para a cria\u00e7\u00e3o e apresenta\u00e7\u00e3o de uma pe\u00e7a teatral que uniu tr\u00eas elencos em tr\u00eas continentes simultaneamente: Phila 7 em S\u00e3o Paulo, Station House Opera em NewCastle na Inglaterra e Cia Theatreworks em Cingapura. Tr\u00eas audi\u00eancias, cada uma em sua cidade, a assistir \u00e0s atua\u00e7\u00f5es em tempo real, formaram um quarto espa\u00e7o imagin\u00e1rio.<\/p>\n

Dois anos depois, um experimento ainda mais radical:\u00a0\u201cWhat\u00b4s Wrong with the World?<\/a>\u201d da s\u00e9rie Play on Earth, um espet\u00e1culo ao vivo entre Brasil (Rio de Janeiro) e Inglaterra (Londres). Linkados pela internet, os atores atuaram ao mesmo tempo e ao vivo, fazendo do \u201cmundo\u201d seu palco numa proposta marcada pelo ineditismo de linguagem e estrutura dram\u00e1tica.<\/p>\n

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"What's Wrong With the World", 2\u00ba experimento c\u00eanico-digital do Phila 7<\/p><\/div>\n

Rubens e o Phila 7 avan\u00e7aram e est\u00e3o para lan\u00e7ar, no fim deste ano e no 1\u00ba semestre de 2012, tr\u00eas “espet\u00e1culos”<\/a> que d\u00e3o prosseguimento \u00e0 essa busca. Um deles Rubens chama sabiamente de “superf\u00edcie de eventos<\/strong>“, porque est\u00e1 longe do que estamos acostumados a entender como teatro, cinema, perfomance, dan\u00e7a\u00a0 – \u00e9 tudo isso, mas tamb\u00e9m um embri\u00e3o de uma outra coisa ainda sem nome.<\/p>\n

O papo a seguir \u00e9 uma vers\u00e3o editada e remixada de nossa conversa. [Mas se voc\u00ea quer ouvir na \u00edntegra e na sequ\u00eancia correta pode ir l\u00e1 para o fim do post que o \u00e1udio est\u00e1 l\u00e1, em duas partes, com qualidade n\u00e3o muito boa mas aud\u00edvel<\/em>]. Rubens falou muito de teatro, facebook, internet, direitos autorais e outras coisas inevit\u00e1veis desses tempos. Mostrou seu trabalho de inven\u00e7\u00e3o de linguagens – e de cria\u00e7\u00e3o de uma gram\u00e1tica para falar dela, como o “MCs de fluxos reflexivos<\/strong>” para se referir ao trabalho dos atores com que vem trabalhando nos processos que prepara para o final deste ano e 2012.<\/p>\n

*********<\/p>\n

BaixaCultura<\/strong>: Como voc\u00ea come\u00e7ou com essas experimenta\u00e7\u00f5es de linguagens?<\/p>\n

Rubens<\/strong>: Nessa contemporaneidade, eu me senti muito confort\u00e1vel, muito mais do que me sentia quando jovem. Porque eu fazia estas coisas \u2013 eu j\u00e1 misturava super-8 com 35mm, fazia teatro depois filmava, etc. Isso pra te explicar um pouco do que estou fazendo agora. Vou partir de tr\u00eas montagens pra te explicar o que \u00e9 que eu to fazendo. Dois j\u00e1 est\u00e3o armados com certeza, o outro eu to armando, vai acontecer.<\/p>\n

O primeiro chama On Ego<\/strong>, \u00e9 um texto ingl\u00eas contempor\u00e2neo<\/a> [De Mick Gordon e Paul Broks<\/em>] em que parte das quest\u00f5es da neuroci\u00eancia, da dissolu\u00e7\u00e3o do eu e das redes neurais como express\u00e3o de voc\u00ea \u2013 voc\u00ea \u00e9 uma narrativa de uma rede neural.\u00a0Em On Eagle, eu trabalho com a ideia de que o c\u00e9rebro \u2013 a rede neural que voc\u00ea tem \u2013 j\u00e1 te remete a uma vis\u00e3o muito radical e contempor\u00e2nea do que \u00e9 o indiv\u00edduo hoje<\/strong>.\u00a0Muda para v\u00e1rias coisas, e uma quest\u00e3o que me interessa \u00e9 que o eu j\u00e1 n\u00e3o \u00e9 t\u00e3o importante como manifesta\u00e7\u00e3o, e sim como voc\u00ea se linka com o outro<\/strong>. Quer dizer, estamos falando aqui, mas existe uma outra coisa que est\u00e1 trabalhando aqui e que t\u00e1 construindo uma ideia que aos poucos vai ficando em conjunto.<\/p>\n

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Cartaz da Leitura p\u00fablica de On Ego, feita em 28 de mar\u00e7o, em SP<\/p><\/div>\n

O c\u00e9rebro, de alguma maneira, depois de milh\u00f5es de anos de evolu\u00e7\u00e3o, ele cansou de que o homem, para transcender e entender as coisas todas, criassem deuses e coisas assim. Ent\u00e3o, o que ele criou? Um simulacro, que s\u00e3o as redes. Ele criou um simulacro dele mesmo para voc\u00ea entender que as coisas precisam estar conectadas com um centro, mas podem estar rizom\u00e1ticas. Ele criou os computadores para v\u00e1rias coisas, mas uma delas \u00e9 para mapear ele mesmo e falar assim \u201c\u00d3 como eu sou\u201d, e esse como eu sou \u00e9 como voc\u00ea \u00e9.<\/p>\n

A partir destas quest\u00f5es, e de outras quest\u00f5es geracionais muito claras depois do advento da internet \u2013 essa gera\u00e7\u00e3o que nasceu com a internet tem o seu olhar todo modificado, no sentido de que a presen\u00e7a f\u00edsica e a presen\u00e7a virtual s\u00e3o vistas como duas formas de presen\u00e7a. Com manifesta\u00e7\u00f5es diferentes, mas s\u00e3o presen\u00e7as: uma presen\u00e7a carb\u00f4nica, que \u00e9 como n\u00f3s estamos aqui, e a presen\u00e7a s\u00edl\u00edcia, quando t\u00e1 na rede. Quando voce trabalha com isso, me interessa a pot\u00eancia do teatro na singularidade do local onde ele se d\u00e1. Me interessa o que est\u00e1 em torno \u2013 e que ainda est\u00e1 em fase embrion\u00e1ria e que t\u00e1 come\u00e7ando a explodir sem rumo, o que \u00e9 bom. Me interessa, a partir disso, potencializar estas duas formas de presen\u00e7a e quebrar as paredes do teatro, fazer com que ele, na for\u00e7a que ele tem como uma forma de presen\u00e7a, desdobrar essa reflex\u00e3o pra fora dele e de fora dele l\u00e1 pra dentro.<\/p>\n

Eu j\u00e1 n\u00e3o penso mais em dramaturgia, mas tramaturgia, que \u00e9 como voc\u00ea escreve \u2013 n\u00e3o s\u00f3 os di\u00e1logos mas todos os acontecimentos \u2013 como uma trama que vai se enredar nessas v\u00e1rias formas<\/strong>. Profana\u00e7\u00f5es [o 2\u00ba “espet\u00e1culo\/superf\u00edcie de eventos que Rubens e o Phila 7 preparam<\/em><\/em>] \u00e9 isso: tudo que vai acontecer \u2013 teatrais, imag\u00e9ticas, virtuais \u2013 v\u00e3o estar ali unidos por uma tramaturgia, onde os atores \u2013 que eu chamo de MCs de fluxos reflexivos \u2013 s\u00e3o os receptores e gerenciam isso junto ao p\u00fablico para que a ideia v\u00e1 se construindo. \u00c9 um pouco diferente do Teatro para Alguem porque eu nem estou interessado nem no teatro sozinho nem no teatro transmitido pela internet. Eu estou interessado nas potencialidades destas formas e em como n\u00f3s podemos enred\u00e1-las para gerar uma pot\u00eancia que se espalhe como reflex\u00e3o.<\/p>\n

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Em What's Wrong With the World, atores & proje\u00e7\u00f5es de atores & v\u00eddeos contracenam juntos<\/p><\/div>\n

N\u00e3o \u00e9 teatro, nem cinema, e eu nem quero chamar de h\u00edbrido. Voce se apropria de todas as formas de produ\u00e7\u00f5es est\u00e9ticas \u2013 imagens, teatro, v\u00eddeo, formas de presen\u00e7a diferente, artes pl\u00e1sticas. Mas pra voc\u00ea chegar nisso tem que mudar o pensamento inteiro. Voc\u00ea n\u00e3o faz isso s\u00f3 intelectualmente, voc\u00ea tem que mudar a forma de pensar. T\u00e1 acontecendo comigo, eu fa\u00e7o exerc\u00edcios. Por exemplo: Eu pego dois computadores e ligo, ponho dois filmes (ou videoarte) diferentes, ligo m\u00fasica aleatoriamente, deixo a sala do meu escrit\u00f3rio aberta para fazer um frame com o real de senso comum, esse real que a gente se apoia. A partir desses fragmentos, eu vou construindo rapidamente uma narrativa, com a ajuda de livros – ponho quatro cinco livros junto disso tudo. Vou vendo onde estas coisas se conectam e vou construindo, na minha cabe\u00e7a, uma narrativa que vai juntando tudo isso<\/strong>.<\/p>\n

B<\/strong> :\u00c9 a t\u00edpica cogni\u00e7\u00e3o da internet, n\u00e3o? Fazer v\u00e1rias coisas ao mesmo tempo.<\/p>\n

R<\/strong>: Exato. Voce pega o que acontece no Facebook, por exemplo. Existem v\u00e1rios approachs<\/em> [modos] pra entender isso, mas os dois mais comuns s\u00e3o 1) ah, isso \u00e9 legal, mas \u00e9 muito bobo; e 2) ah, isso \u00e9 legal, o que me interessa mais. O bobo vai estar l\u00e1 sempre, porque o bobo t\u00e1 na vida da gente. Mas isso \u00e9 legal: como eu posso captar isso como estrutura de reflex\u00e3o, onde o teatro tem uma pot\u00eancia muito grande, e fazer a jun\u00e7\u00e3o. Pra isso, voc\u00ea tem que mudar conceito de espa\u00e7o, voc\u00ea tem que se educar para isso.<\/p>\n

O c\u00e9rebro sabe disso, de certa forma; na zona cognitiva e da raz\u00e3o, ele entende que \u201cah, onde n\u00f3s conversamos agora \u00e9 um espa\u00e7o f\u00edsico”. Mas se eu ligar um computador aqui, eu to com esse espa\u00e7o e outro espa\u00e7o que eu trouxe pra dentro de casa. Se eu ligar uma c\u00e2mera, eu jogo esse espa\u00e7o que eu estou – ou no m\u00ednimo um recorte dele – pra dentro de outro espa\u00e7o, de uma outra pessoa, que est\u00e1 em outro lugar. Eu vou criando espa\u00e7os conectados e formas de presen\u00e7a, vou enredando tudo isso de uma forma que, se voc\u00ea n\u00e3o se preocupar mais de que forma isso est\u00e1 vindo, voc\u00ea faz uma pot\u00eancia reflexiva espalhada violenta.<\/p>\n

B<\/strong>: Ainda \u00e9 dif\u00edcil da gente n\u00e3o pensar em como isso est\u00e1 sendo feito.<\/p>\n

R<\/strong>: \u00c9 novo. Outro dia eu estava em um semin\u00e1rio sobre teatro e l\u00e1 estava uma neurocientista. Falei isso que estou te falando e ela disse, \u201colha, voc\u00ea tem toda raz\u00e3o. O c\u00e9rebro est\u00e1 constituindo redes de compreens\u00e3o e ele entende toda a quest\u00e3o digital como extens\u00e3o de seu corpo. \u00c9 seu corpo extendido para fora de voc\u00ea, mas dizendo de voc\u00ea\u201d. Mas \u00e9 claro que isso tem um tempo de amadurecimento. Tanto que quem mais aproxima do nosso trabalho no Phila 7 n\u00e3o \u00e9 o pessoal do teatro, mas sim o pessoal de multimeios. \u00c9 que o olhar dessa mo\u00e7ada est\u00e1 mais ligado pra isso. Eu falo pra gente do teatro \u2013 que s\u00e3o aqueles que eu mais conhe\u00e7o \u2013 e muitos me olham assim, \u201cih, enlouqueceu, isso n\u00e3o \u00e9 teatro\u201d. Mas eu falo, \u201cn\u00e3o quero que se chame de teatro, mas o teatro est\u00e1 l\u00e1. A teatralidade est\u00e1 l\u00e1, a pot\u00eancia do teatro est\u00e1 l\u00e1\u201d. Mas n\u00e3o \u00e9 como voc\u00ea aprendeu sempre, uma caixa preta, palco italiano, \u00e9 outra coisa.<\/p>\n

[youtube=http:\/\/www.youtube.com\/watch?v=0nngr0WjXyg&feature=related] Making of de “What’s Wrong With the World”<\/p>\n

B<\/strong>: No teatro \u00e9 dif\u00edcil achar interlocutores pra falar dessa rela\u00e7\u00e3o com o digital, n\u00e3o?<\/p>\n

R:<\/strong> Muito. Eu sou um ET. \u00c0s vezes a discuss\u00e3o morre em ver se \u00e9 ou n\u00e3o \u00e9 teatro. Mas meu pepino \u00e9 maior que o do Teatro para Algu\u00e9m, por exemplo. Porque, quando eles chamam de \u201cteatro digital\u201d, eles abrem essa discuss\u00e3o. Eu nem quero discutir isso. Eu n\u00e3o quero nomear nem de teatro nem de digital essas coisas todas. Eu to trabalhando com redes digitais, digineurais, voc\u00ea entende? Eu to criando um vocabul\u00e1rio pra isso, to escrevendo mesmo, pra poder me comunicar. Porque quando voce fala em teatro digital, voce nomeou duas coisas que j\u00e1 tem carimbo na sociedade. O pessoal do teatro, por quest\u00f5es \u00f3bvias, fala: isso n\u00e3o \u00e9 teatro. Se eles [do Teatro para Algu\u00e9m<\/em>] chamassem de teatralidade digital, j\u00e1 come\u00e7aria a ser mais aceito.<\/p>\n

Eu to cagando pra se \u00e9 teatro ou n\u00e3o \u00e9 teatro o que eu fa\u00e7o. Mas o teatro est\u00e1 no que o Phila 7 faz, ele est\u00e1 l\u00e1 linkado com outras coisas, ele n\u00e3o tem o formato que a gente acostumou a ter. Mesmo quando voc\u00ea rompe com o palco italiano \u2013 que nem o Vertigem, que foi fazer pe\u00e7a em cadeia, hospital \u2013 \u00e9 um lugar, onde se forma uma singularidade e o teatro se instaura. Esse lugar sempre vai existir pra mim, s\u00f3 que n\u00e3o tem mais parede, dali \u00e9 pra fora e de fora pra dentro.
\n[NE: O
Teatro da Vertigem<\/a> \u00e9 uma companhia de S\u00e3o Paulo que busca trabalhar com espa\u00e7os n\u00e3o convencionais. “Projeto Apocalipse”, um de seus espet\u00e1culos, circulou o Brasil e alguns lugares da Europa sendo apresentado em cadeias; BR-3 se passava num barco que navegava pelo rio Tiet\u00ea, em S\u00e3o Paulo]<\/em><\/p>\n

Mas imagina, n\u00e3o \u00e9 f\u00e1cil: teatro tem mil e mil anos, e voc\u00ea insere uma quest\u00e3o que, em primeira inst\u00e2ncia, seria o contr\u00e1rio do que ele \u00e9: a for\u00e7a do teatro est\u00e1 exatamente na prese\u00e7a. De uma certa forma, \u00e9 dif\u00edcil derrubar isso. O que voc\u00ea tem de fazer \u00e9 se desvincular disso. Esquece. N\u00e3o to fazendo teatro. Mas existe teatro l\u00e1, e pode existir sim.<\/p>\n

\"\"<\/a>

Espa\u00e7o de conviv\u00eancia da sede "real" do Phila 7, na Rua Tito, 79, em S\u00e3o Paulo<\/p><\/div>\n

B<\/strong>: Como viabilizar financeiramente uma pr\u00e1tica que ainda n\u00e3o tem nome?<\/p>\n

R<\/strong>: Tenho pensado nisso. Inclusive, vou te chamar quando isso acontecer. Vai se chamar “Churrasc\u00e3o da Arte Diferenciada” (risos). Eu acho que ele pode se financiar na medida em que o coletivo se apropria disso, principalmente atrav\u00e9s da rede. Voc\u00ea pode, por exemplo, fazer dramaturgias porosas onde as pessoas das redes virtuais – ou mesmo presencialmente – v\u00e3o construir na decis\u00e3o do espet\u00e1culo. Elas contribuem com ideias e esse financiamento vem dessas proprias comunidades. Eu acho que isso \u00e9 vi\u00e1vel a m\u00e9dio prazo.<\/p>\n

B<\/strong>: Como um crowdfunding?<\/p>\n

R<\/strong>: Exatamente. Mas voc\u00ea nao faz a oferta da coisa; voc\u00ea come\u00e7a a debater, ver onde a ideia se encaixa e vai construindo com ela. Eu tenho uma ideia que a pessoa tem o direito de acompanhar todo o processo, enviar imagens ou textos que elas achem pertinentes. E quando a coisa acontecer, ela tem um acesso a essa coisa – sempre tem um centro onde ela acontece. Voc\u00ea percebe que tudo isso ainda \u00e9 futuro. Eu to falando de um presente que espera um devir, n\u00e9. Mas alguem tem que meter a m\u00e3o na massa, algu\u00e9m tem que fazer o trabalho sujo.<\/p>\n

B<\/strong>: E a colabora\u00e7\u00e3o das pessoas, como fica?<\/p>\n

R<\/strong>: \u00c9 complicada, tudo \u00e9 complicado. Voce tem que mudar seu pensamento. No Profana\u00e7\u00f5es, eu me reuni com essas cabe\u00e7as que vamos trabalhar: a ideia \u00e9 isso, agora vamos construir juntos. \u00c9 dif\u00edcil, primeiro, aceitar que n\u00e3o temos uma coisa feita. A 2\u00ba coisa dificil \u00e9: pra voc\u00ea fazer esses trabalhos, a quest\u00e3o do ego tem que ser subvertida. Se voc\u00ea for trabalhar n\u00e3o a ideia mas sim o que voc\u00ea quer dessa ideia, e n\u00e3o do que voc\u00ea pode compor com ela, fudeu.<\/p>\n

Voc\u00ea tem que trabalhar em outras inst\u00e2ncias da sua rela\u00e7\u00e3o com a arte. Eu escrevo l\u00e1 no Facebook<\/a> s\u00f3 pra provocar as pessoas: processos desse tipo s\u00e3o propriedades de uma intelig\u00eancia coletiva, n\u00e3o de uma inteligencia individual que direciona tudo. \u00c9 uma intelig\u00eancia coletiva que constr\u00f3i a coisa toda. Eu vi que h\u00e1 uma narrativa mas \u00e9 sempre aberto a experimenta\u00e7\u00f5es, a novas ideias. N\u00e3o \u00e9 uma coisa fechada. Nunca t\u00e1 pronto. \u00c9 processo. Eu n\u00e3o estou trabalhando mais com coisas fechadas<\/p>\n

Eu n\u00e3o estou atr\u00e1s de sucesso, entendeu. N\u00e3o to mesmo. To cagando. Eu sou um sujeito fadado ao fracasso, porque eu trabalho no fracasso. O que eu fa\u00e7o n\u00e3o \u00e9 sedimentado, e voc\u00ea n\u00e3o pode se importar com isso. E te falo, parece utopia, mas \u00e9 poss\u00edvel. Eu detesto quando algu\u00e9m fala assim: voc\u00ea tem um projeto. E fala projeto para n\u00e3o falar produto. Eu n\u00e3o tenho e n\u00e3o quero ter. N\u00e3o tenho nem produto pra te dar. Eu tenho uma coisa que nem \u00e9 minha, \u00e9 coletiva. Se \u00e9 pra fazer o mais do mesmo, isso eu j\u00e1 fiz pra caracoles na minha vida. Na verdade nem fiz, j\u00e1 misturava, j\u00e1 era problema, mas n\u00e3o t\u00e3o radical. Eu n\u00e3o tenho nenhum interesse no espet\u00e1culo ficar prontinho, bonitinho, se repetir toda a noite.<\/p>\n

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"WeTudo: Desesperando Godot" (2009) \u00faltimo "espet\u00e1culo" do Phila 7, dirigido por Rubens<\/p><\/div>\n

B<\/strong>: Existe uma dificuldade de gera\u00e7\u00f5es mais velhas em entender que o direito autoral, do jeito que \u00e9 posto hoje, n\u00e3o tem mais serventia.<\/p>\n

R<\/strong>: Acabou! Acabou o direito autoral. Acabou mesmo. Tem que achar outra coisa. Isso j\u00e1 era. E quer saber, eu acho do caralho! Faz parte da intelig\u00eancia coletiva, \u00e9 gen\u00e9tico, DNA, coisa da consci\u00eancia humana<\/strong>. Pra mim, pro meu trabalho, jogar esse jogo (do direito autoral) seria negar tudo o que eu estou fazendo. \u00c9 negar tudo. Claro, eu sou um artista, temos que ganhar dinheiro para sobreviver. Mas n\u00f3s temos que construir outras formas desse dinheiro chegar na gente.<\/strong><\/p>\n

B<\/strong>: E isso n\u00e3o est\u00e1 estabelecido ainda, o que angustia as pessoas. Vai substituir pelo qu\u00ea? Ningu\u00e9m sabe ainda.<\/p>\n

R<\/strong>: O problema \u00e9 que ningu\u00e9m sabe porque ningu\u00e9m pensa diferente. Eles ficam pensando em como substituir o direito autoral e eles ainda pensam em direito autoral como uma propriedade privada que vai valer pelo resto da minha vida e quem quiser usar vai pagar pra mim. N\u00e3o tem mais isso! Acabou! Tem que ter outro jeito.<\/strong><\/p>\n

Eu falo: “n\u00e3o fica sonhando com coisas que n\u00e3o v\u00e3o acontecer mais”. A m\u00fasica j\u00e1 entendeu, t\u00e1 aprendendo na marra. O cinema, a mesma coisa. Mas ele fica inventando coisas, tipo o 3D. Eu sou partid\u00e1rio – falo isso com gente de cinema, e sou xingado – de uma ideia intermedi\u00e1ria. \u00c9 assim: quando voce faz um filme pela lei do audiovisual, voc\u00ea, cineasta, j\u00e1 ganha por isso, o seu valor j\u00e1 t\u00e1 embutido no valor obtido. A empresa que patrocina, n\u00e3o patrocina porra nenhuma, \u00e9 o povo que patrocina o cinema brasileiro. Bradesco nao patrocina pica nenhuma, nem Petrobras. \u00c9 tudo lei de incentivo, tu n\u00e3o paga o imposto l\u00e1 e joga aqui.<\/p>\n

Portanto, n\u00f3s dever\u00edamos pegar o filme e disponibiz\u00e1-lo de todas as formas poss\u00edveis, pra maior quantidade de pessoas possivel. A arrecada\u00e7\u00e3o que possa vir tem que formar um fundo de cinema pra gente come\u00e7ar a ser independente do cinema mercadol\u00f3gico<\/strong>. Entendeu? Voc\u00ea ir l\u00e1 pedir dinheiro pro Bradesco e ele perguntar “ah, mas vai ter ator da Globo?”, “o filme \u00e9 comportado? tem uma linguagem certinha?”. O fundo seria pra ficar livre disso, experimentar outras coisas, outras linguagens.\u00a0Isso \u00e9 uma solu\u00e7\u00e3o intermedi\u00e1ria, e nem isso o pessoal do cinema topa…<\/p>\n

Eu adoro essas revolu\u00e7\u00f5es que est\u00e3o acontencendo agora, que \u00e0s vezes parecem euf\u00f3ricas e juvenis. O que eu adoro nelas \u00e9 que elas n\u00e3o tem centro, \u00e9 uma ideia. “Marcha da liberdade<\/a>“, por exemplo. Cada um vai l\u00e1 gritar liberdade do que lhe interessa. E t\u00e1 chegando (no Brasil), vai chegar no mundo inteiro.<\/p>\n

Essa gera\u00e7\u00e3o nova [que t\u00e1 organizando essas pequenas revolu\u00e7\u00f5es<\/em>] j\u00e1 tem introjetado coisas que voc\u00ea n\u00e3o precisa mais trabalhar para introjetar. Essa mo\u00e7ada que eu chamei pra trabalhar raramente ia ao teatro. Esse pessoal gosta de um monte de coisa legal, mas detesta teatro.\u00a0Eles s\u00f3 se interessaram por teatro porque eu os chamei para trabalhar nessas ideias. Temos que construir um olhar pra poder ver o teatro, se n\u00e3o ele vai virar \u00f3pera, com aquele p\u00fablico senil, aquela coisa formal.<\/strong><\/p>\n

\u00c9 necess\u00e1rio aprender a ouvir tamb\u00e9m. Eu falo dessas conversas do Facebook, que parecem idiotas, mas n\u00e3o s\u00e3o por um motivo muito simples: pra essa gera\u00e7\u00e3o mais nova, a quest\u00e3o da presen\u00e7a \u00e9 muito diferente do que a gente caracteriza como “estar presente”, do “estar aqui vendo uma imagem”. Nada. S\u00e3o formas de presen\u00e7a. Aquele bate-bapo ali \u00e9 como se estivessem numa mesa de botequim. N\u00e3o h\u00e1 diferen\u00e7a entre essas formas de presen\u00e7a pra eles.<\/p>\n

Claro, existe muita merda no facebook, mas acho que a arte \u00e9 um caminho para fazer a reflex\u00e3o sobre isso. Ela tem que gerar reflex\u00e3o, gerar conte\u00fado, gerar proposta, pensamento. As pessoas est\u00e3o abertas pra isso, mas voc\u00ea tem que chegar nelas de algum jeito. Cabe as artes respectivas entrar ali e gerar atrito para gerar conte\u00fado. Eu acho isso, e \u00e9 o que eu to tentando fazer.<\/p>\n

Parte 1: [soundcloud url=”http:\/\/api.soundcloud.com\/tracks\/16697089″]<\/p>\n

Parte 2: [soundcloud url=”http:\/\/api.soundcloud.com\/tracks\/16711475″]<\/p>\n

Cr\u00e9ditos fotos: Site Phila 7<\/a><\/address>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

Damos in\u00edcio hoje a mais uma nova se\u00e7\u00e3o especial (que n\u00e3o sabemos onde vai dar) por aqui: chama-se conforme o t\u00edtulo do post acima e tem como resumo “Entrevistas remixadas com experimentais (pouco) compreendidos da cultura digital & livre“. A primeira \u00e9 com Rubens Velloso, diretor da companhia Phila 7 – talvez o principal grupo […]<\/p>\n","protected":false},"author":2,"featured_media":8019,"comment_status":"open","ping_status":"open","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":[],"categories":[212,795,126],"tags":[769,791,189,792,793,618,207,163,794,796,492,797,798,799,800,801,802,803,804,805,806,807,458,808,809,810,811,812,140],"post_folder":[],"jetpack_featured_media_url":"","_links":{"self":[{"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/4927"}],"collection":[{"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/users\/2"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=4927"}],"version-history":[{"count":0,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/4927\/revisions"}],"wp:featuredmedia":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=4927"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=4927"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=4927"},{"taxonomy":"post_folder","embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/post_folder?post=4927"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}