{"id":2741,"date":"2010-03-10T17:55:02","date_gmt":"2010-03-10T17:55:02","guid":{"rendered":"https:\/\/baixacultura.org\/?p=2741"},"modified":"2010-03-10T17:55:02","modified_gmt":"2010-03-10T17:55:02","slug":"a-armadilha-disney","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/baixacultura.org\/2010\/03\/10\/a-armadilha-disney\/","title":{"rendered":"A armadilha Disney"},"content":{"rendered":"
.<\/p>\n
Constru\u00ed meu imp\u00e9rio com uma ajudinha do dom\u00ednio p\u00fablico, mas n\u00e3o vou permitir que ningu\u00e9m mais fa\u00e7a o mesmo<\/p><\/div>\n
A inoc\u00eancia de todos os produtos criados pelo senhor Walt Disney<\/a> (1901-1966) esconde muitas mensagens subliminares e a\u00e7\u00f5es no m\u00ednimo obscuras e contradit\u00f3rias, e isso tu j\u00e1 deve saber faz algum tempo. Se n\u00e3o sabe, a\u00ed vai uma delas (e perdoem a eventual destrui\u00e7\u00e3o de positivas imagens guardadas na nossa inf\u00e2ncia permeada pelos desenhos disney): os est\u00fadios Disney vem gastando periodicamente milh\u00f5es de d\u00f3lares em advogados e lobistas para garantir que seus personagens n\u00e3o caiam no dom\u00ednio p\u00fablico<\/strong>. Toda vez que o famoso Mickey Mouse chega perto do seu prazo de validade, as leis dos EUA s\u00e3o alteradas para alongar o controle, impedindo que os personagens possam ser utilizados gratuitamente pelo p\u00fablico.<\/p>\n Foi isso que ocorreu na \u00faltima mudan\u00e7a, em 2003. As obras registradas depois de 1923 tinham um prazo de 95 anos para ca\u00edrem em dom\u00ednio p\u00fablico [ou seja, para que os direitos econ\u00f4micos n\u00e3o perten\u00e7am mais a ningu\u00e9m, o que permite que todos possam copiar a obra a vontade<\/em>]. O famoso Mickey Mouse, que apareceu pela primeira vez em 1928, teria seus direitos econ\u00f4micos liberados em 2003. Mas eis que\u00a0em janeiro deste mesmo 2003 a suprema corte dos Estados Unidos aprovou uma pequena extens\u00e3o de <\/strong>20 anos<\/strong><\/em> para estas obras<\/strong>, numa iniciativa logicamente que apoiada e patrocinada pelo grupo Disney – al\u00e9m de Mickey, Pluto (em 2006), Pateta (em 2008) e Pato Donald (2009) estavam com prazos de seu copyright<\/em> por vencer. [Para quem quer saber mais, este artigo<\/a>, em ingl\u00eas, detalha o caso]<\/p>\n O que a Disney n\u00e3o costuma expor \u00e9 que a\u00a0a\u00e7\u00e3o para “proteger” seus personagens \u00e9 bastante contradit\u00f3ria, para dizer o m\u00ednimo, pois a pr\u00f3pria empresa se apropriou – e muito! – \u00a0de personagens em dom\u00ednio p\u00fablico e\/ou criados por outros autores para fazer seus maiores sucessos<\/strong>. <\/em>A come\u00e7ar pelo pr\u00f3prio Mickey, que surge na anima\u00e7\u00e3o\u00a0Steamboat Willie<\/em> (1928), considerada uma das primeiras anima\u00e7\u00f5es com som da hist\u00f3ria, que \u00e9 uma par\u00f3dia descarada do filme\u00a0Steamboat Bill, Jr<\/a>.<\/em>(1928), dirigido por Charles Reiner e estrelado pelo \u00f3timo Buster Keaton. Assista ambos, a anima\u00e7\u00e3o<\/a> e o filme<\/a> com Buster Keaton, e compare tu mesmo a “semelhan\u00e7a”.<\/p>\n Como conta o\u00a0blog Burburinho<\/a>,\u00a0foi mesmo na d\u00e9cada seguinte que come\u00e7ou o mergulho de Walt Disney no dom\u00ednio p\u00fablico em busca de inspira\u00e7\u00e3o, que resultou numa s\u00e9rie de filmes animados que at\u00e9 hoje s\u00e3o bastante conhecido de todos.\u00a0Vejamos a lista:<\/p>\n _\u00a0A Branca de Neve e os sete an\u00f5es<\/a><\/em> <\/em>(1937) se inspirou num dos in\u00fameros contos infantis dos irm\u00e3os Jacob e Wilhelm Grimm, os famosos Irm\u00e3os Grimm<\/a>;<\/p>\n _ Pinocchio<\/em> (1940) \u00e9 baseado em um personagem do escritor italiano Carlo Collodi<\/strong>, que apareceu pela primeira vez em \u00a0“Storia di un burattino<\/em><\/a>“, livro publicado em 1883;<\/p>\n _ \u00a0“Fantasia<\/a>“<\/em> (1940) mistura trechos de temas musicais eruditos (a sinfonia pastoral de Beethoven, a Sagra\u00e7\u00e3o da Primavera<\/a> de Stravinsky, dentre outros) com poemas cl\u00e1ssicos (de escritores alem\u00e3es como Goethe<\/strong>, em\u00a0O Aprendiz de Feiticeiro<\/a>, <\/em>ou Hoffman<\/a>, em\u00a0O Quebra-Nozes, <\/em>musicado por Tchaikovsky em um conhecido bal\u00e9).<\/p>\n _ Cinderela<\/a><\/em> (1950) \u00e9 um dos contos de fadas mais conhecidos (e antigos) de todos os tempos. A anima\u00e7\u00e3o da Disney foi baseada na hist\u00f3ria escrita pelo franc\u00eas Charles Perrault<\/strong>, publicado em 1697.<\/p>\n _ Alice no Pa\u00eds das Maravilhas<\/a><\/em> (1951) \u00a0\u00e9 baseado no livro do escritor ingl\u00eas Lewis Carrol<\/strong>, publicado pela primeira vez em 1865;<\/p>\n _\u00a0Peter Pan<\/a><\/em>(1953) na pe\u00e7a infantil Peter and Wendy<\/em>, que originou um\u00a0livro hom\u00f4nimo publicado em 1911, ambos de autoria do tamb\u00e9m ingl\u00eas J. M. Barrie<\/strong>;<\/p>\n _ A Bela Adormecida<\/a><\/em>(1959) \u00e9 outro conto de fadas conhecido, tamb\u00e9m publicado por Charles Perrault em 1697 no livro “Contos da M\u00e3e Gansa<\/a>“;<\/p>\n .<\/p>\n Ainda h\u00e1 mais diversos casos, inclusive nos desenhos mais recentes. A Pequena Sereia<\/em> (1989) \u00e9 uma adapta\u00e7\u00e3o de um conto do s\u00e9culo XIX escrito pelo dinamarqu\u00eas Hans Christian Andersen<\/a>; Alladin <\/em>(1992) \u00e9 tirado do ramo s\u00edrio da monumental obra\u00a0As Mil e Uma Noites<\/a>, enquanto Pocahontas (1995) \u00e9 baseado numa personagem conhecida<\/a> da hist\u00f3ria dos Estados Unidos, assim como O Corcunda de Notre Dame (1996) \u00e9 um personagem criado pelo franc\u00eas Victor Hugo<\/strong> em “Notre-Dame de Paris<\/a>“, publicado em 1831, e Mulan<\/em> (1998) se alimenta de um poema chin\u00eas do s\u00e9culo V, chamado “A balada de Mulan<\/a>“, e por a\u00ed vai. O uso de personagens do dom\u00ednio p\u00fablico por parte da Disney \u00e9 at\u00e9 um caso exemplar de como se buscar inspira\u00e7\u00e3o no passado. Mas aqui lembro as palavras citadas no mesmo post<\/a> de antes do Burburinho:\u00a0Walt Disney lan\u00e7ou a carreira do seu personagem mais popular fazendo o que hoje os advogados da sua empresa n\u00e3o permitem que seja feito com suas cria\u00e7\u00f5es: reciclando material original produzido por outros autores.<\/em><\/p>\n Imagine se em todas essas hist\u00f3rias os est\u00fadios Disney tivessem que pagar os copyrights pela reprodu\u00e7\u00e3o e adapta\u00e7\u00e3o. \u00c9 certo que as anima\u00e7\u00f5es nem existiriam, e todos n\u00f3s que crescemos na d\u00e9cada de 1990 ter\u00edamos uma inf\u00e2ncia muito mais triste (ou n\u00e3o).<\/p>\n Mulan, personagem de um poema chin\u00eas do s\u00e9culo V<\/p><\/div>\n *<\/p>\n \u00c9 esta “armadilha” realizada pelo senhor Disney que trata o curta “The Disney Trap: How copyright steals our stories<\/em>“, escrito e produzido por Monica Mazzitelli<\/a>, integrante da Funda\u00e7\u00e3o Wu Ming – <\/strong>que tu j\u00e1 deve ter ouvido uma por\u00e7\u00e3o de vezes<\/a> por aqui – e do coletivo Iquindici<\/a>, que tem por peculiar miss\u00e3o ler obras ainda n\u00e3o publicadas com o objetivo de dar um retorno aos autores e, tamb\u00e9m, promover a ado\u00e7\u00e3o de licen\u00e7as abertas (copyleft, creative commons) na ind\u00fastria editorial italiana.<\/p>\n Em pouco mais de 11 minutos, o video fala um poquito da trucagem dada pela Disney nas leis de direito autoral para que seus personagens continuem em dom\u00ednio p\u00fablico. Para ilustrar o caso, a diretora Monica “interpreta” Molly Bloom, personagem de\u00a0Ulysses<\/a>, de James Joyce<\/strong> [a do clamoroso mon\u00f3logo final], que j\u00e1 deveria ter sua obra em dom\u00ednio p\u00fablico se n\u00e3o fosse pela ajudinha da Disney. O video est\u00e1 em ingl\u00eas com legendas em italiano:<\/p>\n [youtube=http:\/\/www.youtube.com\/watch?v=MqySp7Nq5j0&feature=player_embedded#]<\/p>\n **<\/p>\n P.S: O prazo para que uma obra entre em dom\u00ednio p\u00fablico<\/a> varia bastante, e j\u00e1 foi muito menor do que \u00e9 hoje nos Estados Unidos e no Brasil, absurdos 70 anos ap\u00f3s a morte do autor, para obras criadas a partir de 1978. \u00c9 por essas e outras que defendemos aqui desde o in\u00edcio a reformula\u00e7\u00e3o das leis de direito autoral, o que vai ser discutido no semin\u00e1rio “O direito \u00e0 educa\u00e7\u00e3o e a reforma da lei de direitos autorais<\/a>“, neste pr\u00f3ximo s\u00e1bado, no Instituto Paulo Freire, em S\u00e3o Paulo. O BaixaCultura estar\u00e1 l\u00e1 e promete um relato na sequ\u00eancia.<\/p>\n [Leonardo Foletto.]<\/strong><\/p>\n Cr\u00e9ditos imagens: 1<\/a>, 2<\/a>, 3<\/a>.<\/em><\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":" . 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