Lobby – BaixaCultura https://baixacultura.org Cultura livre & (contra) cultura digital Thu, 19 Mar 2009 21:37:57 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.0.9 https://baixacultura.org/wp-content/uploads/2022/09/cropped-adesivo1-32x32.jpeg Lobby – BaixaCultura https://baixacultura.org 32 32 O lobby antipirataria e sua origem https://baixacultura.org/2009/03/19/o-lobby-antipirataria-e-sua-origem/ https://baixacultura.org/2009/03/19/o-lobby-antipirataria-e-sua-origem/#comments Thu, 19 Mar 2009 21:37:57 +0000 https://baixacultura.org/?p=1466 superman

Este é o pobre Superman que faturou centenas de milhões em bilheteria

É incrível como as pessoas constumam aceitar sem qualquer resistência um modelo de realidade imposto por interesses privados e publicidade cara-de-pau. O Leonardo costuma postar aqui no BaixaCultura imagens de propaganda antipirataria e fica evidente o quanto são precárias e absurdas. A eterna adequação de um download ao crime de roubo ou furto é algo que até a tão sagrada lei faz questão de declarar sem sentido, mas o bom cidadão brasileiro não quer saber o que o Código Penal define como roubo, mas sim o que a mídia diz para ele sobre isso.

Vamos a uma tranquila e paga sessão de cinema e chegando lá está a indústria despejando uma propaganda mequetrefe sobre roubar carros ser igual a baixar um filme na internet. As pessoas vão acreditando nesses apelos das coitadas corporações bilionárias a ponto de vermos por aí um monte de gente baixando tudo o que vêem pela frente pelo simples fato de ser uma prática não coibida pelas autoridades, não por enxergar um direito coletivo que vem sendo tacitamente pleiteado e que faz todo sentido em um panorama de facilitação tecnológica de difusão de informação e cultura. Muitos ainda acreditam que a indústria defende os autores.

O Direito Autoral deveria ser, grosso modo, a ciência e o conjunto normativo que tratariam da relação e máxima integração entre autor e público, entretanto, a inserção de inúmeros elementos, outrora necessários, como o suporte industrial e os distribuidores físicos, tornaram o Direito Autoral uma verdadeira anomalia. Ele acabou sendo sinônimo de mecanismo de manutenção de monopólio cultural.

Você pode constatar: quando se fala em “titular de direitos de autor” rarissimamente é um autor que está por trás da reivindicação. Na verdade, vemos frequentemente comerciantes, distribuidores, editoras, gravadoras, grandes estúdios e suas associações fazendo as vezes de artistas e trabalhadores intelectuais. Enquanto isso, alguns autores estão dando declarações como essa aqui. Isso é algo que acontece apenas hoje?

Não.

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O copyright surgiu efetivamente na Europa do século XVI como um direito concedido a livreiros (e não escritores) para monopolizar obras de literatura e destruir a circulação de escritos críticos à monarquia vigente. Ou seja, os editores de livros (donos das máquinas de imprensa, que funcionavam mediante obtenção de concessão) eram os únicos permitidos a comercializar cultura escrita e para isso satisfaziam os interesses das autoridades. Lobby 1, autores 0.

A partir deste panorama, outras indústrias de cultura e então de entretenimento foram sendo montadas. No século XX, a contragosto de inúmeros músicos as gravações de performance ao vivo foram implantadas como novo sistema de difusão musical. Muitos jazzistas temiam ter suas idéias roubadas, assim como várias bandas ficaram amedrontadas com o surgimento do fonograma, que, podendo ser ouvido em casa, poderia também acabar com o mercado de shows e apresentações.

O resultado foi que a indústria cultural aproveitou todas essas novidades e passou a lucrar incessantemente com material autoral disponibilizado em grande escala em prateleiras comerciais. Os autores recebiam apenas uma pequena porcentagem de um montante ditado unilateralmente pelas corporações que os produziam, os chamados royalties. Tudo isso sem que a lei questionasse esses estranhos métodos de remuneração. Lobby 2, autores 0.

O que marca o período da origem do copyright até tempos recentes é que se criou uma necessidade de suporte da indústria e do sistema comercial para produção e difusão de obras intelectuais. Essa necessidade gerou abusos nunca questionados na relação autoral, mas ainda assim se consubstanciava no único meio de máxima divulgação e integração autor-público. Depois da popularização da internet e meios de produção e reprodução digital essa necessidade foi pelo ralo.

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Hoje podemos produzir com facilidade, sem submissão a contratos unilaterais, e podemos difundir cultura sem tantas barreiras físicas. Os antigos responsáveis pela necessária distribuição das obras são agora os entraves para que elas cheguem com facilidade ao público. O copyright agora pode ser visto com olhos mais críticos. A grande indústria não vai sumir do mapa, por ainda representar e lucrar muito com um mercado de produções luxuosas, mas agora pode ser contrariada quanto ao seu monopólio da relação autor-público. Basta ver, por exemplo, Hollywood reclamando tanto quando na verdade suas produções não demonstram déficit algum. Basta ver a crescente produção independente.

Chega de intermediadores desnecessários ao binômio essencial. Quando você baixar alguma obra intelectual, saiba que você está ajudando a consolidar uma manifestação coletiva que, consciente ou inconscientemente, tende a destruir séculos de privilégio, controle e centralização de bens culturais. Saiba que seu ato está em consonância com uma tendência de reformulação normativa, e não uma covarde e vazia atividade ilícita. Saiba que depois de todo esse crescimento da pirataria a produção de obras intelectuais nunca diminuiu, pelo contrário, tem crescido e se democratizado de forma extremamente contundente. Saiba que o Direito Autoral pode finalmente se referir a Direito do Autor.

[Edson Andrade de Alencar.]

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