{"id":1415,"date":"2009-03-11T19:51:56","date_gmt":"2009-03-11T19:51:56","guid":{"rendered":"https:\/\/baixacultura.org\/?p=1415"},"modified":"2009-03-11T19:51:56","modified_gmt":"2009-03-11T19:51:56","slug":"as-vantagens-financeiras-do-anticopyright","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/baixacultura.org\/2009\/03\/11\/as-vantagens-financeiras-do-anticopyright\/","title":{"rendered":"As vantagens financeiras do anticopyright"},"content":{"rendered":"

Retomo finalmente o trabalho por aqui, e o fa\u00e7o seguindo\u00a0o fluxo das\u00a0discuss\u00f5es em torno do copyright, com o devido posicionamento anticopyright, que felizmente t\u00eam gerado boas e exaltadas conversas na caixa de coment\u00e1rios.\u00a0O texto\u00a0abaixo \u00e9\u00a0uma tradu\u00e7\u00e3o do cap\u00edtulo final do livro Digital Resistance<\/strong><\/a>, do Critical Art Ensemble<\/strong><\/a>, do qual devem pintar mais trechos durante as pr\u00f3ximas semanas.<\/p>\n

Critical Art Ensemble<\/strong> (CAE<\/strong>) \u00e9 um coletivo\u00a0formado por\u00a0cinco artistas\u00a0envolvidos com\u00a0diversas linguagens e atuando em diversas frentes culturais.\u00a0A proposta do grupo \u00e9\u00a0operar na fronteira\u00a0entre arte, tecnologia, pol\u00edtica radical e teoria cr\u00edtica. No Brasil, a Conrad publicou um livro da gangue, o \u00f3timo Dist\u00farbio Eletr\u00f4nico<\/strong><\/a>, que est\u00e1 esgotado h\u00e1 algum tempo e nunca foi disponibilizado pra download pela editora, por raz\u00f5es inescrut\u00e1veis. Todos os livros do CAE\u00a0possuem o aviso “este livro pode ser livremente pirateado e citado<\/em>“, que \u00e9\u00a0exatamente o tema do cap\u00edtulo que se segue.<\/p>\n

H\u00e1 alguns coment\u00e1rios que precisam ser feitos sobre a tradu\u00e7\u00e3o. Este texto\u00a0(como boa parte da obra do CAE) aborda a necessidade de revis\u00e3o das leis autorais do ponto de vista do criador<\/em> — um posicionamento nem sempre inclu\u00eddo na pauta do debate, inclusive por aqui. Normalmente trata-se da quest\u00e3o do ponto de vista da circula\u00e7\u00e3o e do consumo, at\u00e9 porque s\u00e3o perspectivas comuns a todos n\u00f3s, inclusive aos criadores.<\/p>\n

Tratar a coisa do ponto de vista de quem cria implica em proposi\u00e7\u00f5es para a pr\u00f3pria pr\u00e1tica criativa,\u00a0e isso\u00a0d\u00e1 muito pano pra manga. Em fun\u00e7\u00e3o disto, o que seria um breve coment\u00e1rio antecedendo\u00a0o texto\u00a0terminou por ganhar autonomia, e\u00a0ser\u00e1 publicado num post separado. Por enquanto, \u00e9 urgente que se diga apenas o seguinte: os exemplos utilizados pelo CAE soam um tanto irreais vistos de uma perspectiva brazuca, onde o mercado editorial n\u00e3o \u00e9 dos mais fortes. Por aqui, os argumentos usados pelo coletivo no contexto da produ\u00e7\u00e3o\u00a0liter\u00e1ria seriam melhor percebidos se deslocados para o contexto da m\u00fasica, por exemplo. O anticopyright aplicado \u00e0 literatura necessita, no Brasil<\/em>, de outros argumentos. Mas nada disso invalida a proposta do texto, da qual a pr\u00f3pria manuten\u00e7\u00e3o do coletivo — que\u00a0permanece firme, forte e ativo h\u00e1 v\u00e1rios anos — \u00e9 a prova dos nove.<\/p>\n

[Reuben da Cunha Rocha.<\/strong>]<\/p>\n

\n

As Vantagens Financeiras do Anti-Copyright<\/strong><\/p>\n

Critical Art Ensemble<\/p>\n

Tradu\u00e7\u00e3o: Reuben da Cunha Rocha\u00a0<\/p>\n

Speed and wealth go hand in hand.<\/em><\/p>\n

Velocidade e prosperidade caminham juntas.<\/p>\n

-Paul Virilio<\/p>\n

Uma d\u00favida comum aos produtores culturais quanto ao movimento anticopyright \u00e9 de que maneira \u00e9 poss\u00edvel ser remunerado e ter reconhecida a autoria de uma obra sem se envolver em procedimentos legais para obt\u00ea-la. Este problema n\u00e3o tem sido abordado pelos nomes mais proeminentes na defesa do pl\u00e1gio, do electronic mirroring<\/em> e do anticopyright, que aparentemente se contentaram em desenvolver os princ\u00edpios dos movimentos em n\u00edveis muito mais te\u00f3ricos que pr\u00e1ticos. O mais antigo (desde Lautr\u00e9amont) e mais comum posicionamento (Debord, Home, Benjamin, Gyson, Isou, Kraus, bem como Karen Eliot, \u00aeTMark, e os projetos Luther Blisset) sobre porqu\u00ea a informa\u00e7\u00e3o n\u00e3o deve ser privatizada \u00e9 a cren\u00e7a de que a experimenta\u00e7\u00e3o e a inven\u00e7\u00e3o seriam obstru\u00eddas pela falta de acesso \u00e0s edifica\u00e7\u00f5es da cultura. Uma vez privatizados, os artefatos culturais (imagens ou linguagem) se convertem em capital cultural, refor\u00e7ando portanto a hierarquiza\u00e7\u00e3o social, como qualquer outra forma de capital. A privatiza\u00e7\u00e3o da cultura \u00e9 o processo atrav\u00e9s do qual os significados se estabilizam em c\u00f3digos ideol\u00f3gicos a servi\u00e7o do status quo<\/em>. Al\u00e9m disso, a privatiza\u00e7\u00e3o de artefatos culturais confere ao produtor o falso status de criador metaf\u00edsico, e investe os criadores de uma falsa aura de individualismo m\u00edstico. O que eles fazem na verdade \u00e9 apenas participar da pr\u00e1tica geral da recombina\u00e7\u00e3o cultural – um processo no qual representa\u00e7\u00e3o enquanto reflexo de uma genialidade pessoal n\u00e3o passa de uma manobra c\u00ednica para aumentar as vendas de artefatos. Mais ainda, cultura privatizada \u00e9 cultura de mercado, e j\u00e1 que as resist\u00eancias culturais n\u00e3o querem dar ao mercado mais nada que possa ser vendido como “novo”, t\u00e1ticas para gerar novos significados a partir de representa\u00e7\u00f5es conhecidas t\u00eam sido desenvolvidas desde o s\u00e9culo passado. Talvez tais t\u00e1ticas sejam concretas apenas na medida em que os discursos anticopyright o s\u00e3o, embora haja id\u00e9ias ainda mais nobres sobre a quest\u00e3o, como a de que participar da privatiza\u00e7\u00e3o \u00e9 vender-se a demandas de mercado. Mas para evitar tal destino no capitalismo tardio s\u00f3 \u00e9 poss\u00edvel escolher entre tornar-se artista de gaveta (mais um triste estere\u00f3tipo criado pelo capital para solapar o desenvolvimento de identidades sociais e solidariedade) ou vender-se de outra forma (ou seja, trabalhar). N\u00e3o importa onde procure, o produtor cultural s\u00f3 encontrar\u00e1 imperativos de pureza ideol\u00f3gica ou abstra\u00e7\u00f5es te\u00f3ricas, e nenhum conselho pr\u00e1tico.<\/p>\n

\u00c9 poss\u00edvel, entretanto, fazer algumas observa\u00e7\u00f5es pr\u00e1ticas sobre anticopyright. Primeiro, o copyright n\u00e3o trata de acesso ou uso individual<\/em> (embora este seja um efeito colateral comum). Os dois princ\u00edpios-chave de sua exist\u00eancia s\u00e3o a prote\u00e7\u00e3o de uma institui\u00e7\u00e3o<\/em> contra a agress\u00e3o de outra, e a manuten\u00e7\u00e3o do controle exclusivo sobre um produto, de modo que o mercado consiga obter o maior lucro poss\u00edvel. O indiv\u00edduo n\u00e3o \u00e9 parte de nenhum dos dois processos. Estes princ\u00edpios s\u00e3o extremamente simples. Em qualquer modelo de capitalismo, uma institui\u00e7\u00e3o que possui concorr\u00eancia far\u00e1 o poss\u00edvel para enfraquecer as outras empresas e garantir sua pr\u00f3pria sobreviv\u00eancia, o que inclui roubo de produtos (espionagem industrial, sobretudo em n\u00edvel internacional, \u00e9 comum no mundo dos neg\u00f3cios). Especialmente no que se refere a produtos digitais – aparente m\u00e1 not\u00edcia para escritores, cineastas, m\u00fasicos de est\u00fadio e ciberartistas. Legisla\u00e7\u00f5es de copyright diminuem e retardam a pr\u00e1tica do roubo, ofuscando a percep\u00e7\u00e3o p\u00fablica sobre a aquisi\u00e7\u00e3o de produtos como nada al\u00e9m de pirataria branda. Se tal processo \u00e9 retardado, o mercado e seus produtos podem ser razoavelmente administrados, mas isso tudo ocorre em um plano macro. Do ponto de vista do mercado, o roubo pode ser tolerado no plano individual. C\u00f3pias de livros ser\u00e3o feitas, fotos de obras de arte, samplers<\/em> de sons, r\u00e9plicas de v\u00eddeos, c\u00f3pias de todas estas coisas circular\u00e3o de m\u00e3o em m\u00e3o.<\/p>\n

\u00c9 aqui que come\u00e7a a confus\u00e3o: indiv\u00edduos produtores de cultura (no sentido mais amplo do termo) perguntam se ser\u00e3o pagos por seu trabalho em fun\u00e7\u00e3o da c\u00f3pia indiscriminada. \u00c9 uma ang\u00fastia infundada. A n\u00e3o ser que o artista se transforme em institui\u00e7\u00e3o, n\u00e3o h\u00e1 com o que se preocupar. Elvis, por exemplo, foi transformado de indiv\u00edduo em institui\u00e7\u00e3o. “Elvis” n\u00e3o se refere a um ser humano, refere-se a v\u00eddeos, filmes, grava\u00e7\u00f5es e todo tipo de propaganda. O indiv\u00edduo Elvis \u00e9 t\u00e3o irrelevante para a f\u00f3rmula que ele nem sequer precisa estar vivo para que “Elvis” esteja. Celebridades de qualquer \u00e1rea da cultura precisam do copyright por se tratarem de institui\u00e7\u00f5es em defesa de seu pr\u00f3prio capital, ao inv\u00e9s de pessoas. N\u00e3o \u00e9 o caso, entretanto, dos indiv\u00edduos produtores – para estes, na maioria dos casos o copyright se mostra contraproducente. Digamos, por exemplo, que um autor tenha publicado um livro que ir\u00e1 vender cinco ou dez mil de exemplares. Isso n\u00e3o interessa a grandes editoras, seria pouco lucrativo piratear o livro e se envolver em problemas judiciais. Claro, haver\u00e1 pessoas que copiar\u00e3o o livro e passar\u00e3o c\u00f3pias adiante. Quem sabe algu\u00e9m chegue a disponibiliz\u00e1-lo gratuitamente na internet e pequenas editoras de outros pa\u00edses o traduzam e publiquem. CAE argumenta que tais atividades ser\u00e3o ben\u00e9ficas em longo prazo, e devem ser encorajadas atrav\u00e9s do anticopyright. Quanto mais uma obra \u00e9 conhecida, maior \u00e9 a probabilidade de que algu\u00e9m a compre, e \u00e9 bem poss\u00edvel que comiss\u00f5es, palestras e outras oportunidades de gerar renda surjam dessa situa\u00e7\u00e3o. O dinheiro perdido com a c\u00f3pia dos livros aparece de outras formas. Quanto mais r\u00e1pido se dissemina a informa\u00e7\u00e3o, tanto melhor para os diversos discursos para os quais a informa\u00e7\u00e3o \u00e9 relevante, e no plano individual, maior o dinheiro gerado. Velocidade e r\u00e9plica geram recursos na era digital! Retardar o processo com o copyright \u00e9 contraproducente, tanto em termos de compensa\u00e7\u00e3o individual quanto de uma produ\u00e7\u00e3o cultural de resist\u00eancia.<\/p>\n

\u00a0<\/p>\n

*Originalmente publicado em Libres Enfants du Savoir Numerique: Une<\/em> Anthologie du “Libre” <\/em>(Paris: Editions de l’\u00c9clat).<\/p>\n<\/blockquote>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

Retomo finalmente o trabalho por aqui, e o fa\u00e7o seguindo\u00a0o fluxo das\u00a0discuss\u00f5es em torno do copyright, com o devido posicionamento anticopyright, que felizmente t\u00eam gerado boas e exaltadas conversas na caixa de coment\u00e1rios.\u00a0O texto\u00a0abaixo \u00e9\u00a0uma tradu\u00e7\u00e3o do cap\u00edtulo final do livro Digital Resistance, do Critical Art Ensemble, do qual devem pintar mais trechos durante as […]<\/p>\n","protected":false},"author":2,"featured_media":0,"comment_status":"open","ping_status":"open","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":[],"categories":[126,203],"tags":[199,121,226],"post_folder":[],"jetpack_featured_media_url":"","_links":{"self":[{"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/1415"}],"collection":[{"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/users\/2"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=1415"}],"version-history":[{"count":0,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/1415\/revisions"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=1415"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=1415"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=1415"},{"taxonomy":"post_folder","embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/post_folder?post=1415"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}