{"id":1648,"date":"2009-04-11T23:12:16","date_gmt":"2009-04-11T23:12:16","guid":{"rendered":"https:\/\/baixacultura.org\/?p=1648"},"modified":"2009-04-11T23:12:16","modified_gmt":"2009-04-11T23:12:16","slug":"stewart-home-e-o-festival-do-plagio-ii","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/baixacultura.org\/2009\/04\/11\/stewart-home-e-o-festival-do-plagio-ii\/","title":{"rendered":"Stewart Home e o Festival do Pl\u00e1gio (II)"},"content":{"rendered":"
\"Home

Home trabalhando na exposi\u00e7\u00e3o 'Humanity in Ruins'<\/p><\/div>\n

Ao contr\u00e1rio do que eu previa, essa hist\u00f3ria vai render mais de dois posts. Mesmo cortando aquilo que julguei dispens\u00e1vel do texto (foi mal a\u00ed, mania de editor. O texto completo tem aqui<\/a>.), ainda s\u00e3o quase 20 p\u00e1ginas s\u00f3 dessa segunda parte.<\/p>\n

Apenas um coment\u00e1rio: n\u00e3o deixe de observar a grande sacada do “Dia Nacional da Grava\u00e7\u00e3o Caseira” [home taping<\/em> no original]. Em 1988 j\u00e1 tinha gente querendo irritar a ind\u00fastria fonogr\u00e1fica.<\/p>\n

Agora\u00a0vamos direto ao assunto.<\/p>\n

[Reuben da Cunha Rocha.<\/strong>]<\/p>\n

\n

O Festival do Pl\u00e1gio<\/strong><\/p>\n

Stewart Home<\/p>\n

Foi a partir do ver\u00e3o de 1985 que comecei a pensar na organiza\u00e7\u00e3o do Festival do Pl\u00e1gio. Eu sentia que entrar nesse tipo de coisa me daria a oportunidade de criar algo positivo a partir de minhas experi\u00eancias no 9\u00ba Festival Neo\u00edsta (Ponte Nossa, It\u00e1lia, 01 a 07 de junho de 85).<\/p>\n

Dois meses antes de ir para a It\u00e1lia eu decidira ‘renunciar’ \u00e0 condi\u00e7\u00e3o de ‘membro’ do grupo. Eu me desiludira com o movimento ao notar que muitos dos seus integrantes careciam das ferramentas te\u00f3ricas que deveriam orientar efetivamente suas atividades. No entanto, como eu havia prometido a Pete Horobin, o organizador, que compareceria ao festival em Ponte Nossa, eu me senti no dever de dar as caras. Embora eu ainda considerasse trabalhar com alguns neo\u00edstas individualmente, a ida ao festival italiano encerraria qualquer envolvimento ‘oficial’ com o grupo.<\/p>\n

Os eventos em Ponte Nossa refor\u00e7aram minhas piores suspeitas acerca do Neo\u00edsmo. Muitas das performances ocorridas durante o curso do festival indicaram que os realizadores se privaram de qualquer esfor\u00e7o no sentido de interagir com o p\u00fablico. Al\u00e9m de um vago desejo de ‘chocar’ observadores ocasionais, muito do ocorrido naquela semana pareceu narcisista e auto-centrado (e se livrou do solipsismo completo apenas gra\u00e7as \u00e0 necessidade de aplausos dos participantes). O p\u00fablico (caso houvesse um, o que nem sempre era o caso) era usado – literalmente – para gratifica\u00e7\u00e3o pessoal. Al\u00e9m da paga\u00e7\u00e3o de pau pro conceito de ‘criar situa\u00e7\u00f5es abertas’, a id\u00e9ia de que o p\u00fablico possui um papel produtivo na produ\u00e7\u00e3o cultural parecia desconhecido do pequeno grupo reunido em Ponte Nossa. A comunidade local ficou profundamente perturbada com o evento. Nos \u00faltimos tr\u00eas anos e meio eu tenho recebido diversas indica\u00e7\u00f5es do pouco engajamento do organizador Pete Horobin com as implica\u00e7\u00f5es de realizar um festival de ‘vanguarda’ numa pequena vila montanhesa. O mais significativo foi sua sugest\u00e3o de que eu estava mitologizando os fatos ao escrever que os adolescentes locais usaram o evento como pano de fundo para um comportamento levemente anti-social. Caso Horobin se dignasse a conversar com os moradores, ele teria descoberto o qu\u00e3o errado estivera ao assumir que o comportamento dos jovens da cidade ao longo do festival era apenas ‘normal’.<\/p>\n

Sua atitude para com os moradores de Ponte Nossa se refletiu no tratamento dado aos participantes do festival. No ano anterior nossa amizade havia se estreitado; seu comportamento na It\u00e1lia (direcionado a todos \u00e0 sua volta, inclusive a mim) revelou v\u00e1rios tra\u00e7os de personalidade que eu n\u00e3o notara antes. Eu n\u00e3o estava ent\u00e3o preparado para isso, nem (por raz\u00f5es pessoais) em condi\u00e7\u00f5es ideais para lidar com os conflitos de personalidade resultantes. Havia oito meses que eu dormia num lugar diferente a cada noite. De quebra, eu havia perdido tr\u00eas noites de sono viajando para Ponte Nossa de carona. Como resultado (e Horobin sabia), meu corpo estava t\u00e3o confuso que eu n\u00e3o conseguia dormir mais que duas ou tr\u00eas horas por noite – isso apesar de me sentir extremamente cansado o tempo todo. Deveria ser \u00f3bvio que eu n\u00e3o levaria numa boa ser acordado durante estas poucas horas de sono e apesar disso, na quinta noite do festival, Horobin me tirou do meu sono para informar que ‘algo estranho estava acontecendo’, enquanto Stiletto filmava minha rea\u00e7\u00e3o. Quando eu estava desperto o suficiente para perceber que os dois haviam explorado minha fadiga, e me manipulado a fazer uma cena que eles precisavam para um v\u00eddeo, eu lhes disse que caso n\u00e3o me entregassem a fita eu deixaria a cidade. Diante de uma negativa, eu caminhei at\u00e9 deixar a vila, e continuei caminhando por horas at\u00e9 encontrar alguma estrada em que pudesse pedir carona. Pensando agora, eu me sinto sortudo por n\u00e3o ter estado na pele de outros dois participantes do festival – Horobin tocou fogo em uma pilha de pap\u00e9is usados perto de onde dormiam. \u00c9 preciso notar, no entanto, que mais tarde Horobin se desculpou comigo por estas coisas. Como organizador, ele estava sob press\u00e3o consider\u00e1vel, o que pode (ao menos parcialmente) justificar sua falta de discernimento (e consider\u00e1vel desinteresse pela seguran\u00e7a e pelo bem-estar dos outros) ao longo da estadia na It\u00e1lia.<\/p>\n

O Festival do Pl\u00e1gio foi portanto parcialmente concebido em resposta \u00e0s m\u00faltiplas falhas que eu havia percebido no Festival Neo\u00edsta em Ponte Nossa (e em particular \u00e0 explora\u00e7\u00e3o, rudeza e irracionalidade com que v\u00e1rios neo\u00edstas se comportavam no conv\u00edvio com os locais – presumivelmente considerados como p\u00fablico). Outras, mais positivas, fontes de ‘inspira\u00e7\u00e3o’ (talvez porque eu n\u00e3o estivesse presente nelas) inclu\u00edam os festivais do grupo Fluxos na d\u00e9cada de 1960 e o ‘Destruction In Art Symposium’ de Gustav Metzger (que lidou com quest\u00f5es pr\u00e1ticas e te\u00f3ricas levantadas pelas puls\u00f5es destrutivas da cultura ocidental). Mencionei a proposta do Festival do Pl\u00e1gio para diversas pessoas (e em especial a Stefan Szczelkun), na esperan\u00e7a de persuadir algu\u00e9m a me ajudar nas inevit\u00e1veis tarefas administrativas. Graham Harwood, que soube da proposta via Szczelkun, me abordou e sugeriu que organiz\u00e1ssemos juntos o festival.<\/p>\n

Harwood e eu nos encontramos pelos menos uma vez a cada duas semanas ao longo da primeira metade de 87 para discutir nossos planos. Quando n\u00e3o focado em quest\u00f5es ‘pr\u00e1ticas’, como de que forma apresentar a proposta para as galeras, Harwood aproveitaria as reuni\u00f5es para expor suas id\u00e9ias sobre os mass media<\/em>. Durante o ver\u00e3o, as discuss\u00f5es sobre o festival alcan\u00e7aram um grupo maior (que, al\u00e9m de mim e Harwood, inclu\u00eda Baxter, Szczelkun, Hopton, Dickason, Vowles, Banks, Graham Tansley e Denise Hawrysio). Harwood esperava que das id\u00e9ias surgidas nestas ocasi\u00f5es fosse feito um livro fartamente ilustrado. Isto n\u00e3o aconteceu at\u00e9 a realiza\u00e7\u00e3o do evento, e as discuss\u00f5es (todas elas cruciais) geraram dificuldades organizacionais. Vowles e Banks se retiraram do festival (com diversas e contradit\u00f3rias raz\u00f5es para tal). Szczelkun, que inicialmente pensara em montar uma\u00a0obra\u00a0individual na Escape Gallery, mudou de id\u00e9ia e acabou organizando sua ‘Routine Art Co. Retroactive’ na M&B Motors, t\u00e3o em cima da hora que sequer entrou no material de divulga\u00e7\u00e3o do evento. Raz\u00f5es pessoais levaram Hawrysio a deixar Londres de volta ao Canad\u00e1 durante os dias do festival.<\/p>\n

Por diversas raz\u00f5es, as discuss\u00f5es que tiv\u00e9ramos ao longo do ver\u00e3o se mostraram motivo de ruptura entre os organizadores do festival (…). Ap\u00f3s gastarmos nosso entusiasmo inicial, a falta de estrutura das reuni\u00f5es se tornou um problema. Sem qualquer projeto formal, as conversas flutuavam ocasionalmente de discuss\u00f5es sobre problemas administrativos a quest\u00f5es te\u00f3ricas e da\u00ed para brigas pessoais feias. Minha resposta a esta situa\u00e7\u00e3o foi m\u00edope ao extremo; ao inv\u00e9s de me ocupar dos desentendimentos te\u00f3ricos, eu decidi buscar algo que mantivesse os participantes unidos. Isto se refletiu em minha resposta \u00e0s id\u00e9ias de Harwood nos est\u00e1gios iniciais da organiza\u00e7\u00e3o do festival, quando, ao inv\u00e9s de nos ‘darmos apoio’, n\u00f3s dever\u00edamos ter nos confrontado teoricamente. Enquanto ele pensava o pl\u00e1gio do ponto de vista da teoria cultural de John Berger, minha orienta\u00e7\u00e3o vinha de uma perspectiva informada pelas doutrinas mais radicais dos dada\u00edstas de Berlin e do Fluxus (principalmente Flynt, Paik e Vostell). A princ\u00edpio, eu tentei sintetizar as duas abordagens;\u00a0disto resultaram\u00a0textos desajeitados (“Plagiarism As Negation In Culture” e “Plagiarism, Culture, Mass Media”) que provaram que a tarefa n\u00e3o seria f\u00e1cil.<\/p>\n

Apesar de tudo, os textos desajeitados foram inclu\u00eddos no panfleto ‘Plagiarism: art as commodity and strategies for its negation’ [‘Pl\u00e1gio: a comodidade da arte e estrat\u00e9gias para neg\u00e1-la’] (publicado pela Aporia Press em novembro de 87). Para minimizar os custos de impress\u00e3o, o livrinho n\u00e3o possu\u00eda ilustra\u00e7\u00f5es. Harwood, que \u00e9 disl\u00e9xico, come\u00e7ou a se sentir impedido de contribuir com a publica\u00e7\u00e3o prevista para sair com o festival. Compreensivelmente o fato causou algum atrito entre n\u00f3s; tais diferen\u00e7as foram resolvidas quando Harwood viu o produto final – que representava adequadamente seu posicionamento te\u00f3rico. O livreto continha, al\u00e9m de textos meus e de Baxter, escritos de John Berndt, Simon Anderson, Ralph Rumney, John Zerzan, Valerie Solanas e John Carlin (os textos de Zerzan, Solanas e Carlin foram publicados sem autoriza\u00e7\u00e3o dos autores ou de seus editores).<\/p>\n

Parte do livro tinha a inten\u00e7\u00e3o deliberada de polemizar, e assim estimular o debate e ajudar a criar as condi\u00e7\u00f5es para uma mudan\u00e7a radical na compreens\u00e3o do leitor acerca de criatividade, identidade, originalidade, individualidade, valor e verdade. Infelizmente esta t\u00e1tica terminou por ocultar tanto as diferen\u00e7as quanto as similaridades nas nossas abordagens em v\u00e1rias quest\u00f5es te\u00f3ricas. Tamb\u00e9m levou a mal-entendidos maiores; v\u00e1rias pessoas (entre as quais o jornalista John A. Walker) tomaram de maneira demasiadamente literal certas id\u00e9ias vinculadas ao festival.<\/p>\n

A resposta mais extrema ao panfleto veio de Ed Baxter, que at\u00e9 estava certo em questionar a validade de certas propostas – mas o fez\u00a0de maneira tal a falhar dolorosamente, e a encobrir a fraqueza dos textos que tentava criticar. Enquanto editor do panfleto, Baxter removera v\u00e1rios textos de sua autoria do material que eu havia selecionado, e os\u00a0publicou separadamente\u00a0com um ensaio introdut\u00f3rio chamado ‘ReDistribution’ (escrito por ele sob o pseud\u00f4nimo Waldemar Jyroczech). Esta mudan\u00e7a de \u00faltima hora demoveu efetivamente qualquer debate (antes da publica\u00e7\u00e3o do panfleto) sobre os temas levantados em ‘ReDistribution’. No livreto, Baxter assume uma postura dogm\u00e1tica em rela\u00e7\u00e3o \u00e0 id\u00e9ia de ‘verdade’. Ou, mais especificamente,\u00a0\u00e0 aus\u00eancia dela, que ele entende, a partir do ensaio ‘Why Plagiarism?’ [Por que plagiar?’] (escrito\/plagiado por mim e creditado a Bob Jones), que eu defendo literalmente (…), ignorando a ironia presente no texto, a come\u00e7ar do fato de ele ser parcialmente plagiado de uma fonte da qual sou extremamente cr\u00edtico – o ‘Methods of Detournement’, de Debord e Wolman.<\/p>\n

H\u00e1 tamb\u00e9m um desprezo geral pelo papel produtivo do p\u00fablico no ensaio de ‘Jyroczech’. Por exemplo, Baxter argumenta que ‘originalidade’ e ‘criatividade’ ‘ocorrem no plano da produ\u00e7\u00e3o’. Estas s\u00e3o, na verdade, categorias morais aplicadas no curso da administra\u00e7\u00e3o e do consumo culturais (que n\u00e3o podem ser objetivamente mensuradas ou produzidas). Baxter\u00a0(…) cita ‘criticamente’ uma frase retirada do ensaio ‘Orientation For The Use Of A Context’ (que escrevi sob o nome Karen Eliot, enquanto a frase em quest\u00e3o foi plagiada de um texto que Michael Tolson escreveu com o nome Monty Cantsin). O trecho relevante do ensaio de Baxter \u00e9 o que se segue:<\/p>\n

‘Hoje n\u00e3o \u00e9 preciso que ningu\u00e9m confie no uso de m\u00faltiplos nomes para “criar uma situa\u00e7\u00e3o pela qual ningu\u00e9m \u00e9 particularmente respons\u00e1vel”. A pr\u00f3pria exist\u00eancia da lei implica numa aus\u00eancia generalizada de responsabilidade, refor\u00e7ada pela “morte do autor” (Barthes) e pela “liquida\u00e7\u00e3o da originalidade” (Warhol). De fato, parte do problema \u00e9 que este estado de coisas parece pertencer ao passado, a uma hist\u00f3ria aceita mas n\u00e3o compreendida; a repeti\u00e7\u00e3o plagiaria resultando numa fachada de a-historicidade, uma esp\u00e9cie de fetichiza\u00e7\u00e3o’.<\/p>\n

Aqui Baxter voluntariamente se tranca numa torre de marfim (…). Uma de minhas inten\u00e7\u00f5es ao conscientemente colaborar na cria\u00e7\u00e3o de situa\u00e7\u00f5es pelas quais ningu\u00e9m \u00e9 respons\u00e1vel (atrav\u00e9s do uso de v\u00e1rios nomes) era chamar a aten\u00e7\u00e3o (por analogia), daqueles que ainda n\u00e3o a haviam percebido, para esta ‘aus\u00eancia generalizada de responsabilidade’. Ao escrever e publicar ‘ReDistribution’ Baxter mostrava que suas a\u00e7\u00f5es n\u00e3o eram compat\u00edveis com seu posicionamento te\u00f3rico. A diverg\u00eancia ficou clara ap\u00f3s o Festival do Pl\u00e1gio, quando ele organizou os textos que acompanhariam uma instala\u00e7\u00e3o. Baxter s\u00f3 escreveu sua pr\u00f3pria contribui\u00e7\u00e3o quando todos os demais haviam lhe entregado seus textos, escrevendo deste modo e previamente\u00a0uma ‘resposta’ ao trabalho dos outros colaboradores (…).<\/p>\n

O panfleto do festival vendeu bem (300 exemplares da primeira edi\u00e7\u00e3o em quatro meses, e tr\u00eas reimpress\u00f5es subseq\u00fcentes), e funcionou eficazmente como propaganda do evento. Lendo-o agora, isto me surpreende, j\u00e1 que a pressa com que foi publicado se revela atrav\u00e9s dos (algumas vezes) fr\u00e1geis argumentos. Onde quer que tenha falhado, a publica\u00e7\u00e3o provou ser uma ferramenta \u00fatil para promover o debate (especialmente entre mim e Baxter), e um\u00a0produto das discuss\u00f5es que eu tivera com Harwood sobre os mass media<\/em>. Entretanto, apesar do interesse que gerou, muitos dos que se apresentaram no festival se contentaram em deixar que eu e Baxter nos digladi\u00e1ssemos teoricamente enquanto faziam ‘suas pr\u00f3prias coisas’, o que em geral significava contradizer tanto a mim quanto a ele sem fazer qualquer esfor\u00e7o para se inserir no debate e refutar nossos posicionamentos. Um exemplo extremo foi a declara\u00e7\u00e3o dada \u00e0 imprensa por William Clark, que sugeria que os ‘valores espirituais’ possu\u00edam um papel crucial no campo art\u00edstico! Era decepcionante que a maioria dos ‘plagiadores’ n\u00e3o possu\u00edssem qualquer desejo de examinar criticamente o uso que faziam do termo ‘arte’. Como pontuei no panfleto sobre o assunto, a mim parecia que o termo designava muitas das coisas \u00e0s quais eu me opunha na cultura das classes dominantes (a id\u00e9ia de universalidade, por exemplo). Referindo-se a isto, um dos participantes do festival me informou que eu n\u00e3o compreendia a arte, j\u00e1 que caso contr\u00e1rio eu n\u00e3o a criticaria! Eu pude apenas concluir que para o indiv\u00edduo em quest\u00e3o a arte n\u00e3o era algo a se compreender, mas um artigo de f\u00e9 religiosa (…).<\/p>\n

Quando chegou a\u00a0hora de organizar o festival, eu n\u00e3o havia pensado em qualquer estrat\u00e9gia de divulga\u00e7\u00e3o. Casualmente, eu me deparei com o livro de Denis MacShane, ‘Using The Media’ (Pluto Press, Londres, 1979), que se revelou um guia textual extremamente \u00fatil (…). Escrever um release eficiente exigiu algum grau de facilita\u00e7\u00e3o no texto; ao faz\u00ea-lo, n\u00e3o acredito que o festival tenha sido comprometido. O release principal dizia:<\/p>\n

‘O pintor Graham Harwood e o escritor Stewart Home organizaram um “Festival do Pl\u00e1gio” que tomar\u00e1 Londres no Ano Novo. O evento abordar\u00e1 a redund\u00e2ncia da “cultura s\u00e9ria”, em suas formas modernistas e p\u00f3s-modernistas. Simultaneamente, o festival oferecer\u00e1 uma plataforma alternativa a estes desgastados modos de express\u00e3o. “N\u00f3s queremos mostrar que a cultura n\u00e3o \u00e9 propriedade sagrada de um punhado de moralistas e intelectuais”, diz o organizador Stewart Home. “N\u00f3s chamamos o evento de ‘Festival do Pl\u00e1gio’ para deixar claro que qualquer um pode fazer o que fazemos. N\u00e3o \u00e9 preciso ser um g\u00eanio para plagiar!”, afirma Home’.<\/p>\n

‘O Festival ter\u00e1 in\u00edcio no dia 07 de janeiro, com o trabalho “Hoardings”, de Ed Baxter, Simon Dickason e Andy Hopton, na Bedford Hill Gallery, Balham. O trabalho consiste num arranjo bizarro de objetos kitsch e lixo tirados das ruas de Londres. William Feaver, escrevendo no Observer (“Anger In The Crypt” 8\/12\/85), descreve o trabalho de Baxter\u00a0e Dickason como “tanto um protesto quanto um alerta”, que levanta “mais perguntas que respostas”. A “Hoardings” se seguir\u00e3o outras sete exibi\u00e7\u00f5es durante o per\u00edodo de dois meses: incluindo uma obra coletiva na Copy Art, em Kings Cross, na qual todos os colaboradores assinar\u00e3o como Karen Eliot. A id\u00e9ia, neste caso, \u00e9 solapar o falso individualismo da sociedade de consumo, na qual “produtos culturais” s\u00e3o normalmente julgados pelo “nome de marca” que os acompanha. Outros eventos incorporados ao festival incluem mostras de v\u00eddeo, concertos musicais, o Dia Nacional da Grava\u00e7\u00e3o\u00a0Caseira [Home Taping] em 30 de janeiro (idealizado para enfurecer a ind\u00fastria musical), e a “re-encena\u00e7\u00e3o” dos famosos crimes de John Berndt’.<\/p>\n

‘A lista completa dos eventos segue em anexo, assim como uma defini\u00e7\u00e3o breve de pl\u00e1gio e uma xerox reduzida do p\u00f4ster promocional do festival. (…) Um panfleto de 32 p\u00e1ginas, “Plagiarism: art as commodity and strategies for its negation”, editado por Stewart Home, ser\u00e1 publicado pela Aporia Press em dezembro. Isto providenciar\u00e1 um foco te\u00f3rico para os debates que surgir\u00e3o no evento’.<\/p>\n

Como dito no texto, o Festival do Pl\u00e1gio (Londres) ocorreu entre janeiro e fevereiro de 1988. A obra inaugural (…) enfatizava o que parecia ser a mensagem central do evento: a cultura da comodidade \u00e9 um sistema baseado na estetiza\u00e7\u00e3o da morte. O capitalismo congela a vida humana e suas possibilidades, e vende o produto resultante para as mesmas pessoas de quem roubou a exist\u00eancia.<\/p>\n<\/blockquote>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

Ao contr\u00e1rio do que eu previa, essa hist\u00f3ria vai render mais de dois posts. Mesmo cortando aquilo que julguei dispens\u00e1vel do texto (foi mal a\u00ed, mania de editor. O texto completo tem aqui.), ainda s\u00e3o quase 20 p\u00e1ginas s\u00f3 dessa segunda parte. Apenas um coment\u00e1rio: n\u00e3o deixe de observar a grande sacada do “Dia Nacional […]<\/p>\n","protected":false},"author":2,"featured_media":8246,"comment_status":"open","ping_status":"open","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":[],"categories":[126,203],"tags":[252,253,254],"post_folder":[],"jetpack_featured_media_url":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-content\/uploads\/2012\/07\/humanityinruins1-1.jpg","_links":{"self":[{"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/1648"}],"collection":[{"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/users\/2"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=1648"}],"version-history":[{"count":0,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/1648\/revisions"}],"wp:featuredmedia":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/media\/8246"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=1648"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=1648"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=1648"},{"taxonomy":"post_folder","embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/post_folder?post=1648"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}