{"id":1217,"date":"2009-02-01T01:08:17","date_gmt":"2009-02-01T01:08:17","guid":{"rendered":"https:\/\/baixacultura.org\/?p=1217"},"modified":"2009-02-01T01:08:17","modified_gmt":"2009-02-01T01:08:17","slug":"notas-sobre-copyright-e-copyleft-ii","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/baixacultura.org\/2009\/02\/01\/notas-sobre-copyright-e-copyleft-ii\/","title":{"rendered":"Notas sobre copyright e copyleft (II)"},"content":{"rendered":"
<\/p>\n
A segunda parte do texto do coletivo Wu Ming<\/strong> que come\u00e7amos a publicar ontem discute as origens do copyright. Destaque para o detalhe: por raz\u00f5es pura e obviamente econ\u00f4micas [de poder econ\u00f4mico e interesse econ\u00f4mico], quando se trata de direitos autorais os mediadores da cultura [editores, neste caso] desde o \u00ednicio\u00a0foram privilegiados em detrimento dos produtores.<\/p>\n Em parte, isso nos leva\u00a0a pensar no desinteresse das classes criadoras pelo lado ‘chato’ da cria\u00e7\u00e3o: a pr\u00e1tica de preparar e apresentar uma obra a um p\u00fablico. N\u00e3o s\u00e3o raras as vezes em que por neglig\u00eancia ou desconhecimento um artista assina um contrato ruim, e nestas ocasi\u00f5es talvez lhe fizesse um bem maior ser menos g\u00eanio e mais oper\u00e1rio. Por outro lado,\u00a0a informa\u00e7\u00e3o\u00a0nos leva a pensar no que acontece com os intermedi\u00e1rios\u00a0agora que\u00a0a distin\u00e7\u00e3o entre quem faz e quem consome cultura se relativizou. Se muitos artistas dinossauros ainda se acomodam \u00e0s velhas regras nas quais, afinal de contas, eles fizeram verdadeiras fortunas, h\u00e1 verdadeiras hordas de novos criadores – que gravam suas m\u00fasicas em casa, editam livros do pr\u00f3prio bolso, organizam seus pr\u00f3prios festivais – que n\u00e3o est\u00e3o mais esperando por serem ‘descobertos’. Para eles, \u00e9 mais \u00fatil aprender a usar os recursos que a tecnologia lhes oferece.<\/p>\n Mas isso a gente conversa ap\u00f3s a leitura. Amanh\u00e3 tem mais!<\/p>\n [Reuben da Cunha Rocha.<\/strong>]<\/p>\n Notas in\u00e9ditas sobre copyright e copyleft<\/strong><\/p>\n Wu Ming<\/p>\n Tradu\u00e7\u00e3o: Reuben da Cunha Rocha<\/p>\n 2. Censura e o nascimento do copyright: contra o liberal “mito das origens”<\/strong><\/p>\n Agora, de volta ao in\u00edcio. Vamos listar os muito conhecidos e normalmente mencionados fatos. A hist\u00f3ria do copyright come\u00e7a na Inglaterra do s\u00e9culo 16. A difus\u00e3o da imprensa, a possibilidade de distribuir muitas c\u00f3pias do mesmo texto \u00e9 excitante para quem quer que tenha algo a dizer, especialmente algo pol\u00edtico. H\u00e1 uma explos\u00e3o de jornais e panfletos. A Coroa teme a difus\u00e3o de id\u00e9ias subversivas e passa a exercer controle sobre o que se imprime.<\/p>\n Em 1556 surge a Stationers’ Company [“Companhia dos Editores”], um grupo de profissionais que passa a deter com exclusividade o direito de copiar. A companhia possui o monop\u00f3lio das tecnologias de impress\u00e3o. Algu\u00e9m que queira imprimir algo passa necessariamente por ela. Diferente do que ocorria at\u00e9 ent\u00e3o, quando qualquer um podia imprimir para si c\u00f3pias de livros ou pe\u00e7as sem que os autores se importassem, j\u00e1 que eles n\u00e3o detinham os direitos (eles n\u00e3o existiam). Importante era que as obras circulassem e sua fama crescesse, j\u00e1 que assim os autores chamariam a aten\u00e7\u00e3o de poss\u00edveis protetores (mecenas, corpora\u00e7\u00f5es culturais etc.). A partir desse ponto s\u00f3 se imprimem obras que possuam autoriza\u00e7\u00e3o (na pr\u00e1tica, o selo do censor do estado) e que estejam listadas no registro oficial – note o detalhe! – em nome de um editor<\/em>. O editor se torna o dono da obra, com a coniv\u00eancia do estado.<\/p>\n A mitologia ‘liberal’ do copyright como um direito natural, nascido espontaneamente com o desenvolvimento e o dinamismo do mercado \u00e9…puro conto de fadas! As origens remotas do copyright se encontram na censura preventiva e na necessidade de restringir o acesso aos meios de produ\u00e7\u00e3o cultural (restringir, portanto, a circula\u00e7\u00e3o de id\u00e9ias). Um s\u00e9culo e meio depois e a Coroa sofre ataques nunca vistos: a rebeli\u00e3o escocesa de 1638<\/a>, a “Grande Representa\u00e7\u00e3o<\/a>” parlamentar de 1641, a deflagra\u00e7\u00e3o da Guerra Civil um ano depois, a revolu\u00e7\u00e3o de Cromwell e a decapita\u00e7\u00e3o do rei. No fim da d\u00e9cada de 1650 o pa\u00eds retorna \u00e0 monarquia, mas a situa\u00e7\u00e3o permanece inst\u00e1vel e finalmente o parlamento imp\u00f5e \u00e0 Coroa uma declara\u00e7\u00e3o de direitos. A partir disso a monarquia inglesa se torna constitucional.<\/p>\n \u00c9 preciso listar tais eventos para que se entenda como as coisas dentro da monarquia sofreram mudan\u00e7as ao longo de um s\u00e9culo e meio, e como isto afetou o que se pensava sobre a censura preventiva e os pr\u00f3prios editores. Um grande ressentimento passou a ser direcionado a este grupo, tanto que afinal se decidiu pelo fim do monop\u00f3lio de impress\u00e3o.<\/p>\n Os editores s\u00e3o atingidos onde mais d\u00f3i – o bolso – e reagem de acordo. Eles iniciam uma campanha para assegurar que a nova lei reconhe\u00e7a a legitimidade dos seus interesses e trabalhe em seu favor. Seu argumento \u00e9: o copyright pertence ao autor; o autor, no entanto, n\u00e3o possui m\u00e1quinas de impress\u00e3o; as m\u00e1quinas pertencem aos editores; assim o autor necessita do editor. Como regular essa necessidade? Simples: o autor, interessado em que a obra seja publicada, cede os direitos ao editor por um determinado per\u00edodo. Na raiz, a situa\u00e7\u00e3o permanece mais ou menos a mesma. S\u00f3 muda a justificativa legal. A justificativa ideol\u00f3gica n\u00e3o se baseia mais em censura, mas na necessidade do mercado. Todos os mitos que da\u00ed derivam acerca dos direitos do autor se baseiam no lobby dos editores: autores s\u00e3o for\u00e7ados a cederem seus direitos…mas isso \u00e9 pro seu pr\u00f3prio bem. As consequ\u00eancias psicol\u00f3gicas s\u00e3o devastadoras, uma varia\u00e7\u00e3o da ‘S\u00edndrome de Estocolmo’ <\/a>(quando o sequestrado se apaixona pelo sequestrador). De agora em diante, autores se mobilizar\u00e3o em defesa de um status quo<\/em> que consiste neles pr\u00f3prios esperarem ao p\u00e9 da mesa pelas migalhas e por um tapinha na cabe\u00e7a. P\u00e1, p\u00e1! Au!<\/p>\n A lei \u00e9 o famoso Estatuto de Anne<\/a>, que passa a ter efeito a partir de 1710. Ela antecede todas as leis e acordos internacionais sobre copyright, desde a Conven\u00e7\u00e3o de Berna <\/a>em 1971 at\u00e9 o Digital Millennium Copyright Act <\/a>e o Decreto Urbani<\/a>. \u00c9 a primeira defini\u00e7\u00e3o legal de copyright tal qual ainda o conhecemos hoje, ou o conhec\u00edamos ontem. Porque hoje mesmo algumas pessoas come\u00e7aram a ter d\u00favidas. D\u00favidas que nascem do fato de que copiar algo est\u00e1 ao alcance de muito mais pessoas agora, talvez de todos. Um bom punhado de n\u00f3s tem em casa aquela tecnologia que os editores um dia monopolizaram. Para copiar uma obra n\u00e3o \u00e9 mais necess\u00e1rio dirigir-se a uma companhia profissional. O esp\u00f3lio dos editores tem sido minado pela revolu\u00e7\u00e3o micro-eletr\u00f4nica iniciada nos anos 70 com o advento da tecnologia digital, a ‘democratiza\u00e7\u00e3o’ do acesso \u00e0 computa\u00e7\u00e3o. Primeiro a fotoc\u00f3pia e a fita K7, depois o VHS e o sampler, ent\u00e3o a gravadora de CD e o P2P, e finalmente os dispositivos de mem\u00f3ria port\u00e1teis como o iPod…como algu\u00e9m pode acreditar que a justificativa ideol\u00f3gica do copyright – aquela que inspirou o Estatuto de Anne – ainda \u00e9 v\u00e1lida?<\/p>\n Est\u00e1 claro que as coisas precisam ser revistas; este processo mudou todo o modo de produ\u00e7\u00e3o da ind\u00fastria cultural! Novas defini\u00e7\u00f5es dos direitos de quem cria, produz e distribui s\u00e3o necess\u00e1rias. Se uma ‘obra intelectual’ pode chegar ao p\u00fablico sem a media\u00e7\u00e3o de um editor, de uma gravadora, da televis\u00e3o ou de um produtor, ent\u00e3o estas pessoas precisam se perguntar o que fazer agora, chegar a uma solu\u00e7\u00e3o, redefinir o papel social do seu trabalho. Lutar para manter um monop\u00f3lio que n\u00e3o se sustenta mais com amea\u00e7as de pris\u00e3o acaba levando a um beco sem sa\u00edda. \u00c9 como se comporta o Antigo Regime, \u00e9 a autocracia czarista. Felizmente, algumas pessoas come\u00e7aram a perceber isso.<\/p>\n<\/blockquote>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":" A segunda parte do texto do coletivo Wu Ming que come\u00e7amos a publicar ontem discute as origens do copyright. 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