{"id":10167,"date":"2015-04-23T19:28:05","date_gmt":"2015-04-23T19:28:05","guid":{"rendered":"https:\/\/baixacultura.org\/?p=10167"},"modified":"2015-04-23T19:28:05","modified_gmt":"2015-04-23T19:28:05","slug":"reparar-em-vez-de-descartar","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/baixacultura.org\/2015\/04\/23\/reparar-em-vez-de-descartar\/","title":{"rendered":"Reparar em vez de descartar"},"content":{"rendered":"

\"cafe<\/a><\/p>\n

Perguntas\u00a0r\u00e1pidas: voc\u00ea sabe trocar a resist\u00eancia do chuveiro? consertar o abajur do lado da cama, quando ele abruptamente parou de funcionar? n\u00e3o se desespera quando seu computador n\u00e3o liga na 2\u00ba tentativa? Se sim, saiba que voc\u00ea tem tudo para ser um\u00a0reparador, uma exce\u00e7\u00e3o nesse mundo que joga grandes quantidades de material fora, mesmo as coisas com quase nada de errado e que poderia obter um novo sopro de vida depois de um simples reparo.<\/p>\n

N\u00e3o \u00e9 novidade nenhuma: vivemos numa cultura em que comprar um novo \u00e9 muito mais f\u00e1cil do que consertar o “velho”. Cito dois casos extremos: 1) as pernas (alum\u00ednio) de sua cadeira de praia estragaram, voc\u00ea quer levar a algum lugar que conserte. \u00c9 muito prov\u00e1vel, como j\u00e1 aconteceu por aqui, que voc\u00ea ganhe como resposta de qualquer lugar que procurar: “mas n\u00e3o vale a pena, compre outra que sai mais em conta”. \u00a0Mas e se eu quero que ela volte a funcionar, independente de “sair em conta” ou n\u00e3o?<\/p>\n

Outro caso, na extremidade oposta: estragou uma pe\u00e7a no seu Iphone (o que, voc\u00ea usa Iphone?? :P). Se voc\u00ea for numa loja “autorizada”, qualquer pe\u00e7a que estraga costuma custar uma boa grana, s\u00f3 n\u00e3o o suficiente para voc\u00ea trocar seu telefone porque todos produtos Apple s\u00e3o exageradamente caros. As op\u00e7\u00f5es baratas se restringem ao mercado “negro”, em que os chineses s\u00e3o mestres. Talvez por isso mesmo \u00e9 que o site IFixit<\/a>, que traz uma grande variedade\u00a0de manuais de reparo abertos e gratuitos, tem centenas de manuais dos produtos Apple. \u00c9 como uma rebeli\u00e3o dos consumidores: “ah \u00e9, Apple, voc\u00ea vai incomodar tanto assim pra abrir ou reparar por conta pr\u00f3pria um produto seu? Ent\u00e3o n\u00f3s vamos mostrar que sim, podemos fazer isso de modo colaborativo, sem voc\u00eas”.<\/p>\n

No domingo 12\/4<\/a>, participamos de um evento que visa forlatecer essa cultura dos reparadores: o\u00a0Caf\u00e9 Reparo<\/a>, projeto\u00a0relacionado ao \u00d4nibus Hacker<\/a> e contemplado pelo edital Redes e Ruas<\/a> (PMSP) da secretaria de cultura de SP. Ele prev\u00ea seis encontros voltados \u00e0 cultura hacker que prop\u00f5em laborat\u00f3rios de pequenos reparos, discuss\u00f5es e proposi\u00e7\u00f5es nos segundos domingos de cada m\u00eas no Centro Cultural S\u00e3o Paulo entre mar\u00e7o e agosto de 2015. Estivemos\u00a0do 2\u00ba encontro, buscando relacionar a ideia da cultura livre e do copyleft com a quest\u00e3o do reparo em vez do descarte. Ou voc\u00ea n\u00e3o acha que a cultura livre, ao expor o c\u00f3digo-fonte da produ\u00e7\u00e3o, n\u00e3o potencializa a autonomia tamb\u00e9m<\/em> no reparo\/manuten\u00e7\u00e3o dos objetos produzidos?<\/p>\n

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Caf\u00e9 Reparo na Holanda<\/p><\/div>\n

O projeto foi abertamente inspirado por um movimento global chamado Repair Caf\u00e9,<\/a>\u00a0um conceito de caf\u00e9 em que as pessoas de uma vizinhan\u00e7a se re\u00fanem para consertar objetos quebrados em vez de jog\u00e1-los fora e comprar novos. O primeiro foi criado em Amsterd\u00e3, na Holanda, por Martine Postma<\/a>. A ideia do caf\u00e9 \u00e9 simples: num determinado dia da semana, volunt\u00e1rios se re\u00fanem para consertar itens que v\u00e3o de brinquedos quebrados e roupas descosturadas a secadores de cabelo que n\u00e3o funcionam mais. Todos os reparos s\u00e3o feitos gratuitamente, como em uma troca de aprendizado entre os moradores de determinada regi\u00e3o. Hoje s\u00e3o mais de 300 caf\u00e9s desse jeito espalhados por 10 pa\u00edses – um deles no Brasil, em Santos,\u00a0que acontece atrav\u00e9s da ANDES<\/a>\u00a0(Ag\u00eancia Nacional de Desenvolvimento Eco-Social).<\/p>\n

O\u00a0Repair Caf\u00e9 n\u00e3o fala em competir com as assist\u00eancias t\u00e9cnicas e as pessoas que fazem disso seu modo de ganhar a vida. Muito pelo contr\u00e1rio: a inten\u00e7\u00e3o \u00e9 chamar\u00a0a aten\u00e7\u00e3o para a possibilidade de cada um poder fazer o reparo de suas pr\u00f3prias coisas. De que voc\u00ea n\u00e3o tem que jogar fora tudo que “n\u00e3o funciona”: existem alternativas de conserto. Mas \u00e9 claro que nem sempre vai se conseguir resolver o problema do objeto em quest\u00e3o, e quando isso acontece \u00e9 que entram os (cada vez menos) t\u00e9cnicos dispon\u00edveis.<\/p>\n

No Caf\u00e9 Reparo de SP, a estrutura montada no evento conta com dois monitores – um mais de hardware, outro mais de software<\/em> – mais tr\u00eas integrantes\/produtores do projeto, que ficam durante o dia, das 10 \u00e0s 18h, para ajudar voc\u00ea mesmo a reparar o seu objeto. Que fique bem claro: eles n\u00e3o v\u00e3o fazer o servi\u00e7o sozinho, voc\u00ea vai fazer junto com eles. Do It Together<\/a>. No domingo em que participamo<\/a>s, um abajur, uma torradeira e uma cafeteira foram reparados; um videocassete teve seu problema detectado, o que em muitos casos \u00e9 a maior parte do problema. Veja aqui abaixo algumas fotos desse dia, por Milena Migrans.<\/p>\n

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H\u00e1 diversos motivos para justificar a cada vez mais necessidade de repararmos aquilo que usamos. Muitos deles foram bem descritos neste manifesto abaixo, desenvolvido pelo site Ifixit a partir de um texto publicado por Mister Jalopy em seu site<\/a>\u00a0– que, por sua vez, foi publicado inicialmente na Make Magazine n\u00ba4<\/a>. Traduzimos apenas o in\u00edcio, a tradu\u00e7\u00e3o completa faremos em conjunto com o pessoal do Caf\u00e9 Reparo SP – se algu\u00e9m quiser ajudar a por isso numa arte, bota o dedo aqui (nos coment\u00e1rios desse post).<\/p>\n

1. Reparar \u00e9 melhor que reciclar<\/strong>
\nFazer nossas coisas durarem mais tempo \u00e9 mais eficiente e barato do que buscar\/extrair mat\u00e9rias-primas de baixo custo<\/p>\n

2. Reparar poupa seu dinheiro<\/strong>
\nConsertar coisas muitas vezes \u00e9 gr\u00e1tis e geralmente mais barato do que a substitui\u00e7\u00e3o delas. Quando voc\u00ea mesmo conserta voc\u00ea\u00a0economiza\u00a0dinheiro.<\/p>\n

3. Reparar ensina engenharia<\/strong>
\nA melhor maneira de saber como algo funciona \u00e9 desmont\u00e1-lo.<\/p>\n

4. Reparar salva o planeta<\/strong>
\nA Terra tem recursos limitados. Eventualmente, vai acabar.\u00a0A melhor maneira de ser eficiente \u00e9 reutilizar o que j\u00e1 temos.<\/p>\n

\"repair<\/a><\/p>\n

A ideia dos caf\u00e9s reparos \u00e9, no fundo, mais uma das iniciativas globais que visam fortalecer a autonomia das pessoas. Que visa abrir as “caixas-pretas” que est\u00e3o por tr\u00e1s de qualquer objeto t\u00e9cnico e mostrar como eles funcionam. Como este texto da revista Wired<\/a> aponta, talvez mais do que um movimento de “fazedores”, se faz necess\u00e1rio um movimento de “reparadores”, que deem novos (ou mantenham os velhos) usos a centena de milhares de objetos que s\u00e3o desperdi\u00e7ados por a\u00ed. Quantas empresas no s\u00e9culo XX tem promovido objetos feitos para quebrar em menos tempo do que de fato a capacidade deles poderia aguentar? o ato de reparar \u00e9 tamb\u00e9m um ato de resist\u00eancia contra a obsolesc\u00eancia programada, essa maldi\u00e7\u00e3o tecnol\u00f3gico do s\u00e9culo XXI.<\/p>\n

*
\nSe ficou interessado em saber mais do que rolou na conversa que fizemos no s\u00e1bado, o pessoal do dispositivo – um projeto art\u00edstico-tecnol\u00f3gico-arquitet\u00f4nico que
vale muito a pena conhecer<\/a> – fez uma grava\u00e7\u00e3o experimental da conversa, disponibilizada aqui abaixo.\u00a0Como de praxe, versamos caoticamente sobre diversos temas relacionados a cultura livre, do nascimento do direito autoral aos movimentos de vanguarda do s\u00e9culo XX, anticopyright por excel\u00eancia, passando at\u00e9 por temas atuais e correlatos (?) como o Uber<\/a> e o AirBnb<\/a>. Fizemos\u00a0uma apresenta\u00e7\u00e3o, chamada\u00a0cultura livre e copyleft<\/a>, uma esp\u00e9cie de guia dos temas a serem falados, baseados em outras oficinas que demos de cultura livre e copyleft por a\u00ed.<\/p>\n

\u00a0Cr\u00e9ditos fotos: Milena Migrans<\/a> (Caf\u00e9 Reparo SP), Hypeness<\/a> (Caf\u00e9 Reparo da Holanda)<\/address>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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