manifestos – BaixaCultura https://baixacultura.org Cultura livre & (contra) cultura digital Fri, 22 Oct 2021 13:58:25 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.0.9 https://baixacultura.org/wp-content/uploads/2022/09/cropped-adesivo1-32x32.jpeg manifestos – BaixaCultura https://baixacultura.org 32 32 Manifestos Cypherpunks para venda e download https://baixacultura.org/2021/10/22/manifestos-cypherpunks-para-venda-e-download/ https://baixacultura.org/2021/10/22/manifestos-cypherpunks-para-venda-e-download/#respond Fri, 22 Oct 2021 13:58:25 +0000 https://baixacultura.org/?p=13790

Enviamos os 500 (!) exemplares do Manifestos Cypherpunks para quem apoiou a campanha de financiamento coletivo no Catarse, que chegou a 732% do valor inicial pedido, com o apoio de 247 pessoas e coletivos.  Junto com eles estão indo também o “A Ideologia Californiana“, primeiro da coleção Tecnopolítica (Manifestos é o segundo e o terceiro vem logo mais), Segurança Holística, A Cultura é Livre, pendrive com Tails, muitos adesivos e até uma pequena cartinha cifrada, como as fotos logo abaixo dão uma pista.

Pra um livro artesanal, impresso em uma pequena e aguerrida editora anarquista (com energia solar!), editada por um coletivo que está há 13 anos na labuta sem grana de fundação nem de big tech, com textos políticos sobre tecnologia do início dos anos 1990 que só circulavam para iniciados, sair já com 500 exemplares vendidos e distribuídos pra todas as regiões do Brasil (fora os pedidos que tem chegado todo dia; logo estará disponível na loja da Monstro) é um bonito feito. Sobretudo porque não estamos no circuito “mainstream” de circulação editorial E os #cypherpunks não são um assunto “da moda”, mesmo na tecnopolítica e em movimentos políticos ditos progressistas, em que a discussão sobre as big techs ainda é muito mais no “eu também vou reclamar” a lá Raul do que buscar alternativas reais de se desviciar do conforto do design das redes digitais proprietárias (como esta que escrevo, sabendo que de algum modo ainda cá me mantenho para a disputar – e também pq sou um tanto desses viciados).

A circulação do “Manifestos” por aí é um pequeno feito que atribuímos a uma série de lances: sorte, persistência, acaso, competência nossa também. Mas sobretudo a uma comunidade aguerrida (hacker, cyperpunk, do software livre, da cultura livre, ciberativistas e outrxs vários) que se viu de algum modo representada por uma publicação radical em seu conteúdo e forma e que dialoga com uma nowtopia de defesa da privacidade – quando tudo parece crer que não mais a temos.

Se o seu ainda não chegou, logo um/a carteiro/a amigo/a vai levar aí. Mas quem não garantiu o seu, temos o prazer de anunciar que a partir de hoje ele está disponível para compra na loja da Editora Monstro dos Mares, co-editora do livro, e também para download gratuito aqui nesta página.

 

]]> https://baixacultura.org/2021/10/22/manifestos-cypherpunks-para-venda-e-download/feed/ 0 Retrospectiva e expectativa Cypherpunk https://baixacultura.org/2021/08/23/retrospectiva-e-expectativa-cypherpunk-em-debate/ https://baixacultura.org/2021/08/23/retrospectiva-e-expectativa-cypherpunk-em-debate/#respond Mon, 23 Aug 2021 13:52:06 +0000 https://baixacultura.org/?p=13718

Capa de Wired de maio/junho de 1993 com cypherpunks mascarados (reza a lenda que Timothy C. May e Eric Hughes estavam presentes)

Com mais de trinta anos desde sua gênese, o ideal dos cypherpunks ainda germina sobre gerações de criptógrafos, programadores e ativistas

Tal qual o movimento da cultura livre, que se reuniu nos anos 2000 para confrontar a perseguição judicial daqueles que baixavam conteúdo em sites P2P, os Cypherpunks ganharam notoriedade quando se organizaram para responder a uma ameaça  – no caso, feita por mecanismos regulatórios da criptografia nos Estados Unidos, entre o final dos anos 1980 e início dos 1990. A união para problematizar legislações (e também atos vigilantes de governos e empresas) foi uma feliz ocasião para reunir grupos de pessoas que discutiam as implicações políticas das técnicas, especialmente aquelas relacionadas com a proteção da privacidade – naquela época já era possível prever muitas (se não todas) as implicações vigilantes de uma rede mundial de computadores como a internet.

Eram, sobretudo, programadores, hackers e engenheiros de software e hardware, alguns influenciados por escritos tecno libertários que viam as  tecnologias  da informação como um acréscimo de poder ao indivíduo que aumentaria a liberdade pessoal e poderia radicalmente reduzir a força do estado-nação. É interessante pensar como o libertarianismo cypherpunk dialoga, ainda que pontualmente, com o que Richard Barbrook e Andy Cameron chamaram de “ideologia californiana”. Timothy May, por exemplo, autor do “Manifesto Criptoanarquista” (1992), foi leitor de Ayn Rand e refletia, em alguns posicionamentos políticos, parte da sua filosofia centrada em um certo individualismo que, anos mais tarde, resultaria em um ultraliberalismo e a aberração chamada anarcocapitalismo (os hoje famosos ancaps).

Ainda que houvesse essa tendência individualista e anti-estatal, o fato é que os cypherpunks também souberam ser um sistema de natureza tecno-social com bastante elasticidade, que soube se adaptar em diferentes contextos sociopolíticos desde o fim da década de 80 até os dias de hoje. A ponto de agregar, além de pessoas e coletivos, também outras formas de “ação política”. Tecnologias podem ser cypherpunks, como o The Onion Router (Tor), o Pretty Good Privacy (PGP) ou o WikiLeaks; articulações sociais podem ser cypherpunks, como as criptofestas em dezenas de localidades do mundo e as diversas mobilizações da sociedade civil de defesa dos direitos conexos à criptografia na rede; e pessoas podem ser cypherpunks através de ações cipher-ativistas, como aqueles/as que se dedicam, em redes colaborativas, a oferecer oficinas sobre o uso de ferramentas de criptografia, organizações que defendem a criptografia em processos judiciais ou indivíduos que alimentam o GitHub (e o GitLab) com linhas de código que tornam mais resilientes arquiteturas de segurança com criptografia.

“Manifesto Cypherpunk” no original, em inglês

Na visão de Tim May exposta em “Manifesto Criptoanarquista”, a criptografia de chave pública foi tão importante para a virada do século XXI, em termos de revolução comunicacional, quanto a invenção da prensa de Gutenberg foi no século XV. Da mesma forma que a difusão de conhecimento possibilitada pela prensa potencializou a desestruturação do modelo de retenção e silenciamento de informações característicos do poder medieval, a criptografia seria, igualmente, o contraponto da escalada de poder do Estado com a aceleração da computação. De fato, para os estudos de vigilância dos finais da década de 80, a centralização do computador enquanto ferramenta de administração pública completaria o projeto panóptico de Jeremy Bentham de duas maneiras: expondo o comportamento do público e tornando opacos os aparatos de vigilância.

No ínterim do aprofundamento das preocupações sobre a erosão da privacidade, os manifestos de May e Eric Hughes foram sintomáticos, respectivamente, do presságio e da reação às “criptoguerras” (como viriam a ficar conhecidas as disputas em torno da criptografia notadamente na década de 90, mas com diversas renovações contemporâneas): em 1988, ano da primeira aparição do Manifesto Criptoanarquista, já era densa a proximidade dos riscos aos direitos refletidos em regulações restritivas à criptografia; em 1993, o “Manifesto Cypherpunk” já mobilizava um repertório de reação a políticas públicas e teorizava, ainda que implicitamente, sobre o direito à privacidade e à proteção de dados. 

**

Na quinta-feira 26/8, 19h, Leonardo Foletto, organizador de “Manifestos Cypherpunks”, conversa com André Ramiro, pesquisador em criptografia e um dos fundadores do IP.Rec, autor do posfácio desta edição – os trechos acima são parte do posfácio adaptadas.  A proposta é falar um pouco sobre os três manifestos presentes no livro, seu contexto de produção e sua atualidade para 2021. A conversa ocorre no canal do Youtube do BaixaCultura, às 19h,  dentro do #criptoagosto, uma série de eventos, debates e atividades para falar da importância da criptografia, organizado pela Coalizão Direitos na Rede.

E a campanha do financiamento do livro no Catarse segue por mais 9 dias, já atingimos 500% da meta inicial mas seguimos pra espalhar e fazer a maior tiragem de um livro artesanal cypherpunk desse país!

]]> https://baixacultura.org/2021/08/23/retrospectiva-e-expectativa-cypherpunk-em-debate/feed/ 0 O manifesto do círculo de poetas sampler de São Paulo https://baixacultura.org/2012/12/17/o-manifesto-do-circulo-de-poetas-sampler-de-sao-paulo/ https://baixacultura.org/2012/12/17/o-manifesto-do-circulo-de-poetas-sampler-de-sao-paulo/#comments Mon, 17 Dec 2012 15:11:42 +0000 https://baixacultura.org/?p=9504  

O círculo de poetas sampler de São Paulo foi um movimento criado no final dos anos 90 e início dos 2000 que se espalhou por diversas regiões da capital paulista. Veio, como muitos dessa época, na esteira do movimento punk e anarquista e se somou a nascente cultura digital (pelo menos no que diz respeito a que conhecemos hoje) para propor a ideia do remix, cut-up, também na literatura. Foi, talvez, um dos primeiros grupo organizados a falar disso abertamente no Brasil.

Abertamente? Sim, eles deixaram poucos textos sobre o tema, e o único que encontramos é o que publicamos abaixo: Manifesto da poesia sampler. Ali estão todas as influências (Burroughs, copyleft, Oswald de Andrade, Lautreamont, Roberto Piva, etc) para falar do esgotamento da linguagem e da necessidade de reapropiação do que já foi produzido até hoje ao invés da criação. Preceitos que, de alguma forma, se relacionariam com a escrita não-criativa de Kenneth Goldsmith e aparecem no MixLit de Leonardo Villa-Forte, entre outras iniciativas.

*

O manifesto (atenção: não confundir com o Manifesto da Literatura Sampler, de Fred Coelho e Mauro Gaspar, que tem 7 versões e em breve estará por aqui também) saiu no Rizoma, em 2002 – depois, foi compilado no ebook “Recombinação“. Continha uma introdução, em que se explica um pouco do círculo. Tudo muito caótico, mas que dá uma amostra do contexto anarquista da qual ele foi produzido.  Alguns trechos:

O círculo de poetas sampler de São Paulo foi criado na relação entre os cavaleiros templários e bruxas cidadãs, entre  sufraggetes e o movimento de poetas negros de Angola, entre @s escritor@s de Q e ladrões-ativistas do Leste Europeu, entre manifestantes anti-globalização no início deste século XXI, entre Seattle, São Paulo, Porto Alegre e Morro Agudo.

O Círculo de Poetas Sampler de São Paulo (tirado de um anagrama escrito pelo Bandido da Luz Vermelha na cadeia), está em todos os cantos. De marginais a altos postos do governo, infiltrados em movimentos de cultura digital picaretas e em espetaculosas palestras sobre o Nada. Este manifesto, escrito entre o IRC e pombos-correios se desmembrou em manifestações na qual o Círculo não impôs sua marca (mal de nossos tempos?), mas sim, subrepticiamente, subvertendo a retrô-subversão contemporânea que alia Estética e Poder de maneira tão vulgar quanto no início da Revolução Industrial.

Hoje pouco se sabe desse círculo e dos seus integrantes. Se ele ainda existe, é certo que deve ter se dissipado, ganhado outro nome ou se espalhado por governos, redes (Metareciclagem? THacker?), ou em movimentos de cultura digital picaretascomo diz a introdução. A publicação desse texto também é uma tentativa de achar alguma pista do paradeiro do círculo.

 

Manifesto da Poesia Sampler

“O plágio é necessário. O progresso o implica”
Lautreamont

Que as idéias voltem a ser perigosas.

Vivemos um momento de impasse poético (comecemos com frases de efeito). A poesia brasileira contemporânea está estilhaçada em todos os caminhos possíveis e sofre de uma falta de identidade sem parecer. A poesia brasileira contemporânea (que é bom frisar nem sempre é moderna) não sabe como se comportar. Não há mais (des)caminhos claros e definidos.

Queremos então aqui, levar ao máximo a falta de perspectiva, usar ao máximo a queda das utopias (política, existencial, artística) para apresentar a poesia sampler. A poesia sampler ou sampleadora é e se quer ser ilegal. Usando os princípios e termos da música eletrônica que literalmente rouba trechos de outras músicas para se compor, a poesia sampler rouba idéias, trechos, citações, põe palavras em outros contextos. A sua originalidade é a falta de tê-la.

O problema da linguagem é o cerne da poesia sampler. É a constatação do esgotamento total da linguagem, é a constatação de não ter mais saída para a linguagem, que já foi (des) (re) construída ao máximo. É se emaranhar no labirinto (in)finito das experimentações e das brincadeiras. É poesia irresponsável. É a volta da morte do Copyright (viva o Copyleft). É a volta da morte da autoria. É a volta do plágio. Como disse Lautreamont, o progresso o implica. A poesia deve ser escrita por todos.

A poesia sampler pode servir como uma ponte para uma possível nova poesia e novos poetas. Ela pega esses cacos que todos já destruíram e brinca com eles e os muda de lugar e os troca, os confunde, os cita, os leva ao extremo da brincadeira poética.

Saturação da informação. Não mais novidades. Contra o mercado de novidades, contra a globalização e a mercantilização da novidade. O pensador moderno precisa saber escolher a informação. O poeta moderno precisa deslocar as mesmas palavras que conhece há séculos para outros contextos. Nem mesmo essa idéia é novidade. A poesia sampler, felizmente, está fadada ao jornal de ontem. Duchamp desce das escadas nu.

Desabando, logicamente, em Oswald de Andrade, nosso grande poeta antropófago: “Tudo que não é meu me pertence”. Lema do poeta e base da poesia mais inventiva e criativa brasileira. Diferente da chamada linha evolutiva da vanguarda poética brasileira
fincada no concretismo, a poesia sampler não é original ou melhor não se quer (é aí que tá o ovo de colombo). É poesia de poesias ou melhor, poesia que tira outras poesias do contexto e as coloca com outros sentidos, outras características, outra vida, incorporando até novas palavras, tanto é a liberdade da poesia sampler.

A poesia sampler já nasce velha. É criminosa, é pagã, é lírica, é crítica, é publicitária. Como no poema de um dos poetas sampler escrito em cima de um dos poemas mais (re)conhecidos de Oswald de Andrade: Erro de Português. O poeta sampler subverte a idéia original do poema, ou melhor, encontra nele, uma possível (re)interpretação. Eis:

Erro de Brazileiro
O português
quando aqui chegou
as índias todas ele comeu
o problema é que
elas continuam gozando
até hoje

A poesia sampler leva a tradição pra outro lugar, usando-a, anarquicamente. É a contradição máxima que vivemos. É seguir a tradição, negando-a. Não há mais diferenças entre nada. Tudo pode ser usado. Guerrilha Cultural. Abalar os conceitos das afirmações. São poetas sem poemas. Esses conceitos, além de terem surgido com a música eletrônica, também são influenciados pelos grupos filosóficos anarquistas, principalmente por Luther Blisset e os artistas neo-dadaístas e os situacionistas. Somos todos.

Somos um. Somos nenhum. Não temos reflexo em espelho algum. Literatura pra nossa geração. Somos poetas burros escrevendo para uma geração burra. Assassinamos jornalistas culturais com poemas de Eliot. Somos o oco da oca tupiniquim interplanetária. Soy loco por ti, America. Vivemos a era do não-criador. Era do sampleador. Acumulamos citações como heróicos saqueadores de túmulos. Sempre voltamos ao mesmo ponto: não há nada de novo debaixo do sol. O que podemos fazer é mudar o sol de lugar (terminemos com frases de efeito).

Assinado pelo Círculo de Poetas Sampler de São Paulo

e terminemos com mais um poeminha:
“Quando nossos poetas vão cair na vida?
deixar de ser broxas para ser bruxos?”
Roberto Piva

 Créditos imagens: 1 (sampler), 2 (Bliss),
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A política vicejante se manifesta https://baixacultura.org/2012/10/05/a-politica-vicejante-se-manifesta/ https://baixacultura.org/2012/10/05/a-politica-vicejante-se-manifesta/#comments Fri, 05 Oct 2012 20:01:58 +0000 https://baixacultura.org/?p=9362

 

Em véspera de eleição, nada melhor que um texto irônico/certeiro para ecoar em nossas mentes político-torcedoras.O Manifesto da Esquerda Vicejante foi escrito em 1994 e, 11 anos depois, virou livro de mesmo nome, somado com mais outros textos da mesma linha do  jornalista e poeta pernambucano Marcelo Mário de Melo, um esquerdista de carterrinha ainda hoje . É uma série de “leis” (36) mordazes (e engraçadas) pra caramba sobre a falência das esquerdas e, de um modo geral, de toda a política – que como gostamos de repetir por aqui, “não nos representa mais“, ainda que, sim, represente.

Como José Paulo Cavalcanti Filho escreve na apresentação, o Manifesto “não tem a pretensão de merecer estudo nenhum”. A ideia de usar “manifestos” como o da Esquerda Vicejante para divulgar idéias é antiga: remonta desde o clááássico “Manifesto Comunista” de Marx e Engels, no século XIX até, já no século XX, o “Manifesto Futurista” de Filippo Tomaso Marinetti, publicado no Jornal Figaro (1909);  os brasileiríssimos “Manifesto Antropófago” e “Manifesto da Poesia Pau-Brasil”, do mestre Oswald de Andrade.

Ainda teve os “Manifestos Dadaístas”, de Sami Rosentein – dito Tristan-Tzara; André Breton publicou em 1924 e 1930 dois “Manifestos Surrealistas”, pregando o não conformismo e a fórmula de criação denominada “automatismo psíquico”. Mais recentemente tivemos o Manifesto Neo-concreto, de Ferreira Gullar, Lygia Clark, Amílcar de Castro, entre outros; o Manifesto da Poesia Praxis, de Mário Chamie. Mais recente ainda tem o “Manifesto da Poesia Sampler“, de Fred Coelho e Mauro Gastpar (o próximo que publicaremos). E é bem provável que muitos outros “manifestos” existam ainda, por esse mundão afora.
O Manifesto da Esquerda Vicejante não quer, claro, se comparar com esses todos aí de cima. Ele propõe, “em lugar da esquerda autoritária, arrogante e autofágica, a esquerda auditiva, criativa e cativante.” Desenha “a caricatura da militância”, identificando: “partidos políticos –minha eleição, meu marketing, meus cargos; sindicatos –meu dissídio, minha data-base, minha categoria; movimento social – meu segmento; associações de moradores, meu grupo, minha rua, meu bairro; organizações não-governamentais –meu projeto, meu pobre, meu gringo.
Na defesa irônica do socialismo, o autor faz uma metáfora sexual: “liberalismo, neoliberalismo, é masturbação sem gozo; social-democracia é gozar fora e em pé; socialismo stalinista é transar sem sarro e, muitas vezes, sobre cama de caco de vidro e areia; socialismo com cidadania popular, pluralismo e controle civil é sarro, dança, gozo dentro, conjunto e muitas vezes repetido em boa cama”.
Disfrute.
O Manifesto
“Vicejar (De viço + ejar)
1)Ter viço, vegetar com opulência, viçar (…).
2)Ostentar-se de maneira brilhante ou exuberante; garrir (…).
3) Dar o viço a (…).
4)Fazer brotar exuberantemente (…).5) Brotar, produzir, lançar (…)”
(Novo Dicionário Aurélio, Ed. Nova Fronteira, 2a edição 1986, pág 1773)

1

* Em lugar da esquerda arrogante e autofágica, a esquerda criativa e cativante.

* Em lugar do otimismo compulsório, a esperança crítica.
* Em lugar dos sonhos utópicos, as vigílias programáticas e pragmáticas.
* Em lugar das cartas de princípio, os bilhetes de começo, meio e fim.
* Sempre que se levantar questões, baixar soluções.
* No horizonte dos pontos de partida, os encontros de chegada.
* Antes de procurar as saídas, encontrar as entradas.
* Em lugar das viciadas veredas, os desafiantes caminhos.
* Em lugar das rotas rotinas, as radiosas rupturas.
* Em sintonia com o espírito que norteia, o corpo que suleia.
* E quanto pior, pior.
* E quanto melhor, melhor.
* E o importante são os talhes dos detalhes.

2

* Abaixo MDU: Mito, Dogma, Utopia.
* MDU: o trio tenebroso.
* Mito é a sombra do anão fazendo gigante no muro.
* Dogma é a ponte avançando antes de o rio nascer.
* Utopia é a costura seguindo sem a linha na agulha.

3
* Que a esquerda tenha a coragem de se olhar de frente no espelho. E sem maquiagem.
* Ampla distribuição de espelhos retrovisores para que todos também possam ver a própria cauda.

4

* Abaixo a caricatura atual da militância!
* Partidos políticos: “minha eleição” , “meu espaço” , “meus cargos”
* Sindicatos: “meu dissídio” , “minha data-base”, “minha categoria”
* Movimentos sociais: “meu segmento”.
* Associações de moradores: “meu grupo” “minha rua”, “meu bairro”.
* Organizações Não Governamentais: ”meu projeto”, “meu pobre”, “meu gringo”
* Espaço de ação: “meu protesto”, meu “comício”, “meu fórum”
5
* Abaixo os atos-públicos-atos-íntimos de a gente olhando pra nós, os protestos sem contágio e as greves gerais irreais.
* Fora com o automatismo da ação política calendarizada e eventualista.
* Pela subordinação dos barulhos do marketing ao trabalho de massas.
* Mais programação ao vivo e menos em circuito fechado.
* E aos que pretendem insistir na mesma infecunda mesmice, recomenda-se a contratação de grupos teatrais para encenação de assembléias, passeatas, piquetes e comícios.
* Além de atores e figurantes, dublês e sósias impecáveis dos dirigentes permitirão que eles assistam a tudo em casa e em cores, onde assinarão depois os maravilhosos documentos de avaliação com a abertura: “foi uma vitória” ; e o fecho: ” a luta continua”.

6

* Chega de reproduzir no movimento popular aquilo que se critica nas cantigas do poder.
* Ninguém cria o que não vivencia, lugar de teoria é na prática e democracia pra ser boa começa de casa.
* Que se instaure a democracia entre as forças e os cidadãos de esquerda, não apenas enquanto medida provisória ou estado de emergência, mas como premissa e conclusão, meta e método, escada, trampolim e mergulho de vida e convivência.
* Pela alfabetização democrática.
* Que se providenciem as escolinhas de democracia, do maternal ao curso noturno, para todas as tendências e sub-tendências da esquerda.
7
* Abaixo a ditadura da meia dúzia.
* Chega de falar em nome do povo sem procuração nem consulta.
* Pela mobilização dos não consultados ante as imposições de diretórios, diretorias, gabinetes, escritórios, chefias, equipes, caciques, mandatários e porta-vozes em geral – autorizados, autointitulados, telepáticos e mediúnicos.* Em lugar da ditadura das palavras de ordem, a sintonia com os anseios do povo.
* Contra a privatização do movimento popular por indivíduos ou grupos: gurus, tutores, protetores, patronos, papais, mamães, sociedades anônimas, companhias limitadas, condomínios e consórcios.
8
* Fora com o sadomasoquismo reverberante do tipo: “passei a noite sem dormir”, “hoje quase não comi” e “estou morto de tanto trabalhar”.
* Se noite de sono, fome e excesso de trabalho forem padrão de qualidade militante, que se promova como vanguarda política o trio formado por um vigilante noturno, um faquir e um jumento.
* E que se livre a todos do discurso chantagista da hora-extra militante, utilizada como poupança, lucro ou dividendo, com direito a grosseria e pompa, por quem se considera acionista majoritário da luta popular.
* Pela conciliação entre a luta popular e o leito copular.
* Por uma militância com poesia, prazer, amizade e humor.

9

* Contra o delírio político e a ficção na ação.
* Que os militantes assimilem a objetividade dos humoristas.
* Pela implementação dos Centros Integrados de Arte para Políticos – CIAPs – com abundância de professores surrealistas, abstracionistas e performáticos.

10

* Pelo estímulo à desinibição religiosa entre militantes, notadamente, no círculo dos que se dizem ateus, agnósticos e materialistas, para que diminuam o fanatismo, as igrejinhas, as confrarias e as seitas políticas.
* Que os ateus autênticos colaborem com os religiosos de todos os matizes no esforço pela dessacralização da vida política e para o exercício dos cultos nos lugares devidos.

11

* Pelas assessorias especializadas para todas as vertentes da esquerda psiquiátrica.

12

* Por uma adequada política de administração de narcisos.

13
* Contra a amnésia política daqueles que pretendem soterrar o passado ditatorial.
* Chega do saudosismo vitimista dos que analisam a história a partir do seu umbigo torturado.
* Fora com as mitificações e os tabus.
* Que as vivências, os depoimentos e as memórias sejam tratados como fontes de informação a serviço da atualidade política e da verdade histórica.
* Contra a necrofilia política.
* Que seja repensada a questão dos mortos e desaparecidos durante a ditadura, colocando-se em primeiro plano, não as chagas do seu martírio, mas o significado público e a responsabilidade da sua perda, as informações sobre as suas vidas e os seus jeitos de rir.

14

* Pela interiorização da política.
* Que a esquerda metropolitana deixe de falar em nome de todo o estado, em eventos de composição municipal e crachá estadual.

15

* Pelo crédito de confiança nos controles.
* Todos sabem que dor de cotovelo, gripe, picada de inseto, burocratismo, barata, ranço, má fé, antipatia, idiotice, autoritarismo e picaretagem, não são privilégios de nenhuma corrente ideológica e atacam a todas, com possíveis variações de grau.
* Em lugar da confiança cega em dirigentes e dirigidos, mecanismos eficazes de controle civil e prestação de contas de lado a lado, de cima pra baixo e, principalmente, de baixo pra cima.
* Pela desconfiança constante ante todas as versões e inversões oficiais.
* Que não se ponha a mão no fogo por ninguém.

16

* Pela ótica com ética e a coerência no cotidiano.
* Quanto à ética socialista, não usai seu santo nome em vão.
* Em caso de pendências dentro da esquerda, considerar, inicialmente, que vanguarda também é massa, a carne é fraca e cabeça também é corpo.
* Depois, recorrer em crescendo aos princípios elementares de convivência entre as pessoas civilizadas e mais ou menos honestas, aos códigos de ética profissional, aos direito civil, aos dez mandamentos da lei de Deus e à Declaração Universal dos Direitos do Homem.
* Se for necessário aplicar o Código Penal, concluir que não se trata de pendência socialista e chamar a polícia.


17

* Que as figuras carismáticas e mitológicas da esquerda, da velha, média ou jovem guarda, sejam tratadas como simples mortais, que comem e descomem.
* Sem ranços de fanático desiludido nem ciúmes de candidato a cacique.

18

* Abaixo as cortinas de ferro, os muros de Berlim e os bloqueios do grupismo e do corporativismo: partidário, sindical, comunitário, segmental, grupal, executivo, legislativo e judiciário, militar e civil, patronal e peãozal, intelectual e assessoroso, de baixo e de cima, dianteiro e traseiro, lateral e diagonal, paralelo e transversal.
* Pelos projetos globais, pensando na família, na rua, no bairro, no município, no estado e no país, inseridos no mundo e no cosmos.

19

* Abaixo a ditadura do partidarizado.
* Pluralismo não é sinônimo de pluripartidarismo.
* Pela representação eleitoral dos sem-partido.

20

* Abaixo o derrotismo e o niilismo nacional com afetações de Primeiro Mundo, de parte daqueles que sobrevivem e se pavoneiam no Terceiro.
* Chega de construções lamentosas do tipo “é gente humilde/que vontade de chorar”, que a Esquerda Vicejante propõe como o Hino Nacional da Mendicância.

* Chega de papo de burguesia bondosa distribuindo lençóis de seda para os miseráveis enxugarem as lágrimas.
* Abaixo a política e a estética do vitimismo e da mão suplicante.


21

* A Esquerda Vicejante denuncia o cupulismo como a mais requintada e repelente expressão da cultura política nacional e identifica como seus produtos de exportação:

. o liberal de sala VIP;

. o democrata de condomínio fechado;

. o social-democrata de cobertura;

. o comunista cinco estrelas;

. o esquerdista de vitrine;

. o anarquista de salão;

. o agitador de corredor;

. o ativista de sala de espera;

. o dirigente de cadeira cativa;

. o pré-candidato a cacique;. o cacique jovem-guarda.. a liderança de outdoor; a transparência com vidro fumê.

22

* A Esquerda Vicejante proclama que nada é mais arrogante e raivoso do que um pequeno-burguês, pensando que é proletário, despejando bílis noutro pequeno-burguês.

23

* A Esquerda Vicejante adverte que, a partir das duas horas de duração, toda reunião é inútil.
* Denuncia o caráter antinacional, antipopular, antidemocrático e anti-socialista das reuniões nas sextas-feiras à noite.
* E propõe que a sexta-feira seja oficializada como o dia da “transição psicológica da semana”, preservada contra reuniões palavrosas e seminários semi-áridos.

24

* A Esquerda Vicejante reconhece que, de fato, foi superado o fosso tradicional entre esquerda e direita.
* Mas, considerando o empobrecimento e a miserabilização crescentes das camadas populares, ao lado do enriquecimento máximo das classes dominantes, em verdade vos diz que o fosso foi transformado em abismo, muito mais largo e muitíssimo mais profundo.

25

* Sem medo de ser de esquerda e socialista.
* A queda do muro de Berlim não mata nossa fome nem dilui nossa direita.
*A crise do Terceiro Mundo é também a crise do Primeiro Mundo, onde se situam mandatários e patrões.

26

* Contra a pressa e a impaciência política.
* Não identificar prazos de processo histórico com prazos de biografia individual.
* Chega de só pensar no fim do filme.
* Pela unidade entre a semana e o século.
* Por mais coerência e clareza.
* Contra os requebros da esquerda de quem vem, direita de quem vai, cujo símbolo é um camaleão com fita adesiva.
* Não confundir convivência com aderência.

27

* Sem medo do diálogo e contra o câncer do consenso compulsório.
* Um bom diálogo pode ser o começo de uma excelente discordância.
* Pela polêmica “brutal e sutil”.

28

* Pela radicalidade teórica e prática.
* Vaselina somente para facilitar a entrada e aumentar a profundidade.
* Sem confundir radicalidade com unilateralidade, sectarismo, grosseria,fechamento ao diálogo, ofensa e atrito pessoal.
* “Radicalidade é descer às raízes”.

29

* Contra a fome, o raquitismo político e a subnutrição cultural.
* Pela inclusão dos excluídos.
* Por autonomia e cidadania popular.
* Pela República Alimentarista, fundada no direito democrático de o povo comer à vontade.
* Repúdio a todas as modalidades da engenharia política dominante na história do Brasil:
. poder moderador;
. atos adicionais;
. atos institucionais;
. medidas provisórias;
. pacotes e troca-trocas.

30

*Abaixo as frentes eleitoreiras, nas quais, em alianças com liberais, progressistas e populistas, os núcleos populares, intelectuais, artistas, ativistas, “pagam o boi” em mais valia militante, elaborando programas, mobilizando, cumprindo tarefas, sem garantias nas ações de governo, nem mesmo, das migalhas do churrasco.
* Chega do eleitoralismo de esquerda.

31

* Pela construção de uma aliança acima e além de eventos eleitorais, futricas grupais, instâncias oficiais e trique-triques de caciques.
* Pelas campanhas de mobilização popular partindo das necessidades reais das massas pesquisadas e consultadas
* Que se estabeleçam objetivos atraentes e palpáveis, permitindo avanços e vitórias que melhorem a vida e elevem o astra.

32
* A esquerda vicejante proclama:
* liberalismo/neoliberalismo é masturbação sem gozo;
* social-democracia é gozar fora e em pé;
* socialismo stalinista é transar sem sarro e, muitas vezes, sobre cama de caco de vidro e areia;
* socialismo com cidadania popular, pluralismo e controle civil é sarro, dança, gozo dentro conjunto e muitas vezes repetido em boa cama.
33
* Pela unidade matemática da esquerda e do bloco democrático-popular, a partir das quatro operações fundamentais, da soma algébrica, da razão e da proporção, do máximo divisor e do mínimo múltiplo, da racionalização dos denominadores e das probabilidades.
* Cuidado com as radiciações e as frações.
* E atenção especial no cálculo das funções, ante o risco de zerar o nosso denominador comum.
34
* Pela reativação cultural da esquerda.
* Contra a demagogia dialética, a invenção de contradições e a copidescagem da realidade.
 * Que os intelectuais agônicos se situem no organogramsci democrático-popular,criando e recriando para as décadas.
* Menos parênteses e mais traços de união entre a produção intelectual e a militância política.
* Pela aproximação do intelectual eclético com o povo sincrético.
* Abaixo os premoldados políticos, teóricos e práticos.
* Não confundir sociedade civil com construção civil.
* Nem referência teórica com reverência teórica.
* Nem paradigma com paradogma.
* Nem processo histórico com processo histérico.
* Chega de pensar as coisas do país e da vida como uma neurose de vanguarda.

35

* Pela descomplicação verbal.
* Falar para ser entendido e não para ser decifrado.
* Que todos digam e ninguém coloque.

36

* Pela modernização da esquerda, de A a Z.
* A mesmice da esquerda é o tranqüilizante da direita.
* Que se assuma a modernidade em todos os níveis, enfrentando os preconceitos da Esquerda das Cavernas e sem engolir o dogma de que ser moderno é se aproximar da direita.
* A Esquerda Vicejante reafirma que o maior indicador de modernidade do planeta é o povo comer o mínimo de três vezes por dia, com suco e sobremesa.
*Vamos viver e conviver melhor, com mais universalidade, mais autenticidade, mais realismo, mais ousadia, mais abertura e mais luz.
*Sejamos uma esquerda com raízes, caules, folhas, flores e frutos.

 
Créditos: 1, 2.
Obs: Valeu ao Deak pela dica.
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