BaixaCultura

Guia para o Fórum da Cultura Digital 2010

À esta altura – em que o blog “oficial”, a hashtag e mesmo o BaixaCultura já andam inflando a divulgação – tu já deve estar sabendo muito bem que o Fórum da Cultura Digital Brasileira 2010 vai acontecer na próxima semana, de segunda a quarta, 15 a 17 de novembro, na Cinemateca (foto acima).

Já deve, inclusive, saber que na programação vai ter tanta coisa que é preciso que se faça um “Entenda a programação” para que ninguém se perca entre os mais de 300 convidados a apresentar experiências/redes/oficinas no evento e as diversas atividades paralelas que compõe os pelo menos seis espaços do Fórum.

Se olhou com alguma atenção, já deve entender que um dos editores deste blog está algo envolvido com o Fórum, o que, para o olhar de alguns, o torne um pouco suspeito para falar do evento.

Apesar disso, tu vai ler aqui que o Fórum da Cultura Digital 2010 – A Rede das Redes vai ser um evento fundamental para a cultura digital brasileira de hoje e dos próximos anos. Pelo menos a diversidade vai estar presente: bolivianos, argentinos, colombianos, europeus, norte-americanos, amazonidas, cearenses, gaúchos, uruguaios, africanos, espanhóis, finlandeses… O mundo, como disse ontem no twitter Rodrigo Savazoni, um dos que estão na linha de frente da organização.

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Já que a programação é grande e o tempo cada vez mais curto, fazemos a partir de agora um esforço para compilar o que, na nossa nobre e nada isenta visão, vai de acontecer de melhor no Fórum. Começamos neste primeiro post pelo que vem antes do começo, ou seja, pelo Fórum Internacional Geopolítica da Cultura e da Tecnologia.

Iniciativa do sociólogo Laymert Garcia dos Santos (Unicamp) e de Gilberto Gil, o Fórum de Geopolítica acontece de quinta feira (depois de amanhã, 11/11) à sábado 13/11, na mesma Cinemateca que vai receber o outro fórum a partir da próxima segunda. A programação conta com diversos pensadores do mundo inteiro, em especial dos chamados BRICS (sigla para Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), para pensar a relação entre a tecnologia, a cultura e a geopolítica global.

O evento todo vai ser transmitido em streaming pelo site. Dá pra destacar a participação do membro da European Patent Office Konstantinos Karachalios, o indiano Lawrence Liang – que vai estar na mesa com o interessante nome de “Há outras lógicas além da estratégia ocidental de aceleração total econômica e tecnológica?”, na sexta-feira, das 14h às 17h30, o líder indígena do Peru Saúl Puerta Peñado, da Asociación Interética de desarollo de la selva peruana, e em especial do antropólogo brasileiro Eduardo Viveiros de Castro, que participará da mesa “Como se configuram hoje as estratégias de controle?” no sábado à tarde, das 14h às 17h30.

Viveiros de Castro é nome especial para entender o Brasil hoje e sempre, vide a excelente entrevista com ele que está no livro Cultura Digital. Charla que<, por sinal, este blog não pode deixar de aproveitar a chance de citar três trechos lidos, relidos e sublinhados (no livro impresso):

Outro dia, conversando com amigos, alguém falava sobre como o capitalismo tinha mudado no mundo todo, sobre o sistema de controle da mão-de-obra do capitalismo moderno, a precarização, informalização etc. E aí alguém lembrou que isso sempre existiu no Brasil. E eu fiquei pensando, sempre disseram que o Brasil era o país do futuro, iria ser o grande país do futuro. Coisa nenhuma, o futuro é que virou Brasil. O Brasil não chegou ao futuro, foi o contrário. Para o bem ou para o mal, agora tudo é Brasil.  (p.83)

Qual é o modelo típico, a trajetória típica do intelectual brasileiro (ou, aliás, norte-americano também)? É o menino de província,nascido na cidade pequena, e que está o tempo todo sonhando com o Rio de Janeiro ou São Paulo. Esse modelo do sujeito que espera o suplemento dominical do jornal como se fosse a Bíblia, a hóstia, que encomenda livros da capital, meses a fio à espera das notícias culturais da metrópole. Éramos todos meninos do interior; inclusive os cariocas e paulistas – nossa metrópole era estrangeira, apenas. Isso acabou. Hoje tudo está dado. Você descarrega livro, pega tudo. Há uma democratização gigantesca, desde que você tenha um computador de banda larga, que no Brasil talvez se expanda com esse projeto do governo de pontos de inclusão digital, quiosques digitais, que é uma coisa interessante, treinar jovens de pequenas cidades do interior para operar internet. Há esse problema da perda da diferença, da estandartização,mas é aquela coisa: fica tudo igual, mas algumas diferenças são potencializadas ao mesmo tempo em que outras se equalizam. (p.87)

O Creative Commons está tentando consagrar do ponto de vista jurídico o processo de hibridização, a antropofagia, o saque positivo, osaque como instrumento de criação. Estão tentando fazer com que o saque e a dádiva possam se articular. Eu sampleio e dou, não é “eu sampleio e vendo, vou ficar rico”, a ideia é “sampleio, mas também dou”, um processo em que saque e dádiva se tornam, de alguma maneira, mutuamente implicados um no outro. A citação, que é o dispositivo modernista por excelência de criação, é na verdade o reconhecimento de que não há criação absoluta, a criação não é teológica, ex nihilo, você sempre cria a partir de algo que já existe. Como a famosa frase do Chacrinha: “Nada se cria, tudo se copia”. E como se sabe, nada se copia igualzinho, ao se copiar sempre se cria, quanto mais igual se quer fazer mais diferente acaba ficando: a “contribuição milionária de todos os erros”, dizia Oswald de Andrade, darwinista infuso. Foi de tanto falar latim que os europeus acabaram falando português, francês, espanhol…(p.92)

 

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Poster de Futurível

Ao fim do Fórum de Geopolítica e no início do Fórum de Cultura Digital acontece “Futurível”, show desde já histórico que contará com a participação de Gilberto Gil, Macaco Bong, DJ Tudo, a Banda de Pife Princesa do Agreste, de Caruaru, acompanhado de projeções do VJ Scan. Tudo também transmitido via streaming, através do site oficial do show.

Descontando algum ranço possível com o instrumental da Macaco Bong, provavelmente hoje uma das bandas que mais faz show no Brasil, o show vale pela promessa de reedição do repertório da fase mais roqueira de Gil, circa Expresso 2222, quando era acompanhado por então músicos de rock como Lanny Gordin (Baixo e Guitarra), Bruce Henry (Baixo), Antonio Perna (Piano e Selesta) e Tutty Moreno (Bateria e Percussão)– lançando-os em experimentos com o forró, reggae, funk, samba e outros gêneros, segundo nos diz o release da apresentação.

[Inclusive, “Futurível”, o nome do show, é título de uma canção sua de 1969, que juntava as palavras “futuro possível” e já sinalizava a sua constante tematização da tecnologia, exemplificada também em “Pela Internet“, provavelmente a primeira música brasileira a falar de internet no país, composta em 1996, apenas UM ano do início da internet comercial no Brasil]

A expectativa é que, com Futurível, Gil possa levantar voo de vez naquilo que vem se ensaiando devagar nos seus últimos discos e torne a ser um artista relevante para as novas gerações, colocando sua antena pop calejada de história para captar o presente e unir com aquilo que de melhor ele já fez (e sabe fazer) em outros tempos, de modo parecido ao que Caetano conseguiu fazer nos últimos discos, Cê e Zii e Zie.

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Nossa ideia era fazer também um guia detalhado das diversas programações do Fórum da Cultura Digital 2010, mas o tempo não deixou que isso fosse feito decentemente, além do fato que o blog do evento já dá conta de guiar o participante do Fórum e informar aquele que vai acompanhar o evento de casa, via streaming (para esses, alerta-se que não são todos os espaços que serão transmitidos, mas sim dois: Seminário Internacional e Experiências da Cultura Digital).

Aí vão três indicações esparsas de coisas a se notar no Fórum:

_  Experiências da Cultura Digital, na Sala Petrobrás (capacidade de cerca de 110 lugares), um grande mosaico de experiências relacionadas à cultura digital. O grande barato desse espaço é a diversidade e a troca de ideias/contatos/etc que se darão a partir das apresentações. Provavelmente, será o espaço mais dinâmico do Fórum, e quem sabe o mais caloroso, ainda que não tão badalado quanto outros;

_ A mesa de abertura (14h, 15/11) do Seminário Internacional, por sua importância histórica: “Cultura Digital oito anos depois, dez anos a frente“, que retoma um dos primeiros encontros que Gilberto Gil e John Perry Barlow tiveram, no Mídia Tática 2003, para fazer um balanço evolutivo da cultura digital e pensar ideias para os próximos anos;

_ No mesmo Seminário Internacional, a mesa que encerra a programação de segunda-feira (19h), Perspectivas Criativas da Cultura Digital , com Vincent Moon (La Blogotheque) e HD Mabuse (C.E.S.A.R). Vale olhar antes o La Blogotheque, página em que Vincent Moon despeja seus vídeos amalucados feitos em todos os cantos do mundo;

No mais, fica a dica de circular bastante pelo evento, conhecer as pessoas, puxar umas conversas nos cafés e levar pessoas interessantes aos botecos das redondezas, porque dizem que é assim que as coisas funcionam.

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