{"id":13750,"date":"2021-10-13T21:35:18","date_gmt":"2021-10-13T21:35:18","guid":{"rendered":"https:\/\/baixacultura.org\/?p=13750"},"modified":"2021-10-13T21:35:18","modified_gmt":"2021-10-13T21:35:18","slug":"baixacharla-ao-vivo-10-nao-ha-saidas-com-elias-maroso","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/baixacultura.org\/2021\/10\/13\/baixacharla-ao-vivo-10-nao-ha-saidas-com-elias-maroso\/","title":{"rendered":"BaixaCharla ao vivo #10: N\u00e3o h\u00e1 sa\u00eddas? com Elias Maroso"},"content":{"rendered":"
<\/p>\n
O artista e pesquisador Elias Maroso \u00e9 um \u00e1vido buscador de sa\u00eddas. Em 2009, no auge das pol\u00edticas culturais do Governo Lula, criou, junto com outros artistas e produtores culturais de Santa Maria e Porto Alegre (RS), uma primeira sa\u00edda para o espa\u00e7o art\u00edstico tradicional: a Sala Dobradi\u00e7a<\/a>. \u201cOperar dobras sobre as no\u00e7\u00f5es de espa\u00e7o art\u00edstico, buscando diferentes modos de se produzir efeitos de arte aberto a interessados\u201d foi o que a Dobradi\u00e7a se prop\u00f4s a fazer – e de fato fez, ao criar m\u00faltiplos de exposi\u00e7\u00e3o port\u00e1til para obras reprodut\u00edveis, formatos de ocupa\u00e7\u00e3o do espa\u00e7o p\u00fablico para a arte urbana, espa\u00e7os-suportes para exposi\u00e7\u00f5es itinerantes, entre outras diversas encarna\u00e7\u00f5es da SD, como algumas das imagens abaixo mostram.<\/span><\/p>\n Exposi\u00e7\u00e3o “Palimpsesto III”, com banda Pele de Asno, na Sala Dobradi\u00e7a (como espa\u00e7o-suporte de exposi\u00e7\u00e3o), 2009.<\/p><\/div>\n <\/p>\n Formato expositivo para artistas convidados, Sala Dobradi\u00e7a.<\/p><\/div>\n <\/p>\n Espa\u00e7o Recombinante na Gare da Antiga Esta\u00e7\u00e3o F\u00e9rrea de Santa Maria \/ RS, Ano de 2011. Paulo Fernando Machado.<\/p><\/div>\n Anima\u00e7\u00e3o feita com registros do Itiner\u00e1rio SD 0.5 (SM-POA), 2010<\/p><\/div>\n Em sua tese de Doutorado<\/span><\/a>, defendida no in\u00edcio de 2021 no programa de Artes Visuais da UFRGS, a pista de um caminho encontrado como sa\u00edda j\u00e1 no nome: \u201cCircuitos de entrada e de sa\u00edda: por uma po\u00e9tica do <\/span>atravessamento<\/b>\u201d. Atravessar o espa\u00e7o f\u00edsico de exposi\u00e7\u00e3o e subvert\u00ea-lo, uma busca constante do trabalho de Elias, mas aqui tamb\u00e9m o atravessamento como conceito operat\u00f3rio, que inclui aportes te\u00f3ricos, diferentes linguagens art\u00edsticas e <\/span>circuitos <\/b>de entradas e sa\u00eddas para pensar o processo art\u00edstico em m\u00faltiplos espa\u00e7os, impregnado das varia\u00e7\u00f5es atmosf\u00e9ricas de cada um destes.<\/span><\/p>\n Em sua tese, tratou de mostrar em termos palp\u00e1veis essa po\u00e9tica do atravessamento a partir de quatro \u201ccadernos-se\u00e7\u00e3o\u201d: Espa\u00e7o Mental, Sala Fechada, Zona de Passagem e \u00c1rea Aberta<\/strong>. Em cada um deles, uma s\u00e9rie de obras em t\u00e9cnicas diversas – desenhos, instala\u00e7\u00f5es, fotografias, registros de interven\u00e7\u00f5es urbanas, ilustra\u00e7\u00f5es – que pensam \u201csa\u00eddas\u201d pela busca da autonomia tecnol\u00f3gica, o uso t\u00e1tico da linguagem e a op\u00e7\u00e3o de n\u00e3o se prender a um \u00fanico caminho (ou t\u00e9cnica, ou tecnologia).<\/span><\/p>\n Trecho da capa da tese de Elias, 2021<\/p><\/div>\n Pablo Carlos Budassi, Universo Observ\u00e1vel. Ilustra\u00e7\u00e3o logar\u00edtmica do espa\u00e7o sideral, bordeada pela radia\u00e7\u00e3o c\u00f3smica do Big Bang, com Sistema Solar ao centro. Fonte: BASCOM, 2017, inserida na tese de Elias.<\/p><\/div>\n Trecho da tese de Elias, 2021<\/p><\/div>\n “Dobras no espa\u00e7o III”, inserida na tese de Elias, 2021<\/p><\/div>\n <\/p>\n “Dedico-me a formas dif\u00edceis. Decompor e recompor modelos\u00a0 cristalizados na consci\u00eancia e nos espa\u00e7os de contato. Esfor\u00e7o para novos calos\u00a0 neurais, termina\u00e7\u00f5es sin\u00e1pticas. Sempre h\u00e1 um ou mais problemas de vis\u00e3o pelos quais me perco e contaminam o que vejo. Tem vezes que consigo p\u00f4r a vontade em alguma imagem tang\u00edvel. Outras se mant\u00eam na teimosia \u2013 cabe lembrar de \u00cdtalo Calvino, ao dizer que \u201cquando tudo tiver encontrado uma <\/span>ordem e um lugar em minha mente, come\u00e7arei a n\u00e3o achar mais nada digno de\u00a0<\/span>nota\u201d (CALVINO, 2011, p. 166).” (Trecho da tese de Elias Maroso, p.32, 2021)<\/span><\/em><\/p>\n<\/blockquote>\n Durante seu doutorado, Elias conseguiu tamb\u00e9m tematizar sua busca por sa\u00eddas diversas de uma forma ainda mais evidente em, pelo menos, tr\u00eas trabalhos. <\/span>Apenas uma Sa\u00edda<\/span><\/i>, de 2016, s\u00e3o sinaliza\u00e7\u00f5es luminosas para espa\u00e7os fechados concebidas com tor\u00e7\u00f5es, dobras e quebras de placas de sa\u00edda encontradas em espa\u00e7os de circula\u00e7\u00e3o p\u00fablica.<\/span><\/p>\n Diagrama para Encontrar uma Sa\u00edda,<\/span><\/i> de 2018,<\/span> \u00e9 uma instala\u00e7\u00e3o que re\u00fane diversos ensaios de objetos em torno da ideia do atravessamento da parede expositiva, conectados entre si por fios de cobre esmaltado. Exposto na Galeria da Funda\u00e7\u00e3o Ecarta, em Porto Alegre, conta tamb\u00e9m com dois desenhos circulares feitos com a fotocorros\u00e3o qu\u00edmica de l\u00e2minas de cobre, esses afastados da parede por suportes de acr\u00edlico transparente. Os desenhos est\u00e3o conectados a \u00edm\u00e3s de neod\u00edmio e a um Arduino para receberem impulsos el\u00e9tricos de baixa frequ\u00eancia em um ritmo pr\u00e9-determinado.<\/span><\/p>\n Grifos de Sa\u00edda<\/span><\/i>, de 2019, que participou da exposi\u00e7\u00e3o do\u00a0 IV Concurso de Arte Impressa do Goethe-Institut de Porto Alegre, tem como pe\u00e7a central duas p\u00e1ginas de texto do conto de Franz Kafka chamado”Um Relat\u00f3rio para uma Academia”, de 1919, que trata a hist\u00f3ria de um macaco enjaulado que, no anseio de encontrar uma sa\u00edda, acaba por se transformar em um europeu civilizado. Comprimido em apenas duas p\u00e1ginas, a tipografia, feita pelo pr\u00f3prio Elias (que j\u00e1 <\/span>tinha desenhado outra fonte<\/span><\/a>, \u201cRecombinante\u201d, dispon\u00edvel em formato .ttf para computadores e espalhado por algumas ruas de Santa Maria, Porto Alegre e Bel\u00e9m,), faz o conto parecer uma malha uniforme de signos\/c\u00f3digos a serem decifrados. Dessa malha de texto saem “grifos luminosos” todas vezes em que a palavra sa\u00edda aparece.\u00a0<\/span><\/p>\n Apenas Uma Sa\u00edda II. Cortes de acr\u00edlico, l\u00e2mpadas LED e fia\u00e7\u00e3o el\u00e9trica. 2018<\/p><\/div>\n <\/p>\n Diagrama para Encontrar uma Sa\u00edda, 2018.<\/p><\/div>\n Detalhe de Diagrama para Encontrar uma Sa\u00edda. Conectores de metal, acr\u00edlico, clipes met\u00e1licos, l\u00e2mpadas LED, parafusos e fios de cobre esmaltado, 2018.<\/p><\/div>\n Vista geral de Grifos de Sa\u00edda. Montagem na primeira exposi\u00e7\u00e3o do IV Concurso de Arte Impressa do Goethe-Institut de Porto Alegre. Ano de 2019.<\/p><\/div>\n <\/p>\n Detalhe de Grifos de Sa\u00edda, 2019.<\/p><\/div>\n A busca da autonomia tecnol\u00f3gica como sa\u00edda levou tamb\u00e9m Elias a aprender a construir suas pr\u00f3prias tecnologias. Uma parte dessa busca est\u00e1 em <\/span>Diagrama 88.8 (R\u00e1dio Infinito)<\/span><\/i> (2018-2019), uma instala\u00e7\u00e3o composta por prot\u00f3tipos de radiotransmissores FM, cortes de acr\u00edlico \u00e0 laser, chapas de lat\u00e3o e cobre fotocorro\u00eddos, fios de cobre, parafusos e l\u00e2mpadas LED. N\u00e3o sendo programador nem alocado na \u00e1rea da computa\u00e7\u00e3o, ele aprendeu a fazer um prot\u00f3tipo de radiotransmissor FM artesanal com componentes eletr\u00f4nicos, bateria de l\u00edtio de 3V, desenhos em lat\u00e3o fotocorro\u00eddo quimicamente e pe\u00e7as de acr\u00edlico cristal cortados \u00e0 laser. A faixa de r\u00e1dio 88.8 FM tinha uma programa\u00e7\u00e3o com audiodescri\u00e7\u00e3o (das obras) para cegos, trechos liter\u00e1rios e ru\u00eddos, que poderiam ser escutados em um per\u00edmetro de cerca de 30 metros de dist\u00e2ncia do local onde estava exposta, o Espa\u00e7o de Artes da UFCSPA.<\/span><\/p>\n \u201cA radiotransmiss\u00e3o \u00e9 um recurso de interesse em minha pr\u00e1tica art\u00edstica, porque \u00e9 uma maneira de atravessar limites f\u00edsicos do espa\u00e7o por meio das ondas eletromagn\u00e9ticas. A parede n\u00e3o \u00e9 um obst\u00e1culo para as ondas de r\u00e1dio. Elas simplesmente cruzam o concreto e podem seguir de um lugar para o outro conforme a energia de seu impulso. A ideia de atravessar as paredes da exposi\u00e7\u00e3o art\u00edstica se baseia no pensamento de que a arte n\u00e3o precisa ser entendida apenas como um campo disciplinar do conhecimento fechado sobre si mesmo, mas tamb\u00e9m como uma din\u00e2mica transformativa e viva da linguagem.<\/em>\u201d<\/span><\/p>\n<\/blockquote>\n As rachaduras cont\u00eam dois centros de atra\u00e7\u00e3o que podem se alinhar aos olhos da pessoa que v\u00ea. Os centros de ambos os desenhos de cobre s\u00e3o iluminados por l\u00e2mpadas LED, onde tamb\u00e9m est\u00e3o as frases “n\u00e3o veja bem”e “tenha vis\u00f5es”.<\/p><\/div>\n <\/p>\n \u00c0 direita, sinaliza\u00e7\u00f5es luminosas de acr\u00edlico e adesivo vinil autocolante. \u00c0 esquerda, visitante de exposi\u00e7\u00e3o escutando transmiss\u00e3o na faixa 88.8 FM em um aparelho de r\u00e1dio dom\u00e9stico. 2019.<\/p><\/div>\n Outra inven\u00e7\u00e3o foi os circuitos el\u00e9tricos impressos em <\/span>Ok\/Cancel<\/span><\/i> (2020), um projeto de uma placa de circuito impresso manufaturada que desempenha a fun\u00e7\u00e3o de bloquear sinais de telefones celulares nas faixas de transmiss\u00e3o 2g, 3g e 4g, em um per\u00edmetro dom\u00e9stico de 5 metros. Acompanha o circuito (fotos abaixo) tamb\u00e9m um <\/span>v\u00eddeo-tutorial<\/span><\/a> que apresenta as etapas de montagem manual do circuito na atribui\u00e7\u00e3o de c\u00f3digo aberto e autonomia tecnol\u00f3gica. Como ele explica no <\/span>texto sobre o trabalho<\/span><\/a>, \u201cenvolvido pelas emiss\u00f5es invis\u00edveis que atravessam ambientes privados e p\u00fablicos, esse trabalho \u00e9 entendido como um convite a ser, ao mesmo tempo, c\u00famplice e rival das ondas informacionais\u201d.\u00a0<\/span><\/p>\n Elias segue muito ativo nesse pand\u00eamico 2021 desenvolvendo outras \u201csa\u00eddas\u201d, art\u00edsticas e de vida, a partir de ideias que valem a pena colocar sua energia vital mesmo sendo contradit\u00f3rias e n\u00e3o completamente \u201credondas\u201d – porque essas s\u00e3o facilmente capturadas e vendidas como mercadoria de (re) uso <\/span>ad infinitum<\/span><\/i>, ao estilo \u201c \u00e9 mais f\u00e1cil imaginar o fim do mundo do que o fim do capitalismo?\u201d do Realismo Capitalista de Mark Fischer. Algum de seus pr\u00f3ximos trabalhos estar\u00e3o no <\/span>KinoBeat Festival<\/span><\/a>, em novembro de 2021, e na <\/span>Bienal do Mercosul<\/span><\/a>, em 2022. Podemos adiantar: a tecnologia segue forte em sua obra, se n\u00e3o como tema, como pot\u00eancia de linguagem, agora tamb\u00e9m em di\u00e1logo provocativo com a natureza.\u00a0<\/span><\/p>\n A d\u00e9cima BaixaCharla ao vivo, s\u00e9tima de 2021, Quinta-feira, 21\/10, 19h<\/strong> (hor\u00e1rio no Brasil), no canal do Youtube do BaixaCultura<\/a>, onde depois fica dispon\u00edvel \u2013 e em algumas semanas vira podcast para ouvir no site e nas plataformas de streaming.\u00a0<\/span><\/p>\n Assista (ou escute como podcast) aqui abaixo:<\/p>\n\n
\n
<\/p>\n
ser\u00e1<\/del> foi uma conversa entre Leonardo Foletto e Elias a partir de suas obras (as citadas aqui e outras), da busca por autonomia, das sa\u00eddas encontradas e a encontrar, dos atravessamentos poss\u00edveis entre arte, tecnologia e pol\u00edtica, do realismo capitalista, da pot\u00eancia vicejante do r\u00e1dio e outros temas correlatos. Seguimos na linha que propomos neste 2\u00ba semestre de 2021: debru\u00e7ar no trabalho de alguns artistas que est\u00e3o diretamente pensando as causas, consequ\u00eancias, sa\u00eddas, desvios, para a encruzilhada que nos encontramos hoje. Se o esp\u00edrito do tempo (ou zeitgeist) ainda \u00e9 o de ressaca da internet (e do neoliberalismo como um todo), o desafio agora \u00e9 pensar em sa\u00eddas para nos manter vivos e ativos ap\u00f3s <\/span>isso tudo<\/span><\/i>, qui\u00e7\u00e1 tamb\u00e9m tirando beleza e pot\u00eancia da destrui\u00e7\u00e3o, de forma a criar territ\u00f3rios a partir dos quais tamb\u00e9m se possa politizar e capitalizar a raiva para declarar e levar a luta adiante.<\/span><\/p>\n