{"id":13990,"date":"2009-09-18T14:41:51","date_gmt":"2009-09-18T14:41:51","guid":{"rendered":"https:\/\/baixacultura.org\/?p=2229"},"modified":"2009-09-18T14:41:51","modified_gmt":"2009-09-18T14:41:51","slug":"ofensiva-mundial-contra-a-pirataria-digital","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/baixacultura.org\/2009\/09\/18\/ofensiva-mundial-contra-a-pirataria-digital\/","title":{"rendered":"Ofensiva mundial contra a “pirataria” digital"},"content":{"rendered":"

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\"bandeira-pirata-digital\"<\/p>\n

A quest\u00e3o da “pirataria” digital e da suposta viola\u00e7\u00e3o dos direitos de autor\u00a0 – que, como h\u00e1 tempos j\u00e1 se sabe, significa principalmente perda de lucros<\/a> para os grandes conglomerados da Ind\u00fastria Cultural – \u00e9 a ponta de lan\u00e7a no debate em torno da cultura livre e, consequentemente, da internet livre. Como j\u00e1 deu pra perceber h\u00e1 algum tempo, \u00e9 s\u00f3 se chegar nas discuss\u00f5es sobre copyright nos conte\u00fados distribu\u00eddos pela web que o debate se acirra, e os “lados” de cada parte s\u00e3o facilmente revelados.<\/p>\n

Normalmente, d\u00e1 para separar as posi\u00e7\u00f5es em tr\u00eas tipos: 1) <\/strong>aqueles que lucraram durante muito tempo com os royalties <\/em>do direito autoral e fazem de tudo para permanecerem lucrando, nem que para isso tenham que processar as pr\u00f3prias pessoas que d\u00e3o o lucro \u00e0 eles; 2)<\/strong> os que tentam entender a tremenda mudan\u00e7a de paradigma que as redes (especialmente a internet) est\u00e3o trazendo para a sociedade\/cultura\/economia e buscam alternativas que, de alguma forma, levem em considera\u00e7\u00e3o este novo cen\u00e1rio que se apresenta; e, por fim, 3)<\/strong> os que ficam em cima do muro: tentam entender os novos tempos, mas est\u00e3o paralizados na busca de alternativas, pois o peso da grana que receberam (ou recebem) de direitos autorais ainda conta e muito para eles pensarem trocentas vezes se vale a pena sair de suas confort\u00e1veis posi\u00e7\u00f5es a apostar no incerto futuro<\/p>\n

Para cada uma destas posi\u00e7\u00f5es existem diversos exemplos, e eu passo para ti a tentativa de encaixar estes exemplos nas tr\u00eas posi\u00e7\u00f5es. O certo \u00e9 que nas \u00faltimas semanas surgiram algumas decis\u00f5es que sugerem que a\u00a0 guerra est\u00e1 longe de acabar, e que \u00e9 imposs\u00edvel negar que a sanha por $$ est\u00e1 tendo uma influ\u00eancia direta (e nefasta) nestas decis\u00f5es.<\/p>\n

**<\/p>\n

\"hadopijpg\"<\/p>\n

Vejamos a primeira das situa\u00e7\u00f5es: a Assembleia Nacional Francesa aprovou<\/a>, nesta \u00faltima ter\u00e7a-feira 15 de setembro, a segunda vers\u00e3o do projeto de lei \u201cCria\u00e7\u00e3o e Internet\u201d, mais conhecido por Hadopi 2<\/strong>, que prev\u00ea a suspens\u00e3o da liga\u00e7\u00e3o \u00e0 Internet dos usu\u00e1rios da internet acusados de partilhar conte\u00fados protegidos por copyright<\/strong>. O documento passou com 285 votos a favor e 225 contra, um qu\u00f3rum que, segundo nos conta o Remixtures<\/a>, se deve “muito gra\u00e7as \u00e0 presen\u00e7a em for\u00e7a dos deputados da Uni\u00e3o Movimento Popular (UMP), o partido do presidente Nicolas Sarkozy” – que, sabe-se, \u00e9 particularmente contr\u00e1rio ao livre compartilhamento de arquivos via web, dizem que por influ\u00eancia de sua excelent\u00edssima esposa, a cantora Carla Bruni.<\/p>\n

O Hadopi<\/a> \u00e9 uma lei extremamente radical, a ponto de sua primeira vers\u00e3o ter sido barrada pelo Conselho Constitucional da Fran\u00e7a por ter algumas partes consideradas inconstitucionais. Dentre outras prerrogativas, pol\u00eamicas, a lei criaria a autoridade administrativa HADOPI (High Authority for the Broascast of Content and the Protection of Internet Rights<\/em>, que poderia ser traduzido por “alta autoridade para a transmiss\u00e3o de conte\u00fado e prote\u00e7\u00e3o de direitos da internet”), que seria a \u00fanica respons\u00e1vel<\/strong> por decis\u00f5es como a suspens\u00e3o da conex\u00e3o da internet do usu\u00e1rio que supostamente violasse os direitos de autor no download de arquivos.<\/p>\n

J\u00e1 o Hadopi 2 tem como principal diferen\u00e7a o fato de conceder apenas a uma autoridade judicial \u2013 e n\u00e3o ao tal HADOPI\u00a0 \u2013 o direito de ordenar a suspens\u00e3o do acesso \u00e0 Internet dos visados que reincindissem no suposto “crime” de baixar conte\u00fado protegido por copyright<\/strong>. A nova lei indica que s\u00f3 um juiz poder\u00e1 bater o martelo sobre o caso (como o governo franc\u00eas quer agilizar o processo, ele ter\u00e1 m\u00e9dia de 5 minutos para dar o veredicto). Ao Hadopi caberia ainda administrar todo o processo de envio de notifica\u00e7\u00f5es aos fornecedores de acesso \u00e0 Internet dos visados.<\/p>\n

\""Amor,

“Amor, ser\u00e1 que agora v\u00e3o comprar meu novo disco?”<\/p><\/div>\n

Quem correria risco de ser delatado pela Hadopi: o usu\u00e1rio apanhado tr\u00eas vezes seguidas tentando ferir direitos autorais de filmes, m\u00fasicas e outros produtos culturais. A pessoa que ignorar os avisos, enviados por e-mail e carta registrada, pode ter o acesso \u00e0 internet privado em um ano. Puni\u00e7\u00f5es mais duras abrangem multa de 300 mil euros (R$ 795 mil) e\/ou pris\u00e3o por at\u00e9 dois anos.<\/p>\n

Ainda falta mais uma etapa para a lei entrar em vigor: passar pelo crivo de uma pequena comiss\u00e3o de senadores e membros da Assembl\u00e9ia, que vai tentar chegar a uma vers\u00e3o que adeque as modifica\u00e7\u00f5es introduzidas no Senado e na Assembl\u00e9ia francesa. O governo franc\u00eas d\u00e1 como certa a aprova\u00e7\u00e3o da nova lei, e diz que ela estar\u00e1 em vigor at\u00e9 o fim do ano – o que muita gente duvida, j\u00e1 que esta \u00faltima etapa ainda poder\u00e1 ganhar recursos dos que se op\u00f5e \u00e0 lei.<\/p>\n

O certo \u00e9 que o poss\u00edvel funcionamento do Hadopi est\u00e1 cercado de d\u00favidas. A principal delas: como o governo controlar\u00e1 os downloads dos usu\u00e1rios? atrav\u00e9s de um software obrigatoriamente instalado nos dispositivos ou do controle dos provedores de acesso \u00e0 internet?<\/strong> Como os provedores v\u00e3o armazenar tamanha informa\u00e7\u00e3o de seus usu\u00e1rios, e at\u00e9 que ponto a obriga\u00e7\u00e3o da instala\u00e7\u00e3o de um software n\u00e3o fere a liberdade individual de cada um s\u00e3o apenas duas das diversas d\u00favidas que pairam sobre o funcionamento do Hadopi, desde j\u00e1 uma nefasta lei patrocinada e aplaudida pelas ind\u00fastrias de entretenimento, que assim pensam em coibir uma pr\u00e1tica j\u00e1 disseminada na sociedade. Tanto esfor\u00e7o e dinheiro seriam muito melhor aplicados se fossem destinados a olhar pra frente, na busca de solu\u00e7\u00f5es e alternativas para este novo cen\u00e1rio cibercultural, do que na tentativa de manter um status quo<\/em> imposs\u00edvel de continuar existindo<\/strong>.<\/p>\n

***<\/p>\n

\""Vamos

“Vamos acabar com os piratinhas”<\/p><\/div>\n

A segunda situa\u00e7\u00e3o ocorreu no Brasil, mais precisamente no Paran\u00e1. A empresa Cadari Tecnologia da Informa\u00e7\u00e3o<\/a>, respons\u00e1vel pelo software P2P K-Lite Nitro<\/a> (que permite a conex\u00e3o simult\u00e2nea em tr\u00eas redes peer-to-peer<\/em>) foi obrigada a n\u00e3o mais disponibilizar o software “enquanto nele n\u00e3o forem instalados filtros que evitem que as grava\u00e7\u00f5es protegidas por direito autoral” das empresas que a extinta Apdif (Associa\u00e7\u00e3o Protetora dos Direitos Intelectuais Fonogr\u00e1ficos<\/em>) representava “sigam sendo violadas de forma maci\u00e7a e constante”. As empresas em quest\u00e3o s\u00e3o EMI, Som Livre, Sony Music, Universal Music e Warner Music, hoje representadas no Brasil pela nossa conhecida<\/a> APCM.<\/p>\n

A decis\u00e3o foi publicada<\/a> na \u00faltima segunda-feira\u00a0 na 6\u00aa C\u00e2mara C\u00edvel do Tribunal de Justi\u00e7a do Paran\u00e1 (TJPR), e foi tomada pelo senhor do meio da foto acima, desembargador Xisto Pereira<\/strong>. Ela abre um perigoso precedente no Brasil, pois como diz o advogado Omar Kaminski<\/strong> neste post <\/a>do blog Internet Legal<\/strong>, “pela l\u00f3gica manifestada, potencialmente qualquer site no Brasil que disponibilize clientes P2P estaria sujeito a responsabiliza\u00e7\u00e3o, a ter seu neg\u00f3cio amea\u00e7ado pela suposta ilicitude do ato de hospedar determinados tipos de <\/em>software<\/em>“. <\/em>Se esta decis\u00e3o for tomada como exemplo, ela inviabilizaria toda e qualquer p\u00e1gina que disponibilizasse software de p2p.<\/p>\n

Ao saber da informa\u00e7\u00e3o da decis\u00e3o do tribunal do Paran\u00e1, o advogado e professor T\u00falio Vianna<\/a>, um l\u00facido defensor da liberdade na web do qual j\u00e1 falamos<\/a> e mostramos<\/a> por aqui, soltou em seu twitter<\/a> o adjetivo “absurdo” pra comentar o causo. Mais: apresentou os argumentos para tal adjetivo indicando um texto <\/a> – ainda de 2005 – que tratava de outro caso semelhante acontecido nos Estados Unidos. Apesar de casos diferentes, as considera\u00e7\u00f5es de um vale pra outro:<\/p>\n

\n

Os direitos autorais t\u00eam como fundamento jur\u00eddico a necessidade de incentivo aos autores que, em tese, se sentiriam estimulados a produzirem novas inven\u00e7\u00f5es se fossem remunerados por suas descobertas<\/strong>. Paradoxalmente, a Suprema Corte estadunidense inverteu o racioc\u00ednio: protegeu os direitos autorais para que novos softwares \u0093peer\u2013to\u2013peer\u0094 n\u00e3o fossem desenvolvidos. Cerceou a criatividade intelectual em prol da tutela dos direitos autorais.<\/em><\/p>\n

\u00c9 evidente que por tr\u00e1s desta decis\u00e3o n\u00e3o se encontra a necessidade de est\u00edmulo \u00e0 criatividade art\u00edstica e ao desenvolvimento tecnol\u00f3gico. As redes \u201cpeer\u2013to\u2013peer\u201d possibilitaram uma diversidade de acesso \u00e0 produ\u00e7\u00e3o cultural nunca antes imaginada<\/strong>. Por meio delas, qualquer pessoa conectada \u00e0 internet pode ter acesso a m\u00fasicas \u00e1rabes, filmes iranianos, literatura africana, dentre uma inesgot\u00e1vel fonte de recursos culturais jamais acess\u00edveis pelos meios tradicionais. Dif\u00edcil imaginar um maior est\u00edmulo \u00e0 criatividade intelectual.<\/em><\/p>\n

Por meio da responsabilidade objetiva pune\u2013se indiscriminadamente o respons\u00e1vel por um resultado danoso sem se levar em conta sua inten\u00e7\u00e3o ou mesmo sua culpa<\/strong>. Afasta\u2013se assim da discuss\u00e3o a boa\u2013f\u00e9 do desenvolvedor do software. N\u00e3o se debate se o programa foi criado para fins l\u00edcitos ou il\u00edcitos, mas t\u00e3o\u2013somente se algum usu\u00e1rio o utilizou para violar direitos autorais. Pune\u2013se pelo efeito, n\u00e3o pela causa<\/strong>.<\/em><\/p>\n<\/blockquote>\n

A APCM, como n\u00e3o poderia deixar de ser, adorou a decis\u00e3o. Em mat\u00e9ria da Folha Online<\/a>, disseram que ela \u00e9 “important\u00edssima para o futuro do mercado de m\u00fasica digital no Brasil”. A opini\u00e3o de Pedro Rosa, presidente da ABPD<\/a> (Associa\u00e7\u00e3o Brasileira dos Produtores de Discos<\/em>), \u00e9 ainda mais grave, porque demonstra uma aliena\u00e7\u00e3o incr\u00edvel da realidade atual: “n\u00e3o se trata de uma decis\u00e3o contra uma determinada tecnologia, mas sim contra um modelo de neg\u00f3cio criado e explorado economicamente, cujo principal atrativo \u00e9 a viola\u00e7\u00e3o cont\u00ednua e em larga escala de direitos autorais consagrados em nossa Constitui\u00e7\u00e3o Federal e em legisla\u00e7\u00e3o espec\u00edfica<\/em>“.<\/p>\n

***<\/p>\n

Outras iniciativas contr\u00e1rias – direta ou indiretamante – ao livre compartilhamento de arquivos na rede, seja nos Estados Unidos<\/a>, na\u00a0 Alemanha<\/a> ou no Reino Unido<\/a>, lembram que ainda teremos muitas batalhas at\u00e9 que se possa dizer que um dos lados saiu vencedor. Conv\u00e9m ficarmos atentos e lembrar de uma frase de Lawrence Lessig em seu Cultura Livre<\/a>: “a lei e a tecnologia est\u00e3o sendo alteradas para dar aos detentores do copyright um n\u00edvel de controle sobre nossa cultura que jamais tiveram antes”<\/strong>.<\/p>\n

[Leonardo Foletto<\/strong>.]<\/p>\n

Cr\u00e9ditos fotos: 1<\/a>,2<\/a>,3<\/a>, 4<\/a>,<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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