{"id":1836,"date":"2009-05-01T08:17:01","date_gmt":"2009-05-01T08:17:01","guid":{"rendered":"https:\/\/baixacultura.org\/?p=1836"},"modified":"2009-05-01T08:17:01","modified_gmt":"2009-05-01T08:17:01","slug":"as-confusoes-de-uma-industria-da-pesada","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/baixacultura.org\/2009\/05\/01\/as-confusoes-de-uma-industria-da-pesada\/","title":{"rendered":"As confus\u00f5es de uma ind\u00fastria da pesada"},"content":{"rendered":"
Um internauta invadiu o site da APCM pra deixar um recadinho de apoio.<\/p><\/div>\n
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Resolvi escrever esse post simplesmente para falar de tr\u00eas grandes e recentes trapalhadas do lado engravatado da for\u00e7a. Se por um lado parecem ser acontecimentos isolados, por outro escancaram um padr\u00e3o de rea\u00e7\u00f5es repressivas e inconsequentes de um punhado de gente que simplesmente tem grana o bastante para exercer a pr\u00e1tica de suas vis\u00f5es particulares de justi\u00e7a em um \u00e2mbito p\u00fablico, sem precisar passar pelo inc\u00f4modo de respeitar soberanias de pa\u00edses e vontades populares que alcan\u00e7am cada vez mais altos n\u00edveis de manifesta\u00e7\u00e3o social.<\/p>\n
Pra come\u00e7ar, vou relembrar aqui o julgamento<\/a> dos quatro administradores do Pirate Bay<\/strong>. Logo que saiu a not\u00edcia da condena\u00e7\u00e3o (que, na verdade, “vazou” do tribunal, d\u00e1 pra acreditar?), tenho certeza que entre a maioria dos compartilhadores bateu uma certa tristeza e at\u00e9 uma preocupa\u00e7\u00e3o. Mas logo algumas coisas foram sendo esclarecidas e, poupando a todos da pequena novela que j\u00e1 foi transmitida por aqui<\/a> e em outros sites<\/a>, o panorama em que estacionamos \u00e9 o seguinte: a condena\u00e7\u00e3o n\u00e3o amedrontou os membros do Pirate Bay, que, al\u00e9m de recorrerem da decis\u00e3o, alegam que tudo n\u00e3o passa de um “teatrinho para a m\u00eddia”, como diz o Peter Sunde<\/strong>, em uma rea\u00e7\u00e3o digna de um pren\u00fancio para a not\u00edcia de que o juiz do caso, Sr. Tomas Norstrom<\/strong><\/a>, teria participado de entidades de prote\u00e7\u00e3o ao copyright, o que veio a ser confirmado.<\/p>\n Essa irregularidade do juiz \u00e9 apenas um pouco da sujeira da ind\u00fastria cultural que acabou escapando por baixo do grande tapete (ou cobertor?) que se chama Estado<\/strong>. Com a ajuda das autoridades a ind\u00fastria cultural consegue inventar crimes, utilizar a pol\u00edcia como se fosse sua, mudar legisla\u00e7\u00f5es sem qualquer respaldo de concord\u00e2ncia popular e esmagar o interesse p\u00fablico. Quem assistiu ao document\u00e1rio Roube Este Filme<\/strong><\/em><\/a> sabe disso. Essa pr\u00e1tica constante de desrespeito e arrog\u00e2ncia s\u00f3 poderia ter culminado no circo que foi montado para condenar o Pirate Bay. S\u00f3 que o tiro saiu pela culatra. Ap\u00f3s a r\u00e1pida propaga\u00e7\u00e3o da not\u00edcia, o Partido Pirata da Su\u00e9cia obteve seu maior registro di\u00e1rio de militantes, conseguindo, inclusive, ultrapassar barreira para representa\u00e7\u00e3o no Parlamento europeu, como nos diz o grande Remixtures<\/a><\/strong>. Isso sem falar, das manifesta\u00e7\u00f5es f\u00edsicas e virtuais que ocorreram em protesto \u00e0 decis\u00e3o. Como se v\u00ea, al\u00e9m da seriedade e legitimidade do julgamento estarem em xeque, as consequ\u00eancias parecem levar invariavelmente a uma maior impopularidade das causas da ind\u00fastria<\/strong>.<\/p>\n \n Outro caso interessante eu li no Remixtures. Se o Youtube fosse um jornal (e n\u00e3o funcionasse com jab\u00e1) a Susan Boyle<\/a><\/strong> estaria na primeira p\u00e1gina. Ela \u00e9 a senhora de dotes visuais extremamente modestos que, em uma aparente surpresa, arrebentou em sua performance no programa de TV Britain’s Got Talent<\/em>, uma vers\u00e3o brit\u00e2nica sa\u00edda da mesma f\u00f4rma de que saiu o brasileiro \u00cddolos<\/em>. O v\u00eddeo foi visualizado \u00e0 exaust\u00e3o nos \u00faltimos dias e, enquanto o canal de TV onde o programa \u00e9 transmitido (ITV) e o Youtube discutiam e n\u00e3o chegavam a acordo nenhum sobre a divis\u00e3o dos lucros sobre as exibi\u00e7\u00f5es do v\u00eddeo, a prov\u00e1vel marca de 75 milh\u00f5es (and counting…<\/em>) de exibi\u00e7\u00f5es deixava de render cerca de 1,87 milh\u00f5es de d\u00f3lares, o que seria embolsado se o v\u00eddeo j\u00e1 tivesse sido monetizado.<\/p>\n Olhando esse caso da Susan Boyle, alguns podem pensar de chofre: “T\u00e1 vendo?! Todo mundo consumindo de gra\u00e7a o talento desta cantora e ela sem ganhar um centavo. Que injusti\u00e7a!”. Entretanto, caros e afoitos amigos, o que fica n\u00edtido, ao menos \u00e0queles que realmente entederam a situa\u00e7\u00e3o, \u00e9 que conte\u00fado gratuito gera grandes receitas. Veja s\u00f3: ningu\u00e9m (ou quase ningu\u00e9m) em s\u00e3 consci\u00eancia pagaria pra simplesmente assistir a um v\u00eddeo de uma \u00fanica apresenta\u00e7\u00e3o da Susan Boyle. As pessoas assistem por ser gratuito e isso poderia ter gerado muita grana, inclusive para a cantora, sem ela ainda nem ter gravado um disco ou um dvd. No entanto, essa grana n\u00e3o apareceu por culpa de quem mesmo?<\/strong> Ah, sim! Dos caras que sempre dizem defender os interesses dos artistas. Ficaram ali, discutindo suas pr\u00f3prias perspectivas m\u00e1ximas de lucro<\/strong>, enquanto a cantora n\u00e3o era representada por ningu\u00e9m. Depois dizem que o vil\u00e3o \u00e9 o usu\u00e1rio de internet… Ali\u00e1s, voc\u00ea sabia que alguns estudos<\/a> (cada vez mais numerosos) demonstram que quem mais compra cd original \u00e9 uma rapaziada que costumam chamar de “piratas<\/strong>“?<\/p>\n Por \u00faltimo, gostaria de comentar a atua\u00e7\u00e3o de nossa querida e tupiniquim APCM<\/strong><\/a> (Associa\u00e7\u00e3o Antipirataria de Cinema e M\u00fasica), nossa wannabe<\/em> MPAA. \u00c9 muito reconfortante saber que uma entidade dirigida por um ex-policial federal que simplesmente tem “saudades de prender<\/a>” (nem sei por qu\u00ea. O que ele faz hoje chega a ser mais arbitr\u00e1rio) retira do ar<\/a> links que muitas vezes englobam estrat\u00e9gias espont\u00e2neas de divulga\u00e7\u00e3o de certos artistas. A pr\u00f3pria comunidade do Orkut Discografias<\/strong>, fechada por press\u00e3o da APCM, era um acervo de divulga\u00e7\u00e3o para muitas bandas independentes. No entanto, esses aspectos s\u00e3o esquecidos quando o assunto \u00e9 o interesse de grandes gravadoras. Para o Direito n\u00e3o existe diferen\u00e7a entre Roberto Carlos<\/strong> e o seu vizinho adolescente que tem uma original\u00edssima banda a la <\/em>CPM 22<\/strong>. Se voc\u00ea \u00e9 autor, de qualquer obra intelectual que seja, voc\u00ea deve ser protegido. Entretanto, as autoridades do nosso pa\u00eds, ao ignorarem ou corroborarem tais a\u00e7\u00f5es de um defensor de interesses de monop\u00f3lio, est\u00e3o nitidamente protegendo alguns poucos.<\/p>\n Mas, olhando o lado t\u00e3o her\u00f3ico da APCM, de derrubar links para download n\u00e3o autorizado, o mais c\u00f4mico \u00e9 que essa turma de xerifes sente orgulho do que faz. Eles dizem estar fazendo um bom trabalho pelo fato de muitas pessoas estarem incomodadas com sua a\u00e7\u00e3o. Mas, diabos, essas pessoas s\u00e3o os pr\u00f3prios consumidores de quem financia esse t\u00e3o temido grupo de exterm\u00ednio!<\/strong> Mais acima eu citei pesquisas que apontam piratas como bons compradores de conte\u00fado original. N\u00e3o sei se \u00e9 o caso aqui no Brasil (entretanto, aposto que \u00e9), mas, com certeza, muita gente j\u00e1 deixou de comprar cd original por pura antipatia pela APCM. No pr\u00f3prio Orkut<\/a> h\u00e1 uma diferen\u00e7a um tanto gritante entre comunidades que amam e que odeiam a MPAA tupiniquim<\/a>. Pode parecer um n\u00famero pequeno, mas some a isso a volta da comunidade Discografias, o fato de o Orkut n\u00e3o ser mais um bom ambiente para manifesta\u00e7\u00e3o de compartilhadores e os telefonemas e mensagens enviados aos xerifes<\/a>, com reclama\u00e7\u00f5es contra<\/strong> e n\u00e3o para<\/strong> a APCM, e voc\u00ea ter\u00e1 uma pequena fra\u00e7\u00e3o da p\u00e9ssima popularidade dessa turminha da pesada. Achar que sair por a\u00ed derrubando links vai fazer as pessoas correrem para comprar o original ou n\u00e3o disponibilizar\/procurar novos links \u00e9 um tanto infantil. O que eleva n\u00famero de vendas legais \u00e9 o uso de novas formas de neg\u00f3cio na rede e n\u00e3o uma repress\u00e3o infundada.<\/p>\n Enfim, a ind\u00fastria faz o que bem entende, tenta de todos os modos, se atrapalha, mas n\u00e3o consegue convencer o pr\u00f3prio consumidor a desistir do compartilhamento de obras intelectuais<\/strong>. Tamb\u00e9m pudera, \u00e9 meio dif\u00edcil mostrar-se lesado quando filmes, m\u00fasica e inform\u00e1tica, por exemplo, geram (e ostentam) cada vez mais riqueza<\/strong>. A ind\u00fastria n\u00e3o consegue assumir (embora as explore veladamente) novas formas de neg\u00f3cio porque simplesmente teme perder a forma antiga. A sedutora diferen\u00e7a \u00e9 que esta forma antiga garante a asfixia de conte\u00fado, o monop\u00f3lio. As corpora\u00e7\u00f5es n\u00e3o querem perder o controle sobre o que vamos consumir. Querem que tudo continue passando por suas m\u00e3os enquanto todo mundo pensa que passa pelas m\u00e3os dos autores, essa sacralizada massa de manobra. Com isso fecho esse post e deixo a inten\u00e7\u00e3o de falar sobre a produ\u00e7\u00e3o marginal\/independente\/livre em um outro texto.<\/p>\n [Edson Andrade de Alencar.<\/strong>]<\/p>\nImagens:<\/em><\/address>\n<\/p>\n
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