{"id":10058,"date":"2015-01-08T20:44:16","date_gmt":"2015-01-08T20:44:16","guid":{"rendered":"https:\/\/baixacultura.org\/?p=10058"},"modified":"2015-01-08T20:44:16","modified_gmt":"2015-01-08T20:44:16","slug":"turismo-industrial-e-o-consumo-de-lugares-exoticos","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/baixacultura.org\/2015\/01\/08\/turismo-industrial-e-o-consumo-de-lugares-exoticos\/","title":{"rendered":"Turismo industrial e o consumo de lugares ex\u00f3ticos"},"content":{"rendered":"

\"turismo<\/a><\/p>\n

Uma das publica\u00e7\u00f5es interessantes que tivemos acesso no nosso breve tour espanhol em novembro de 2014 foi o MALPA\u00cdS<\/a>, um auto-intitulado “fanzine de cr\u00edtica lugare\u00f1a<\/em>“. \u00c9 produzido por um coletivo que faz a cr\u00edtica do lugar desde o lugar; “al fin e al cabo, habitamos en lugares que, aqu\u00ed y ahora<\/em>, hemos de pensar y defender”, se l\u00ea j\u00e1 no in\u00edcio do “Serm\u00f3n de presentaci\u00f3n”.<\/p>\n

A publica\u00e7\u00e3o, muito bem produzida graficamente, traz textos com a perspectiva de discutir as quest\u00f5es relativas ao lugar, em especial o espanhol, com textos que abordam desde a gentrifica\u00e7\u00e3o do bairro de Lavapi\u00e9s, regi\u00e3o central de Madrid, a morte da rua como espa\u00e7o cultural em algumas regi\u00f5es espanholas, passando por relatos de defesas do espa\u00e7o urbano comunit\u00e1rio contra aqueles que querem tornar a rua um Shopping Center “limpo”, “bonito” e consumista.<\/p>\n

Um dos textos mais interessantes do zine \u00e9 o que d\u00e1 t\u00edtulo a esse post: Turismo Industrial y consumo de lugares ex\u00f3ticos<\/strong>. Ali se apresenta uma breve introdu\u00e7\u00e3o de como a ideia do consumo de lugares ex\u00f3ticos foi sendo constru\u00edda como uma “sa\u00edda” para aqueles presos numa rotina puxada de trabalho 8-18h. Uma “sa\u00edda” entre aspas mesmo porque n\u00e3o \u00e9 bem assim<\/em>; o turismo se mostra como a “liberdade dos empregados de levar capital de um mercado a outro; a poliniza\u00e7\u00e3o do dinheiro”, como est\u00e1 no poem\u00e1rio Ma\u00f1ana sin amo<\/em>, de Juako Escaso<\/a>, que abre o texto.<\/p>\n

O primeiro par\u00e1grafo explica ainda melhor:<\/p>\n

\n

“Viajar se ha convertido en esa mezcla bastarda de necesidad, derecho y premio que nos promete “cargar las pilas” y “desconectar” de la sofocante cotidianidad. Detr\u00e1s de los anuncios de viajes asoma siempre la idea de que nuestro d\u00eda a d\u00eda es algo que bien merece una “escapada”, en una muestra de que el capitalismo es capaz incluso de rentabilizar la consciencia de que el mundo que ha creado es dificilmente suportable<\/strong>. Basta con ser ciudadanos documentados y trabajadores para ocupar una plaza en alguna de las lanzaderas del transporte moderno y aterrizar de forma r\u00e1pida y confortable en cualquier oasis lejos de donde vivimos y trabajamos. All\u00ed correr\u00e1 el aire. Podremos, por f\u00edn, degustar cierta liberdad individual y disfrutar de um sinf\u00edn de comodidades y cosas bonitas. Un afuera en el cual alimentar nuestro espirito y gozar de experiencias intensas, olvidando inocentemente nuestras obligaciones. Con la sola condici\u00f3n, eso s\u00ed, de que el al cierre de este higi\u00e9nico par\u00e9ntesis volvamos m\u00e1s frescos a la tensi\u00f3n del trabajo, a las responsabilidades de la m\u00e1quina de la que formemos parte”.<\/p>\n<\/blockquote>\n

*<\/p>\n

\"turismo<\/a><\/p>\n

A cr\u00edtica aqui se d\u00e1 em rela\u00e7\u00e3o ao turismo de massas, em especial aquele que vende o ex\u00f3tico como o mais atrativo. Aquele tipo de turismo que, por exemplo, leva hordas de pessoas para conhecer\u00a0 o sarc\u00f3fago rec\u00e9m descoberto na beira do Rio Nilo no Egito. Praquela praia tranquila de natureza “intocada” no meio do Caribe, ou pra uma cidade litor\u00e2nea com muita festa, cerveja e \u00e1guas calmas. Lugares cujos habitantes jamais poder\u00e3o devolver a visita aos turistas, a n\u00e3o ser que fa\u00e7am isso como for\u00e7a de trabalho imigrante.<\/p>\n

Uma consequ\u00eancia da venda dos lugares ex\u00f3ticos em grande escala \u00e9 aquela sensa\u00e7\u00e3o de n\u00e3o ser estranho saber tudo sobre os povos ex\u00f3ticos da Mal\u00e1sia mas nada sobre o seu pr\u00f3prio bairro. De conhecer toda a Europa, das paradis\u00edacas Ilhas Gregas ao frio da Lap\u00f4nia, sem nunca ter caminhado pelo sua pr\u00f3pria vizinhan\u00e7a. Ou andar de metr\u00f4 em Paris e achar lindo, mas protestar contra a constru\u00e7\u00e3o de uma nova esta\u00e7\u00e3o em seu pr\u00f3prio bairro porque vai trazer “gente diferenciada<\/a>“, para ficar no caso j\u00e1 folcl\u00f3rico dos habitantes de Higien\u00f3polis, em S\u00e3o Paulo.<\/p>\n

Uma explica\u00e7\u00e3o para os excessos do turismo industrial e dos lugares ex\u00f3ticos que ele vende \u00e9 a tal busca “para encontrar consigo mesmo”. Gente perdida buscando algo que esteja vivo. Como diz no texto,<\/p>\n

\n

La industria del turismo est\u00e1 siempre disponible para ayudar a sus clientes a buscar o construir su propia identidad, o incluso a sentirse m\u00e1s humanos. Se dir\u00eda que salir de ese hostal y observar a gentes que de alguna forma tratan de conservar su cultura y modo de vida, ayuda al turista en esa \u201cb\u00fasqueda parasitaria de las cosas perdidas”.<\/p>\n<\/blockquote>\n

O que seriam estas coisas perdidas? O texto defende que, em especial na venda de lugares ex\u00f3ticos, seriam coisas “simples”, guiadas por uma nostalgia ancestral de uma vida sem tantas preocupa\u00e7\u00f5es, em contato com a natureza e com uma cultura diferente (“de raiz”) que ainda n\u00e3o foi destru\u00edda pela homogeneiza\u00e7\u00e3o ocidental e pelo triunfo da mercadoria. Uma praia deserta que s\u00f3 habitam pescadores artesanais, uma comunidade de agricultores no meio das montanhas do Nepal. Mais uma vez, o paradoxo: o turismo industrial e o com\u00e9rcio massivo de lugares ex\u00f3ticos vende como “para\u00edso” justamente aquele lugar que supostamente estaria “fora” do sistema capitalista que o gerou. Como se o “sistema” dissesse voc\u00ea merece uma escapada dessa vida exaustiva, v\u00e1 descansar num para\u00edso livre dos meus problemas – mas venha comigo que te mostro o melhor hotel, com o mais informado guia nativo, e ainda te dou um desconto e parcelo em 10x no cart\u00e3o”. <\/em><\/p>\n

***<\/p>\n

\"turismo<\/a><\/p>\n

Vindo de um zine que faz a cr\u00edtica do lugar desde o lugar, \u00e9 natural que o aspecto de fortalecer a vida comunit\u00e1ria em seu pr\u00f3prio bairro ganhe for\u00e7a, em especial quando colocada em oposi\u00e7\u00e3o aos lugares vendidos como ex\u00f3ticos. Um dos adesivos que vem encartado no Malpa\u00eds refor\u00e7a essa tomada de lado na discuss\u00e3o: “Apoya las mercear\u00edas de tu barrio<\/strong>“, escrito ao lado de dois bonecos encapuzados s\u00f3 com os olhos de fora.<\/p>\n

A cr\u00edtica central do texto se d\u00e1 n\u00e3o na dicotomia “turistas X viajantes”, que \u00e9 considerado uma “armadilha” improdutiva. Se d\u00e1, sim, numa defesa da ideia de viagem sem os excessos do turismo industrial, que mercantiliza uma experi\u00eancia e a transforma em um “trof\u00e9u”, um produto para o turista depois exibir em sua casa ou rede social para os amigos atrav\u00e9s de fotos (quase) infinitas – mesmo que para isso tenha de refor\u00e7ar estere\u00f3tipos, for\u00e7ar experi\u00eancias, padronizar os lugares e criar monop\u00f3lios econ\u00f4micos de explora\u00e7\u00e3o destes.<\/p>\n

Como \u00e9 apontado no final do texto, o turismo industrial de lugares ex\u00f3ticos tem sido um dos \u00faltimos movimentos de conquista e consumo do outro<\/em> por parte do sistema. Com o objetivo de fazer dinheiro, esta ind\u00fastria produz espa\u00e7os, significados e experi\u00eancias a ponto de faz\u00ea-los perderem personalidade e singularidade, quando n\u00e3o desaparecerem. Desta forma, passam a ser substitu\u00eddos por qualquer outro, como um produto qualquer, tudo o que um lugar est\u00e1 longe de ser. Caberia perguntar se em alguns anos haver\u00e1 lugares suficientes para o turismo mercantilizar.<\/p>\n

[D\u00e1 pra ver e baixar o fanzine em PDF na nossa Biblioteca<\/a>. Se voc\u00ea tiver na Espanha, procure comprar a vers\u00e3o impressa nestes lugares.<\/a>]
\n<\/em><\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

Uma das publica\u00e7\u00f5es interessantes que tivemos acesso no nosso breve tour espanhol em novembro de 2014 foi o MALPA\u00cdS, um auto-intitulado “fanzine de cr\u00edtica lugare\u00f1a“. \u00c9 produzido por um coletivo que faz a cr\u00edtica do lugar desde o lugar; “al fin e al cabo, habitamos en lugares que, aqu\u00ed y ahora, hemos de pensar y […]<\/p>\n","protected":false},"author":2,"featured_media":10070,"comment_status":"open","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":[],"categories":[488,126],"tags":[147,133,137,1860,1861,1862],"post_folder":[],"jetpack_featured_media_url":"","_links":{"self":[{"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/10058"}],"collection":[{"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/users\/2"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=10058"}],"version-history":[{"count":0,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/10058\/revisions"}],"wp:featuredmedia":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=10058"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=10058"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=10058"},{"taxonomy":"post_folder","embeddable":true,"href":"https:\/\/baixacultura.org\/wp-json\/wp\/v2\/post_folder?post=10058"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}