{"id":15183,"date":"2023-02-15T19:17:52","date_gmt":"2023-02-15T22:17:52","guid":{"rendered":"https:\/\/baixacultura.org\/?p=15183"},"modified":"2023-07-21T09:57:48","modified_gmt":"2023-07-21T12:57:48","slug":"mckenzie-wark-e-a-morte-do-capital","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/baixacultura.org\/2023\/02\/15\/mckenzie-wark-e-a-morte-do-capital\/","title":{"rendered":"McKenzie Wark e a morte do “capital”"},"content":{"rendered":"

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A publica\u00e7\u00e3o de \u201cO Capital Est\u00e1 Morto<\/a>\u201d, de McKenzie Wark, no Brasil, em parcerias das editoras Sob Influ\u00eancia e Funilaria, \u00e9 um acontecimento importante nos estudos cr\u00edticos sobre o neoliberalismo, especialmente nas discuss\u00f5es sobre comunica\u00e7\u00e3o, cultura digital e pol\u00edtica. Por dois motivos principais: um por ser o primeiro livro lan\u00e7ado no pa\u00eds de McKenzie, intelectual importante no mundo anglo-sax\u00e3o h\u00e1 pelo menos 20 anos, especialmente a partir de \u201cA Hacker Manifesto<\/em>\u201d (2004 – aqui em PDF<\/a>), uma potente cr\u00edtica \u00e0 mercantiliza\u00e7\u00e3o da informa\u00e7\u00e3o da informa\u00e7\u00e3o na era digital, que ecoa (e em alguns casos, remixa<\/i>) diretamente Guy Debord e seu \u201cA Sociedade do Espet\u00e1culo\u201d (PDF Edi\u00e7\u00f5es Antip\u00e1ticas, 2005<\/a>), inclusive na forma de escrita e na estrutura da obra.<\/p>\n

Intelectual nascida na Austr\u00e1lia, professora de M\u00eddia e Estudos Culturais na criativa New School for Social Research<\/a>, em Nova York, McKenzie (@chicamarx<\/a>) estuda m\u00eddia, cultura e tecnologia desde os anos 1990, com textos que v\u00e3o desde o legado dos situacionistas franceses da d\u00e9cada de 1950 e 1960 (como em The Beach Beneath the Street: The Everyday Like and Glorious Times of the Situationist International<\/i>, de 2011) \u00e0 teoriza\u00e7\u00e3o da cultura gamer <\/i>(Gamer Theory<\/i>, de 2006), passando tamb\u00e9m pela discuss\u00e3o sobre hist\u00f3ria da m\u00eddia, percep\u00e7\u00e3o e classe (Telesthesia: Communication, Culture and Class<\/i>, de 2012). Seus trabalhos analisam as mudan\u00e7as sociais pela inser\u00e7\u00e3o das tecnologias na sociedade (como em Excommunication: Three Inquiries in Media and Mediation<\/i>, com Alexander R. Galloway and Eugene Thacker, de 2013) a partir de referenciais marxistas, que bebem principalmente nos estudos culturais ingleses e nos p\u00f3s-estruturalistas franceses, mas tamb\u00e9m dos te\u00f3ricos de cr\u00edtica de m\u00eddia alem\u00e3 e dos autonomistas italianos. Aliado a essa ampla bagagem te\u00f3rica, a autora mescla em seus livros as refer\u00eancias e a profunda viv\u00eancia no mundo cultural, especialmente como DJ na cultura da m\u00fasica techno, a forte no\u00e7\u00e3o de corporeidade – relatada sobretudo em \u201cReverse Cowgirl<\/em>\u201d (2020, PDF<\/a>), em que McKenzie faz uma \u201cpolibiografia\u201d de sua transi\u00e7\u00e3o de g\u00eanero, como comenta Paul Preciado no pref\u00e1cio – e uma escrita que, informal e direta, mas tamb\u00e9m rigorosa e densa, almeja a teoria como uma forma de literatura.<\/p>\n

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Foto: Jessica Dunn Rovinelli<\/p><\/div>\n

O segundo motivo para a publica\u00e7\u00e3o de \u201cO Capital Est\u00e1 Morto\u201d ser importante no Brasil, claro, \u00e9 o pr\u00f3prio livro. Aqui, ela aprofunda alguns os argumentos em \u201cA Hacker Manifesto<\/em>\u201d (talvez seu livro mais influente, publicado tamb\u00e9m em espanhol<\/a>) para anunciar o que seria um novo modo de produ\u00e7\u00e3o, n\u00e3o mais capitalista, mas pior, que n\u00e3o se baseia mais seu poder na propriedade privada dos meios de produ\u00e7\u00e3o, mas sim no controle do \u201cvetor de informa\u00e7\u00e3o\u201d, formado por aquelas tecnologias que n\u00e3o apenas coletam grandes quantidades de dados, mas tamb\u00e9m os ordenam, gerenciam e processam para extrair seu valor. A tese central do livro, exposta desde seu in\u00edcio e trazida do \u201cA Hacker Manifesto<\/em>\u201d, \u00e9 de que a ascens\u00e3o deste modo de produ\u00e7\u00e3o (que podemos aproximar ao conceito de \u201cCapitalismo de Vigil\u00e2ncia, proposto por Shoshana Zuboff no j\u00e1 cl\u00e1ssico “A Era do Capitalismo de Vigil\u00e2ncia<\/em> – aqui PDF gr\u00e1tis ptbr<\/a> ) tem produzido uma contradi\u00e7\u00e3o no centro daqueles que almejam a ostentar o poder. Se antes, tradicionalmente, as classes dominantes controlavam algum tipo de bem escasso (a propriedade, os meios de produ\u00e7\u00e3o, etc), agora essa classe necessita controlar algo que \u00e9 extremamente abundante: a informa\u00e7\u00e3o. Esta contradi\u00e7\u00e3o, hoje sem resolu\u00e7\u00e3o alguma, encaminharia para um novo meio de produ\u00e7\u00e3o ainda mais selvagem que o capitalismo, em que o dom\u00ednio se daria na posse e no controle da informa\u00e7\u00e3o, manifestado na excel\u00eancia e no constante aperfei\u00e7oamento da coleta, do processamento, da visualiza\u00e7\u00e3o e da distribui\u00e7\u00e3o (ultra) personalizada dessa informa\u00e7\u00e3o no mundo digital. O que, por sua vez, n\u00e3o implica que os modos de produ\u00e7\u00e3o anteriores tenham sido apagados: eles coexistem e se sobrep\u00f5em, mas agora h\u00e1 uma classe emergente que, dominando a informa\u00e7\u00e3o, controla tamb\u00e9m o trabalho e o capital – pelo menos do jeito que tradicionalmente o entendemos.<\/p>\n

\u00c9 f\u00e1cil de ver alguns dos principais integrantes desta nova classe emergente: Amazon, Google, Meta (Facebook), Microsoft. Mas n\u00e3o s\u00f3; h\u00e1 tamb\u00e9m empresas que, oriundas da produ\u00e7\u00e3o de bens escassos tradicionais, adentram a esta nova classe buscando controlar a informa\u00e7\u00e3o log\u00edstica, caso da Nike e da Walmart. Maior empregadora dos Estados Unidos, a empresa varejista \u00e9 mostrada por McKenzie como uma empresa que conseguiu, atrav\u00e9s do uso massivo de dados, tanto organizar os fluxos de mercadorias e seu sistema de distribui\u00e7\u00e3o quanto criar um modelo preditivo de consumo a partir das informa\u00e7\u00f5es geradas por quem compra em suas lojas. Ao adotar a abordagem \u201corientada por dados\u201d, baseada na extra\u00e7\u00e3o de dados dos compradores, a Walmart potencializa um processo de explora\u00e7\u00e3o n\u00e3o apenas dos corpos e dos direitos dos trabalhadores, mas tamb\u00e9m de seus rastros digitais, um passo importante para a indu\u00e7\u00e3o de desejos e a constru\u00e7\u00e3o de formas ainda n\u00e3o vistas de controle. \u201cTalvez haja novas formas de explora\u00e7\u00e3o, desigualdade e assimetria como uma camada sobre as antigas com as quais estamos mais acostumados”, diz a autora (p.9).<\/p>\n

McKenzie desenvolve sua tese de modo flu\u00eddo, com usos da t\u00e1tica de desvio do d\u00e9tournement<\/i> de Debord (no primeiro cap\u00edtulo, principalmente) e tamb\u00e9m de refer\u00eancias culturais que v\u00e3o de Kim Gordon (Sonic Youth) ao filme \u201cO Jovem Marx<\/em>\u201d, tamb\u00e9m para tentar mostrar que criar uma nova linguagem (ou um estilo menos s\u00f3brio<\/i> e chato), como Marx fez em sua \u00e9poca, pode ser vital para analisar o hoje e encontrar sa\u00eddas para esse algo ainda pior que est\u00e1 vindo.<\/p>\n

Confira essa \u00f3tima entrevista com Mckenzie na Revista Rosa<\/a>;<\/p>\n

[Leonardo Foletto<\/strong>]<\/p>\n

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