{"id":13380,"date":"2021-01-29T17:25:24","date_gmt":"2021-01-29T17:25:24","guid":{"rendered":"https:\/\/baixacultura.org\/?p=13380"},"modified":"2021-01-29T17:25:24","modified_gmt":"2021-01-29T17:25:24","slug":"baixacharla-ao-vivo-5-gramofone-filme-typewriter-kittler","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/baixacultura.org\/2021\/01\/29\/baixacharla-ao-vivo-5-gramofone-filme-typewriter-kittler\/","title":{"rendered":"BaixaCharla ao vivo #5: Gramofone, Filme, Typewriter, Kittler"},"content":{"rendered":"
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Estamos de volta com as \u201cBaixaCharlas\u201d, nossas conversas sobre tecnologia, cultura livre e contracultura digital ao vivo. Depois da primeira temporada gravada<\/a> em 2017\/18, da segunda (ao vivo) em 2019, pulamos um ano para, neste 2021, retomar com uma discuss\u00e3o mensal sobre tecnologia, cultura e pol\u00edtica, sempre a partir de um livro (ou tema) e com convidadxs.<\/p>\n A quinta BaixaCharla ao vivo, primeira do ano, vai falar sobre \u201cGramofone, Filme, Typewriter<\/strong>\u201d, obra seminal do te\u00f3rico das m\u00eddias alem\u00e3o Friedrich A. Kittler. Publicada originalmente em alem\u00e3o em 1986, ganhou sua primeira tradu\u00e7\u00e3o para o Brasil em 2019, por Daniel Martineschen e Guilherme Gontijo Flores, em co-edi\u00e7\u00e3o da Editora UFMG e da Ed. Uerj<\/a>. Tornou-se um marco na obra do autor; ningu\u00e9m tra\u00e7ou o impacto discursivo e ontol\u00f3gico das m\u00eddias anal\u00f3gicas em maior profundidade que ele, segundo Geoffrey Winthrop-Young, professor da University of British Columbia, na contracapa do livro, e \u201c em nenhuma parte ele apresenta um relato mais acess\u00edvel e convincente do que em \u201cGramofone, filme e typewriter\u201d<\/i> gra\u00e7as \u00e0 combina\u00e7\u00e3o inaudita entre reflex\u00e3o te\u00f3rica e expertise tecnol\u00f3gica, a singular mistura de an\u00e1lise do discurso francesa (Lacan e Foucault), teoria da m\u00eddia canadense (McLuhan) e filosofia alem\u00e3 da t\u00e9cnica (Heidegger)\u201d.<\/p>\n Acess\u00edvel n\u00e3o \u00e9 bem algo que d\u00e1 para falar da obra de Kittler. Sua reflex\u00e3o sobre a t\u00e9cnica em diversos momentos entra em digress\u00f5es que misturam \u00e1reas diversas do conhecimento e impressionam pelo estilo narrativo, como se ele entrasse num fluxo de consci\u00eancia tal qual um personagem de William Faulkner (ou de James Joyce) e recheasse o fluxo com liga\u00e7\u00f5es n\u00e3o convencionais de ideias que pulam de f\u00edsica ac\u00fastica \u00e0 Nietzsche e Pink Floyd em quest\u00e3o de poucas linhas, \u00e0s vezes na mesma frase. N\u00e3o primam pela facilidade, mas convence enquanto teoria – e torna a leitura prazerosa como poucos obras \u201cte\u00f3ricas\u201d na \u00e1rea da filosofia, comunica\u00e7\u00e3o, tecnologia, hist\u00f3ria, com frases como: \u201cDe maneira muito mais precisa do que a imagina\u00e7\u00e3o po\u00e9tica, cujo alfabetismo ou criatividade j\u00e1 se opunha, em 1800, a uma mem\u00f3ria meramente reprodutiva, a tecnologia faz com que o inaudito se torne poss\u00edvel, no sentido estrito da palavra\u201d. Depois desse trecho, num dos momentos mais interessantes do longo livro (412p. na edi\u00e7\u00e3o brasileira), \u00e9 mostrada a letra de \u201cFat Old Sun<\/a>\u201d, do Pink Floyd, e Kittler segue sua reflex\u00e3o sobre a magia e a f\u00edsica da reprodu\u00e7\u00e3o el\u00e9trica de sons come\u00e7ada pelo primeiro aparelho de reprodu\u00e7\u00e3o desse tipo a ser popularizado – o gramofone de Thomas Edison, no final do s\u00e9culo XIX.<\/p>\n \u00a0\u201cO inaudito, no sentido estrito da palavra, \u00e9 o ponto em que a tecnologia da informa\u00e7\u00e3o e a fisiologia do c\u00e9rebro coincidem. N\u00e3o fazer barulho algum, erguer os p\u00e9s do ch\u00e3o e, quando a noite cai, ouvir o som de uma voz – todos fazemos isso: ao colocarmos para tocar o disco que comanda tal magia. E o que vem depois \u00e9 verdadeiramente um ru\u00eddo prateado, estranho ou inaudito. Pois ningu\u00e9m sabe quem est\u00e1 cantando – a voz chamada Gilmour que entoa a can\u00e7\u00e3o, ou a voz da qual parte o discurso, ou enfim a voz do pr\u00f3prio ouvinte, que n\u00e3o faz nenhum som e mesmo assim tem que cantar t\u00e3o logo estejam cumpridas todas as condi\u00e7\u00f5es da magia\u201d. <\/p>\n Kittler. Fonte: Neue Z\u00fcrcher Zeitung (The New Zurich TImes)<\/p><\/div>\n Mas afinal, quem \u00e9 esse sujeito que narra a hist\u00f3ria da t\u00e9cnica com datas, fatos, teorias, figuras hist\u00f3ricas e objetos t\u00e9cnicos como se fosse um escritor de fic\u00e7\u00e3o a manejar vozes de personagens em um romance? Nascido no final da Segunda Guerra Mundial e falecido em 2011, Friedrich Kittler<\/a> come\u00e7ou sua carreira como cr\u00edtico liter\u00e1rio, passando pelo estudo das m\u00eddias anal\u00f3gicas, depois para a g\u00eanese do computador e, por fim voltou \u00e0 Gr\u00e9cia Arcaica para investigar a rela\u00e7\u00e3o entre os deuses, o alfabeto e a matem\u00e1tica, numa esp\u00e9cie de g\u00eanese do ocidente sob perspectiva tecnol\u00f3gica. A literatura sempre esteve presente em seus estudos: fez a tese de doutorado (em filosofia) sobre um poeta alem\u00e3o, Conrad Ferdinand Meyer, foi primeiro professor de Literatura Moderna Alem\u00e3 e depois se encaminhou para os estudos de m\u00eddias e est\u00e9tica, em universidades alem\u00e3s e dos Estados Unidos. Ao lado de Hans Ulrich Gumbrecht, Siegfried Zielinski e Vil\u00e9m Flusser, foi um dos nomes mais proeminentes da Teoria Alem\u00e3 de M\u00eddia, uma perspectiva de pensamento \u201cpopularizada\u201d (porque nunca realmente popular<\/i>, como deve se imaginar) no meio acad\u00eamico a partir dos anos 1980 como \u201cArqueologia das M\u00eddias\u201d, um mergulho profundo nas m\u00eddias do passado para entender, em detalhes, o funcionamento das m\u00e1quinas (e da rela\u00e7\u00e3o entre homem, sociedade e m\u00e1quina) do presente.<\/p>\n “A pergunta b\u00e1sica da arqueologia da m\u00eddia poderia ser simplesmente: quais as condi\u00e7\u00f5es de exist\u00eancia dessa coisa, desse enunciado, desses discursos e das m\u00faltiplas pr\u00e1ticas midi\u00e1ticas com as quais vivemos? Tais quest\u00f5es s\u00e3o pol\u00edticas, est\u00e9ticas, econ\u00f4micas, tecnol\u00f3gicas, cient\u00edficas e al\u00e9m \u2013 e dever\u00edamos recusar tentativas de deixar de fora quaisquer desses aspectos”. (Jussi Parikka, What is Media Arqueology, p. 18, tradu\u00e7\u00e3o livre de Leonardo Lamha)<\/em><\/p>\n<\/blockquote>\n “Gramofone, Filme, Typewriter” <\/i>\u00e9 considerada seu trabalho mais conhecido, mas o leitor brasileiro disp\u00f5e tamb\u00e9m em portugu\u00eas de “M\u00eddias \u00d3ticas<\/a>” <\/i>e “A verdade do mundo tecnol\u00f3gico<\/a>“<\/i>, lan\u00e7ados pela editora Contraponto. Apesar da publica\u00e7\u00e3o recente desses livros, sua obra ainda \u00e9 (relativamente) pouco estudada no Brasil. Uma pista para isso decorre de sua interdisciplinaridade sui generis, mistura de literatura, hist\u00f3ria militar, computa\u00e7\u00e3o, matem\u00e1tica e teoria p\u00f3s-estruturalista, que n\u00e3o cai bem em formas de pensar separadas em \u201ccaixinhas\u201d que pouco se cruzam, modo predominante no status quo<\/i> da universidade brasileira. Outra \u00e9 que Kittler, ao contr\u00e1rio de outros pensadores mais populares, n\u00e3o fornece teorias prontas, mas desenha genealogias – em seu caso, genealogias do desenvolvimento de processamento, armazenamento e transmiss\u00e3o de informa\u00e7\u00e3o. H\u00e1 ainda uma terceira pista: o texto de Kittler pode ser complexo e chato demais para alguns.<\/p>\n As tr\u00eas palavras que d\u00e3o nome ao livro correspondem a \u201csistemas discursivos\u201d ou \u201csistemas de nota\u00e7\u00e3o\u201d, que \u00e9 como Kittler denomina os dispositivos tecnol\u00f3gicos e culturais que registram, processam e transmitem informa\u00e7\u00f5es conhecidas como \u201cm\u00eddias\u201d (ou meios) em portugu\u00eas. Cada palavra \u00e9 um ensaio sobre um desses aparatos, \u201csistemas\u201d, \u201cm\u00eddias\u201d, que quebram, pela primeira vez desde a inven\u00e7\u00e3o do alfabeto, o monop\u00f3lio da escrita. O gramofone, a pel\u00edcula\/c\u00e2mera de cinema e a m\u00e1quina de escrever fragmentam a informa\u00e7\u00e3o em incompat\u00edveis fluxos ac\u00fasticos, visuais e escritos e, pela primeira vez na hist\u00f3ria, fazem com que as pessoas (n\u00e3o) se reconhecem em m\u00eddias que registram a natureza e os corpos humanos.<\/p>\n Das palavras tamb\u00e9m vem uma particularidade do t\u00edtulo: Grammophon, Film, Typewriter, <\/i>t\u00edtulo original do livro em alem\u00e3o, j\u00e1 vinha grafado de forma h\u00edbrida: typewriter <\/i>estava em ingl\u00eas, e assim permanece em portugu\u00eas porque no contexto da obra n\u00e3o deve ser traduzida: se refere a uma dupla significa\u00e7\u00e3o (m\u00e1quina de escrever e datil\u00f3grafo\/a) e a uma dupla articula\u00e7\u00e3o das duas m\u00eddias: \u201cde um lado, o aparato tecnol\u00f3gico inventado para padronizar a escrita; de outro, a pessoa que faz uso profissional do aparelho\u201d, como escrevem Adalberto M\u00fcller e Erick Felinto no pref\u00e1cio brasileiro \u00e0 obra, professores da UERJ que foram tamb\u00e9m grandes incentivadores da publica\u00e7\u00e3o da obra no Brasil.<\/p>\n Para conversar sobre e a partir de Kittler, o convidado da BaixaCharla \u00e9 Leonardo Petersen Lamha<\/a>, doutorando em Literatura Comparada na Universidade Federal Fluminense (UFF). Ele recentemente escreveu a resenha \u201cRui\u0301do, noite e frio<\/a>\u201d, publicada na Internet & Sociedade, revista do InternetLab, da qual muitas informa\u00e7\u00f5es desse texto foram retiradas. Leonardo pesquisa rela\u00e7\u00f5es entre m\u00eddia, tecnologia e literatura a partir da teoria alem\u00e3 da m\u00eddia, em especial as obras de Friedrich Kittler e Franz Kafka.<\/p>\n A conversa vai ser realizada na pr\u00f3xima quinta-feira, 4\/2, \u00e0s 19h<\/strong>, entre Leonardo Lamha e Leonardo Foletto, editor do BaixaCultura, em nosso canal do Youtube. Depois ficar\u00e1 dispon\u00edvel no mesmo site.<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":" Estamos de volta com as \u201cBaixaCharlas\u201d, nossas conversas sobre tecnologia, cultura livre e contracultura digital ao vivo. 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